Apanhados pelas redes sociais
PSP e GNR têm páginas nas redes sociais e muitos seguidores. Dão conselhos, partilham operações... e também fazem rir quem segue.
O miar persistente de um gato, em junho, levou as autoridades a uma plantação de canábis, em Faro. O que poderia ter sido apenas uma nota escrita em tom formal foi transformado num hilariante ‘post’ no Facebook da Polícia de Segurança Pública, onde a imagem de um felino ‘fardado’ foi partilhada mais de 2500 vezes e conseguiu mais de oito mil ‘gostos’ e de 400 comentários.
Neste momento, as autoridades portuguesas não se limitam a usar as redes sociais como canais institucionais cheios de palavras que os comuns mortais pouco percebem – embora também por lá andem recados sérios, com conselhos, alertas e resumos de operações, desde tráfico de estupefacientes a apreensão de material roubado. Usam-nas (também) para divertir, emocionar e partilhar um bocadinho da vida de quem veste a farda. Foi o que a GNR fez com a fotografia dos guardas Godinho, Duarte e Carreira no momento em que encontraram Martim, o bebé de dois anos que esteve desaparecido durante 25 horas em Amieira, concelho de Ourém, no final de outubro. Os agentes que foram alertados por um choro baixinho e deram com a criança sentada no chão, de pé descalço mas ainda agarrada ao boneco e à chupeta com que saíra de casa, tiraram uma selfie com o ‘bebé-milagre’ "para recordação". Mas o gabinete de relações públicas da Guarda Nacional Republicana viu na fotografia uma forma de mostrar aos portugueses esta conquista dos agentes – que chegou ao público ainda antes do comunicado formal da Polícia Judiciária.
"Tivemos uma boa notícia e quisemos partilhar com as pessoas. Quando me enviaram a fotografia, pensei: a imagem não podia estar melhor, foi tirada logo no momento, era difícil termos uma coisa que traduzisse de igual forma a alegria dos militares, que são pais e sentiram aquilo de uma forma muito intensa. Hoje em dia, não tem poder quem tem a informação, mas quem sabe partilhar essa informação", comenta o major Marco Cruz, chefe de Divisão de Comunicação da GNR.
Bebé com escolta
O mesmo fez a PSP quando o avô de Francisco enviou como forma de agradecimento uma fotografia do neto recém-nascido. ‘Fiquei bloqueado no trânsito. A minha filha, com as dores da contração, teve que sair do carro e pôr-se de pé encostada à porta, enquanto estávamos parados, e logo a dois carros de distância de um veículo vosso, dois agentes saíram sem demora e abordaram-nos perguntando se era necessário alguma coisa (...), disse-lhes que sim, que necessitava urgentemente de seguir para a MAC (...), de imediato abriram-nos caminho pelo meio do trânsito e em três minutos contados pelo meu relógio chegámos lá’. "Pedimos para partilhar [a mensagem] e o avô aceitou", recorda o intendente Hugo Palma, diretor de comunicação desta força de segurança, que lidera uma equipa de dez pessoas, "mas só três estão completamente dedicadas às redes, são os nossos criativos, e um deles até já é avô". "Fazemos ‘brainstormings’ e temos uma vantagem: a equipa é heterogénea, dos 20 e poucos anos aos 50 e tal. Temos ainda as meninas do protocolo, que, por serem mães, estão mais atentas às questões da parentalidade, dos cuidados a ter com as crianças, ‘lá na escola falou-se disto, falaram-me daquilo’, e depois os criativos desenvolvem imagens e conteúdos. Estamos muito atentos ao que é moda na internet. O que nos deu muita visibilidade foram os Pokémons [publicaram um manual de como apanhar os ‘bichos’ em segurança], em que a nossa comunicação foi pensada apenas num fim de semana", conta ainda.
Neste Halloween, publicaram uma ‘poção de segurança’ num fundo de magia: "1 pitada de visão periférica, 2 dedos de prevenção, misturar muita atenção, seguir a PSP no Facebook, q.b. de confiança e grande dose de responsabilidade." E em setembro último fizeram-se passar por Pablo Escobar, o trafi-cante colombiano com fama mundial, numa missiva em pergaminho dirigida ao Governo português, com data de 1983: "Sei que não me convidaram mas adoraria conhecer o vosso país, pois é um paraíso na Europa. No entanto, também sei que é um dos países mais seguros do Mundo, pelo que tenho receio de ser capturado pela vossa polícia. Por isso, tão cedo não irei’". Mais curioso foi o que se passou a seguir: através da página brasileira da série de televisão ‘Narcos’, Pablo Escobar ‘respondeu’: "Muy bonito, señores, mas essa não é a minha letra", lê-se na caixa de comentários.
Por isso, não é de estranhar que a página oficial da PSP no Facebook tenha perto de 530 mil ‘gostos’ e muitos a comentar avidamente tudo o que é publicado. Uma leitora, inclusivamente, já pediu para conhecer a pessoa que faz os ‘posts’ mais engraçados. "Caso com ele", escreveu, sem saber a aparência do autor. Por outro lado, muitas vezes são os próprios agentes que andam no terreno a partilhar fotos suas e a desejar ‘bom dia’ aos madrugadores que circulam pelo Facebook. "Que bom abrir o Facebook e ver uma carinha laroca a dar- -nos os bons dias!", comentou uma seguidora da página.
Há dois meses, numa campanha mais séria, a PSP aconselhava: "Envia uma foto sem roupa..." junto a uma imagem de uma corda da roupa... só com molas, uma forma bem-humorada de tratar a ‘sextortion’, um problema nada divertido e cada vez mais atual. "É melhor assim... Evita-se ser vítima de extorsão sexual online e chantagem/vingança. Mantenham privado o que é privado, é o nosso conselho", escreveram ainda os agentes nesta publicação, que teve mais de 11 mil gostos e quase oito mil partilhas na rede.
"Polícia de Segurança Pública, a sério… qual a marca de café nos vossos escritórios?! Se o resultado é este trabalho, também quero, ok?", escreve um dos comentadores da página que nasceu em finais de 2011, na altura do ‘boom’ do Facebook. E nem o microfone da CMTV escapou aos criativos – que são agentes da PSP – na altura em que Cristiano Ronaldo o atirou à água em Lyon, França. A PSP publicou no Facebook uma foto de um dos microfones do canal de televisão, que tinham guardado de uma conferência de imprensa.
Quem o leva a casa?
A página da GNR no Facebook existe desde 2012 e, embora mais institucional do que a da PSP, é seguida por quase 350 mil pessoas. A fotografia dos três guardas com o bebé Martim foi, até hoje, a publicação mais comentada e partilhada: 88 mil ‘gostos’, quase 35 mil partilhas e perto de cinco mil comentários. O ‘post’ que alertava para os perigos de caçar Pokémons – "Pela sua segurança, não se desligue da realidade" – foi outro dos que geraram mais interação na rede, e uma imagem sobre os perigos da condução sob efeito do álcool também foi amplamente partilhada. Na imagem vê-se quatro veículos: um táxi, um carro da GNR, uma ambulância e um carro funerário, com os respetivos condutores. A mensagem? "A decisão de quem o leva a casa é sua. Se conduzir não beba." "Essa campanha teve um impacto enorme. A nossa máxima é: onde estão as pessoas, a instituição tem de estar. As pessoas estão nas redes sociais, portanto a instituição tem de lá estar também. E as pessoas correspondem muito", avalia o major Marco Cruz, acrescentando que, para muitos, a página de Facebook da guarda funciona quase como um posto virtual. "As pessoas que não têm tanto à-vontade ou tempo de ir a um posto pedir informação, agora têm a guarda através de um clique. Colocam questões de trânsito e de segurança, por exemplo, ‘o meu filho tem X tamanho e Y peso. Qual é a cadeirinha que devo usar?’, e nós, de imediato, informamos. Outra questão em que as redes sociais têm sido uma preciosa ferramenta, é a violência doméstica. As vítimas têm receio de fazer denúncia, de ligar, de ir à esquadra, e por isso começaram a denunciar através das redes sociais", acrescenta Marco Cruz. Para se ter uma ideia, a GNR já recebeu este ano 26 mensagens privadas a denunciar esta forma de violência em casa, 621 a alertar para maus-tratos a animais e 736 a pedir informações de trânsito.
"Ajudámos recentemente uma menina que estava a ser vítima de ‘sextortion’ e conseguimos resolver a situação – ela denunciou, acompanhámos a situação, e os nossos militares no terreno resolveram", conta ainda.
A PSP tem recebido também tal fluxo de mensagens de denúncia via Facebook, que até já foi necessário colocar uma pessoa, que tinha funções de secretariado, a responder só a esses pedidos. "Todos têm de ter resposta, embora isso não evite que se tenha de ir a uma esquadra para formalizar a denúncia", diz Hugo Palma. Mas o primeiro clique já foi dado. Às vezes, é o mais difícil.lD
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