Serge Gainsbourg: sexo, álcool, tabaco e rock
Provocador, era um mestre da metáfora nas suas canções eróticas
Lucien Ginsburg, conhecido pelo nome artístico Serge Gainsbourg (1928-1991), foi um poeta, cantor, compositor, pianista, ator, guionista e realizador de cinema que deixou um rasto de escândalo e provocação na literatura e na música francesas da segunda metade do século XX. A sua poesia - e as letras das canções que compôs para si e para outros intérpretes - usava e abusava do humor.
A ironia, a metáfora e os jogos de palavras foram as ferramentas com que burilou poemas eróticos em que, sem recorrer a um único palavrão, descreve a masturbação feminina (‘Variations sur Marilou’) ou o sexo oral (‘Les Sucettes’). Neste último caso, a intérprete, France Gall (1947-2018), disse durante muitos anos que nunca se deu conta das insinuações sexuais da letra.
O seu maior êxito, porém, foi ‘Je t’aime... moi non plus’, de 1969, um dueto com Jane Birkin (então sua mulher) entrecortado de gemidos, em que reproduz o ato sexual. Em Portugal, para contornar a censura do regime, as rádios passavam a versão instrumental do disco - indispensável, na versão integral, em todas as festas de adolescentes.
Gainsbourg, nascido numa família de judeus ucranianos, cultivava a imagem do artista ‘maldito’, aparecia em entrevistas e eventos sociais (incluindo uma receção no Palácio do Eliseu, a convite do presidente Mitterrand) de barba por fazer, a fumar cigarros Gitanes e frequentemente alcoolizado. Voltou a escandalizar quando gravou uma versão reggae do hino francês.
Trad. da letra da canção ‘Je t’aime... moi non plus’
‘Amo-te... eu também não’
"Amo-te, amo-te, sim amo-te
Eu também não
Oh meu amor
Como a vaga hesitante
Eu vou, vou e venho
Entre os teus rins
E retenho-me
Amo-te, amo-te, sim amo-te
Eu também não
Oh meu amor, tu és a vaga
Eu a ilha nua
Tu vais e tu vens
Entre os meus rins
E eu acompanho-te
Amo-te, amo-te, oh sim, amo-te
Eu também não
Oh meu amor
O amor físico é um beco saída
Eu vou, vou e venho
Entre os teus rins
Vou e venho, retenho-me
Não
Agora vem"
Trad. da letra da canção
‘Les Sucettes’
‘Os chupa-chupas’
Annie gosta de chupa-chupas
Os chupa-chupas de anis
Da Annie
Dão aos seus beijos
Um gosto anisado
Quando o açúcar de cevada
Perfumado com anis
Corre pela garganta da Annie
Ela está no paraíso
Por alguns ‘pennies’
Annie tem os seus chupa-chupas
De anis
(…) Os chupa-chupas de anis
Da Annie
Dão aos seus beijos
Um gosto anisado
Quando ela já só tem na língua
O pauzinho
Ela junta as pernas ao corpo
E…"
Trad. da letra da canção ‘Variations sur Marilou’
‘Variações sobre Marilou’
"(…) Pupilas ausentes, íris de absinto,
‘baby doll’
Escuta os seus ídolos, Jimi Hendrix, Elvis Presley, T-Rex, Alice Cooper,
Lou Reed, é doida pelos Rolling Stones
Lá de cima, qual narciso, mergulha
deliciada
Na noite azul-petróleo do seu par
de ‘Levi’s’
Chega ao púbis e muito ‘cool’ a saber
a mentol
Ela exerce o ‘self control’ no seu pequeno orifício
Enfiando, por fim, o vício até à borda
do cálice
Afastando a corola com um dedo
‘sex symbol’
Com um fundo de ‘rock and roll’ perde-se a minha Alice
No país das malícias de Lewis Carroll"
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