Mário Soares tentou desacreditar investigação

Pedro Namora está indignado com o facto de Mário Soares ter dito que “toda a investigação do processo Casa Pia foi mal conduzida”.

09 de dezembro de 2005 às 13:00
Mário Soares tentou desacreditar investigação Foto: Jorge Godinho
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“Soares sempre tentou desacreditar a investigação. Essa declaração prova que ele não conhece o notável trabalho que foi feito pelos procuradores João Guerra, Cristina Faleiro e Paula Soares, bem como pelos inspectores da Polícia Judiciária que trabalharam no caso, com particular destaque para Rosa Mota e Dias André”, disse ao CM.

Segundo o antigo casapiano, que sempre deu a cara em defesa das vítimas de abuso sexual, “Mário Soares, certamente, teria outra opinião se se desse ao trabalho de consultar” o processo. “E, tal como referiu recentemente o procurador-geral da República, dr. Souto Moura, poderia constatar que a partir do momento em que se começaram a detectar suspeitas em pessoas com poder, ninguém mais quis saber das crianças nem nunca mais se falou em chegar ao fundo dos abusos sexuais na Casa Pia. A principal preocupação foi dizer que a investigação foi mal conduzida”.

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E acrescentou: “A consulta ao processo, nomeadamente às escutas de que foram alvo Paulo Pedroso e Ferro Rodrigues, permite apontar alguns exemplos das acções que foram feitas em surdina para evitar que o ex-deputado do PS ficasse sob a alçada da Justiça”.

Com base nas escutas, Namora lembrou que no início de Maio de 2003 Pedroso avisou Ferro de que se deviam manter em “alerta amarelo”, por temer que fosse feito um “bombardeamento ao embaixador R.”. “Quando prestou declarações no processo, Paulo Pedroso disse que em relação a embaixadores só se lembrava de ter usado tal palavra em conversas com Ferro Rodrigues quando se referiu ao chefe da casa civil do Presidente da República ou em relação à dra. Ana Gomes, frisando que sempre se referiu a esta última como embaixadora.”

Namora frisou, depois, que quando o MP confrontou Pedroso com o facto de nem o chefe da casa civil de Jorge Sampaio ou Ana Gomes poderem ser alvo de qualquer tipo de bombardeamento, o na altura arguido, sustentou que pretendia designar o embaixador russo do Iraque. “Como a coluna diplomática russa tinha sido bombardeada um mês antes, o Ministério Público observou que a conversa entre Ferro e Pedroso só teria sentido se a expressão ‘embaixador R.’ dissesse respeito a Jorge Ritto, que há muito vinha sendo referenciado como estando implicado no escândalo Casa Pia. No dia 20 de Maio de 2003, aliás, Pedroso recebeu um telefonema a informá-lo de que Ritto havia sido detido”.

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Também as escutas onde intervêm António Costa e João Pedroso (irmão e advogado de Paulo Pedroso) provam, para Pedro Namora, que os na altura dirigentes máximos do PS tentaram “tudo” junto de Jorge Sampaio, Souto Moura, José Miguel Júdice (ex-bastonário da Ordem dos Advogados) e João Guerra, “entre outras individualidades”, para evitar que Pedroso fosse detido e desacreditar a investigação junto da opinião pública.

“Há uma conversa entre Ferro Rodrigues e António Costa em que o primeiro diz para o segundo se não estaria na altura de, em ‘off’, divulgar, junto de algumas pessoas, uma fileira de nomes. Quando no DIAP lhe perguntaram a que nomes se referia, Ferro não os quis revelar, remetendo a pergunta para António Costa.”

A concluir, Namora reafirmou a necessidade de Mário Soares se inteirar da forma como foi feita a investigação do processo Casa Pia. “Uma leitura atenta permitir-lhe-á concluir uma coisa muito simples – quando Carlos Silvino era o único implicado, todos os quadrantes políticos pediram ao Ministério Público para levar até ao fim as investigações. Assim que Pedroso foi detido, o Ministério Público passou a ser o bombo da festa.”

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E sublinhou que, até agora, o escândalo da Casa Pia já originou quatro processos: “O que tem como arguidos Carlos Silvino e Carlos Cruz, entre outros; o processo do Parque Eduardo VII, que tem onze arguidos e está em julgamento; o processo de António Sanches, funcionário da instituição já condenado em primeira instância a nove anos de cadeia; e o processo João Beselga, ex-professor de moral da instituição, que também já foi condenado a seis anos de prisão”.

PJ ESCUTOU FERRO E COSTA NO DIA DA DETENÇÃO DE PEDROSO

"FILEIRA DE NOMES EM 'OFF' E NÚCLEO SINISTRO"

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A conversa telefónica a que Pedro Namora fez referência entre Ferro Rodrigues e António Costa aconteceu no dia 21 de Maio de 2003, entre as 18h54.31 e as 18h55.31. Nessa altura, Paulo Pedroso estava no Tribunal de Instrução Criminal, depois de ter sido detido para interrogatório na Assembleia da República.

António Costa (A.C.) – ... sim?...

Ferro Rodrigues (F.R.) – ... Tou Costa ...

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A.C. – ... Ahn...

F.R. – ... Podes falar?...

A.C. – ... Posso...

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F.R. – ... Podes... não tava só a pensar aqui, pá... para os meus botôes se... eh pá... aquela... digamos aquela fileira que... que são conhecidos os nomes... não deveria ser mais divulgada em ‘off’, junto de algumas pessoas, não é...

A.C. – ... Hum... talvez...

F.R. – ... Ahn?...

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A.C. – ... Sim, talvez... talvez...

F.R. – ... Pois... talvez ...

A.C. – ... Do quê?... do núcleo sinistro?...

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F.R. – ... Sim... sim... sim...

A.C. – ... Ah!... tá tratado...

F.R. – ... O NS... NS, Núcleo Sinistro...

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A.C. – ... Tá tratado...

F.R. – ... Tá?...

A.C. – ... Tá tratado...

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F.R. – ... Tá bem... pronto, porreiro...

A.C. – ... Ok?...

F.R. – ... Não sabes nada de especial, não houve sessões...

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A.C. – ... Eh pá, não... falei com o Júdice às sete e meia... ahn... e vou agora falar com o Constâncio... e pronto... Ok?...

F.R. – ... mas não falaste com ele ainda?...

A.C. – ... Ainda não... vou falar agora...

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F.R. – ... É?... Ok...

A.C. – ... Até já...

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