Basil da Cunha: “A minha influência são as pessoas que filmo”
<p align="justify" class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt">‘Até Ver a Luz', que estreia esta quinta-feira nas salas de cinema, marca a estreia em grande formato de um dos mais promissores realizadores nacionais. Falamos do luso-suíço Basil da Cunha, que respira a cultura ‘gangsta' da ‘favela' da Reboleira, algures entre o estilo de ‘A Malta do Bairro' de Spike Lee e ‘Os Inúteis' de Fellini. Daí a necessidade de legendas nesta fita portuguesa, em co-produção com a Suíça.
Um filme estranho, sem dúvida, mas que se entranha. Onde até há catanas e um lagarto chamado ‘dragão'... Por falar em animais, esperamos já o seu novo filme, com um leão, uma zebra e um camelo.
Correio da Manhã - Até Ver a Luz é a primeira longa-metragem após uma série de curtas premiadas. Podemos dizer até que existe uma ligação lógica entre elas tendo os jovens da Reboleira como principais personagens?
Basil da Cunha - Sim. É um trabalho que se desenvolve como qualquer relação, com tempo, confiança e respeito. Começámos a fazer filmes entre amigos, com muita liberdade e dando oportunidade a todos de participaram. O nosso grupo de trabalho é como uma família. Estamos a aprender e a crescer juntos e a nossa exigência é cada vez maior. Era muito importante para nós continuarmos a dar continuidade a essa bonita colaboração. E só estamos no começo...
- Descreve um pouco a trama de ‘Até Ver a Luz' para os nossos leitores.
- É a história de um rapaz que sai da prisão, uma figura do bairro que vive de noite com uma catana e uma iguana, isolado dos outros moradores. Ele vê-se rapidamente envolvido num problema com um gangue e a partir daí vamos seguir a sua luta pela sua sobrevivência. É um filme que tem um lado nervoso e realista mas que, para mim, tem antes grandes momentos de comédia e de poesia. Tentámos mostrar a dureza da vida, claro, mas sobretudo a beleza que cada pessoa tem nela. Seja boa ou má. Essa beleza aparece de facto nesses momentos engraçados e naqueles mais líricos.
- Pode explicar um pouco o trabalho específico de improvisação que fez com os atores?
- A rodagem é um espaço aberto onde cada um tem oportunidade de dizer algo. Dou uma situação com intenções de jogo a alguns atores e depois eles improvisam. É como um jogo com algumas regras. A ideia é não haver ensaios para se viver algo verdadeiro e não imitar a realidade.
- Pode dizer-se que o bairro da Reboleira é também uma personagem viva no filme?
- Claro. É um lugar especial, duro e mágico. É sobretudo daí que vem o apoio do nosso trabalho. Sem a união e a dedicação de todos os moradores, nada era possível. Sempre tivemos pouco apoio mas decidimos avançar na mesma e divulgar o talento de todos, lutando com a única que coisa que temos e que ninguém nos pode tirar: a nossa força de vontade.
- É importante para si manter o crioulo como uma identidade da linguagem do bairro?
- Claro. É uma língua linda e é o que se fala mais no bairro. Não faz sentido mudar...
- Este foi um filme feito com muito poucos meios, o que não impossibilitou de ter projeção internacional. Como avalia este momento do cinema português, em que a criação parece remar contra a negativa corrente económica?
- Acho que o cinema português está forte, com grandes talentos. E ao mesmo tempo acho intolerável a situação a que o liberalismo nos levou. Quando vejo políticos a abdicar dos direitos pelos quais os mais antigos lutaram, só para agradar a uns tecnocratas sem princípios e sem respeito pela dignidade humana, só posso ficar a cada dia que passa mais revoltado.
- O filme passou este ano em Cannes, na Quinzena dos Realizadores, e esteve candidato à Câmara de Ouro para realizadores estreantes. O que significou essa projeção e que frutos poderá dar?
- Espero que o filme possa ser mais visto porque tenho orgulho no trabalho dos rapazes, naquilo que conseguimos. Depois, para mim significa uma grande honra, sabendo também que Cannes é um lugar por onde passaram tantos filmes que guardo comigo.
- Quais foram, ou são, as suas principais influências do cinema?
- Gosto tanto do Fellini, do Pasolini, do Miguel Gomes ou do Pedro Costa como do Michael Mann e do John McTiernan. Nenhum deles são influências, mas todos fizeram filmes que vou guardar para sempre comigo. A minha influência, são as pessoas que filmo.
- Sei que prepara uma nova longa e que terá um certo percurso 'on the road' em Portugal. O que pode revelar nesta altura?
- Três rapazes a fugir do bairro vão descobrir-se a si próprios à medida que descobrem Portugal... Haverá também um leão, uma zebra e um camelo na história.
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