José Mário Branco: voz da contestação cala-se aos 77, sem anúncio prévio

Corpo do músico é velado esta quarta-feira em Lisboa. Funeral acontece quinta-feira.

20 de novembro de 2019 às 01:30
José Mário Branco Foto: Micaela Neto / Sábado
José Mário Branco Foto: Mariline Alves
José Mário Branco: “Portugal é a Madeira da Europa” Foto: João Miguel Rodrigues
José Mário Branco Foto: Mariline Alves
Com Zeca Afonso em Paris, para gravar ‘Cantigas do Maio’ Foto: Direitos Reservados
Deslocação do GAC (Grupo de Ação Cultural), em 1976. Com António Cardoso e António Vasconcelos Foto: Mariline Alves
Com a mulher à época, Isabel Costa, e os filhos Foto: Mariline Alves
Músico em jovem Foto: Mariline Alves

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Surpresa. É uma das palavras mais repetidas pelos amigos de José Mário Branco, o genial cantautor português que morreu esta terça-feira, aos 77 anos, vítima de doença súbita. A notícia foi dada pelo manager do artista, Paulo Salgado, e apanhou o País desprevenido. Ainda no ano passado, a celebrar 50 anos de carreira, tinha voltado aos discos, para publicar os inéditos que lhe ficaram do período entre 1967 e 1999.

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Filho de professores primários, José Mário Monteiro Guedes Branco nasceu no Porto, a 25 de maio de 1942, e começou por se interessar por História. Passou pela universidade (primeiro em Coimbra depois no Porto) mas não terminou o curso, porque entretanto a música o chamou. A música que usava como arma para mudar o Mundo.

Na década de 60 aderiu ao Partido Comunista Português, foi perseguido pela PIDE e exilou-se em França, em 1963, para fugir a uma guerra em que não acreditava. Foi por essa altura que se estreou como cantor e compositor. Em entrevista, assumiu que fazia "canções explicitamente contra o regime, de protesto, pela liberdade", porque "era preciso mudar este país".

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Regressado a Portugal após o 25 de Abril de 1974, tornou-se num dos nomes mais importantes da música nacional. Foi nessa altura que fundou o GAC (Grupo de Ação Cultural – Vozes na Luta!), com o qual gravou dois álbuns. Mas fez mais: o trabalho de José Mário Branco estendeu-se ao cinema e ao teatro (fez parte da Comuna e fundou o Teatro do Mundo). A sua canção mais conhecida é, talvez, ‘FMI’, de 1979, considerada uma síntese do movimento revolucionário português e na qual o autor desfia os seus estados de espírito, como numa performance.

Além da música em nome próprio, foram muitas e profícuas as suas colaborações com outros artistas: produziu Camané, Amélia Muge, Samuel e Nathalie. Para espanto de muitos, trabalhou com Katia Guerreiro, fadista que apoiou Cavaco Silva. "Ganhei uma amiga", afirmou. O velório realiza-se hoje no Teatro Thalia, de onde parte o funeral amanhã, às 17h30, para o cemitério do Alto de S. João, Lisboa.

Orquestrou a canção que mudou Portugal

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Na altura, era impossível imaginar o que veio a acontecer com a canção: os militares de Abril escolheram-na como senha para dar início à revolução. Porque era uma canção tradicional, "que levantava menos suspeitas" mas, acima de tudo, por causa do som dos passos em tom de marcha militar…

DEPOIMENTOS

Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República

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Símbolo de resistência

"José Mário Branco foi um símbolo de resistência, um símbolo de luta, um símbolo de esperança e um símbolo de permanente exigência à democracia portuguesa. Estou consternado, porque, apesar de tudo, desapareceu tão cedo...";

António Costa, Primeiro-ministro

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Antecipou o 25 de Abril

"É com profunda tristeza que lamento a morte de José Mário Branco, figura cimeira da música moderna e da cultura portuguesa. O álbum ‘Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades’ foi prenúncio da revolução de Abril e de uma obra empenhada.";

Camané, músico

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Dos melhores do País

"Ao receber a notícia tive uma sensação de choque, porque não estava à espera. Ninguém estava à espera. Era um grande amigo e um dos melhores compositores e melhores artistas e intérpretes da música portuguesa.";

Sérgio Godinho, músico

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Uma dor profunda

"Tenho uma dor muito profunda... De repente, esta morte súbita. Sempre fomos extremamente leais. Nunca houve um desentendimento entre nós. No essencial, estivemos sempre próximos e cúmplices."

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