Conheceu todos os heróis, de Soares a Spínola, Costa Gomes, Salgueiro Maia
Sempre foi assim e não é agora que vai mudar. Vaidosa, egocêntrica, rapariga bonita em tempos muito idos, por razões que só ela sabe inventou-se um passado em que os factos verificáveis engenhosamente se entrelaçam nos da sua imparável fantasia. Com a perícia de quem tem a mentira no sangue, no momento preciso abre a mala e tira de lá cartas, papelada, retratos, fica com eles na mão, parece que vai mostrar, mas antes que se possa ver melhor e verificar, já ela mudou de assunto e, malabarista, recolheu as provas.
Fala muito das suas vivências, das conspirações em que entrou e dos perigos que correu. Ganha estatura e modos de grande actriz no palco, quando começa a gesticular e facilmente nos transporta para as ruas de Lisboa "naquele fabuloso, inesquecível 25 de Abril!"
Lá vem uma fotografia: - Estão a ver? À esquerda, em cima do Chaimite? Entre o rapaz que levanta os braços em V e o soldado com a metralhadora? Sou eu.
Vamos olhar, mas já a foto sumiu, mostra ela agora a de uma manifestação que desce a Avenida da Liberdade.
- Esta era dos maoístas. Não sei ao certo, a Joana é que diz que o puto que leva a bandeira é o Barroso. Deve ser. Pela cara parece.
Não importa que seja. A visão breve, a menção do nome, aquele sorriso em que ela mistura nostalgia, entusiasmo e testemunho, o efeito é seguro.
- E então o Cunhal! Ah! O Álvaro Cunhal! O que eu senti por esse homem!
A fotografia passa de mão em mão, volta ao saco, ela agora arrebatada a falar do Bairro Alto naquela "gloriosa e inesquecível tarde!":
- Vocês não viram, vocês não podem imaginar a alegria, a festa que aquilo era! As ruas cheias! As pessoas aos beijos! Os vivas! Os ramos de cravos!
Nos vinte e pico anos que a conheço devo ter assistido a uma dúzia de representações dessa peça de teatro em que ela, dotada de ubiquidade, testemunhou todos os momentos altos da Revolução, conheceu todos os heróis, de Soares a Spínola, Costa Gomes, Salgueiro Maia, a todos beijou, abraçou, apertou a mão, desejou felicidade.
Os presentes aguardam que continue, e então, num suspiro, revirando os olhos que de verdade foram bonitos, anuncia o final:
- Estava em Direito e desisti. Grande asneira. Mas a minha vida era um furacão. Hoje oiço falar muito da noite, mas vocês não podem imaginar a nossa! Foi nesse tempo que dormi com o Urbano. Trago sempre comigo o livro que ele me deu, com dedicatória.
Vai abrir a mala, hesita, pára o gesto. Nunca mostrou o livro. Supõe-se, mas não há certeza, quem tenha sido esse Urbano.
Texto escrito na antiga ortografia
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