"Os palestinianos querem dizer que isto não começou no dia 7 de outubro, uma vez que estas pessoas viviam sob um bloqueio e um cerco há décadas", disse o norte-americano.
O jornalista, analista e ensaísta norte-americano Nathan Thrall considerou esta sexta-feira que o ataque surpresa do Hamas a Israel, a 7 de outubro, é "um grito de desespero" dos palestinianos ao cerco israelita, mas criticou o envolvimento de civis.
"Se quisermos abordar a questão mais restrita de como aconteceu especificamente o dia 7 de outubro, o grupo que controla Gaza desde 2006 tentou repetidamente negociar um tipo diferente de acordo que resultasse no fim do bloqueio", disse à agência Lusa o autor do livro "Um Dia na Vida de Abed Salama -- Anatomia de uma tragédia em Jerusalém", lançado dias antes do início do conflito entre Israel e o movimento islamita Hamas.
Segundo Thrall, norte-americano que residia em Jerusalém e cuja mais recente obra foi considerada "livro do ano" pelas revistas Time, New Yorker e The Economist, entre outros, os palestinianos envolvidos no Hamas tentaram, em vão, libertar-se do cerco israelita cada vez mais apertado, utilizando quer o disparo de foguetes, quer negociações.
"Tentaram até enviar centenas de pessoas desarmadas para a vedação da fronteira. E nada do que fizeram resultou. Por isso, o que eu vejo no dia 7 de outubro é um grito de desespero, é uma última tentativa de fazer alguma coisa para inverter a situação. Agora, é claro que a forma como o fizeram, num ataque a civis, é absolutamente repreensível e não pode ser defendida", explicitou.
"E, por alguma razão, é muito difícil para as pessoas manterem na sua cabeça duas coisas ao mesmo tempo. Em primeiro lugar, o 7 de outubro não aconteceu no vácuo e, em segundo lugar, a morte de civis, independentemente de quem a comete, é inaceitável", acrescentou Thrall.
Para o autor de "Um Dia na Vida de Abed Salama -- Anatomia de uma Tragédia em Jerusalém", publicado em Portugal pela editora Zigurate, a questão determinante é saber quando tudo começou, pois o conflito, garantiu, data do início da década de 1990, mas quem o afirma acaba por ser duramente criticado.
"Israel quer dizer que isto começou a 7 de outubro, que é um ataque não provocado e que tudo o que está a acontecer desde então é culpa do Hamas. E os palestinianos querem dizer que isto não começou no dia 7 de outubro, uma vez que estas pessoas viviam sob um bloqueio e um cerco há décadas. O cerco é frequentemente datado de 2006, mas as vedações, as autorizações e o encerramento de Gaza começaram, de facto, no início da década de 1990", sustentou.
"E, claro, está a acontecer no contexto de um conflito com mais de 100 anos entre o sionismo e os árabes. E assim, como chegámos aqui pode ser respondido de muitas, muitas maneiras diferentes", referiu o também antigo diretor do Projeto Árabe-Israelita do International Crisis Group (ICG).
Questionado pela Lusa sobre a retaliação israelita ao ataque do Hamas, Thrall defendeu que Telavive "segue um padrão que se vê em todas as guerras anteriores entre Israel e o movimento islamita", em que o número de civis mortos é "totalmente desproporcionado em relação aos objetivos militares".
"Israel, para matar uma pessoa, bombardeou toda uma série de edifícios e matou centenas de pessoas. Isto não segue as leis da proporcionalidade em qualquer definição razoável. Além disso, punir toda a população de Gaza, mais de dois milhões de pessoas que nada têm a ver com este ataque, privando-a de alimentos, água, combustível e eletricidade é, evidentemente, um crime de guerra", acrescentou.
Descreveu o '7 de outubro' como "um dos dois maiores fracassos dos serviços secretos militares" de Israel, igual ao do ataque surpresa da guerra de 1973, a chamada "Guerra do Yom Kipur", envolvendo israelitas e árabes na região próxima ao canal de Suez, na fronteira do Estado de Israel e afirmou não ver sinais de um possível fim do atual conflito, embora esteja a ser gasto muito dinheiro.
"Não creio que Israel possa continuar a fazer isto durante anos. É demasiado caro. Chamaram 300 mil reservistas. Há 200 mil cidadãos israelitas deslocados internamente. Está a custar-lhes mil milhões de shekels, quase 300 milhões de dólares por dia. Não podem e, claro, estão a afundar-se na opinião pública mundial. Há mais pressão dos seus aliados", sublinhou.
"Está a prejudicar o Presidente [norte-americano, Joe] Biden [2024 é ano de eleições presidenciais nos Estados Unidos]. Por todas estas razões, não pode continuar durante anos e a questão é saber em que intensidade continuará e durante quanto tempo. E a discussão atual é que os Estados Unidos estão a dizer que várias semanas com este nível de intensidade, o que é uma loucura, significará que muitos milhares mais serão mortos", sustentou.
Para Thrall, Telavive será forçado a acabar com a guerra mais cedo do que pretendia e "também o fará sem atingir o seu objetivo".
"O seu objetivo é, de facto, inatingível. É a erradicação do Hamas. E o Hamas não existe apenas em Gaza. Existe na Cisjordânia, existe na diáspora palestiniana e, se olharmos para as sondagens de opinião pública atuais, o Hamas, porque é visto como o único grupo que está realmente a lutar contra Israel, contra a ocupação, a tentar fazer algo para libertar os palestinianos, é extremamente popular. Na última sondagem realizada, é três vezes mais popular do que a Fatah, e é cerca de oito vezes mais popular do que a Autoridade Palestiniana", concluiu.
No seu ataque em território israelita a 7 de outubro, o Hamas matou mais de 1 200 pessoas, na sua maioria civis, e raptou mais de duas centenas de pessoas.
Segundo números divulgados pelo Hamas, a retaliação das Forças de Defesa de Israel já fizeram mais de 17 mil mortos.
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