Shein, a marca chinesa acusada de plágio que 'explodiu' de mão dada com influencers
Levi's e AirWair [Dr Martens] já moveram processos contra a empresa chinesa que produz quase inteiramente para o mercado externo e usa análise de dados e contratos promocionais com famosos para expandir o negócio. Designer portuguesa acusa a marca de roubo.
Apontada como uma das startups mais valiosas do planeta, a Shein [she-in], que pode até passar despercebida para os menos jovens ou para os que não utilizem a internet para comprar roupa, é já uma das maiores marcas de fast fashion do Mundo.
Adolescentes e mulheres jovens são o público alvo da marca que canaliza todas as vendas através do seu site e aplicação para smartphone, entregando uma variedade de produtos ampla - mais do que empresas como Zara ou H&M - e por um preço extremamente tentador.
Segundo dados da Business of Fashion, em 2020, a Shein consegiu um volume de negócio no valor de 9 mil 715 milhões de euros, o dobro do que tinha alcançado em 2019. A empresa tem conseguido um crescimento sustentado ao longo dos anos [foi fundada em 2008 por Chris Xu] e é apoiada pela grande capacidade de produção chinesa.
A Shein já está presente em mais de 220 países em todo o Mundo através da sua plataforma online e tem instalações logísticas em vários locais do globo.
No entanto, nem só de lucros vive a chinesa. As polémicas têm surgido ao longo dos últimos anos e a empresa já foi processada pela AirWair International - criadora da icônica Dr. Martens - e também pela Levi Strauss. No caso da Levi's, estará em causa a cópia do formato do símbolo da marca norte-americana.
Em Portugal há também quem se queixe de plágio por parte da gigante chinesa. A ilustradora portuguesa Lara Luís denunciou o roubo de uma ilustração sua e que estava a ser vendida no site da Shein por apenas seis euros estampada numa t-shirt.
De mão dada com influencers
O sucesso da empresa pode ser explicado de várias formas mas as mais óbvias são mesmo os preços significativamente baixos dos seus produtos e a relação de proximidade que tem com milhares de influenciadores nas principais redes sociais do momento, Instagram e TikTok.
As maiores 'campanhas' de marketing da empresa são mesmo feitas através das redes sociais. A empresa conseguiu estabelecer acordos com vários utilizadores populares nestas duas redes para que estes publicitem e anunciem roupas da marca ou ofertas exclusivas para novos utilizadores através de códigos de desconto personalizados. Existirá ainda um plano de 'afiliados' que lucram ao mesmo tempo que a empresa consegue aumentar o volume de vendas através desta publicidade.
O relato de Laura Illanes
"Tenho que promover as roupas nas minhas redes sociais", diz Laura Illanes, uma estudante, de 22 anos, com mais de 36 mil seguidores no Instagram. "Eles fornecem-me um código de desconto de 15% de desconto e depois tenho de partilhar com os meus seguidores", revelou Illanes. Em troca da promoção do site e das roupas nas suas redes sociais, Illanes contou à Reuters que ganhava, por mês, seis produtos grátis da Shein.
Polémicas e processos
Nem só de lucros e vendas vai vivendo a Shein. A empresa chinesa tem sido acusada por várias marcas - de maior e menor dimensão - de violação de marca registada "deliberada e calculada", como refere o Financial Times.
A criadora das icónicas botas Dr. Martens, AirWair International, processou a Shein por querer vender "falsificações" da marca. Os documentos judiciais dizem mesmo que há "intenção clara de vender falsificações" por uma fração do custo de um sapato da Dr. Martens.
A AirWair acusa ainda a Shein de utilizar fotografias de calçado original da Dr Martens para publicitar artigos no site da marca chinesa. A empresa nega todas as acusações e o caso vai a tribunal no final do ano.
Mas em todo o mundo surgem relatos de designers e artistas que acusam a Shein de roubo de propriedade intelectual. Kikay, uma marca de brincos com sede em Los Angeles, nos EUA, foi alertada para a venda de designs iguais aos seus no site da marca chinesa.
Vítimas também em Portugal
De Portugal surgem também relatos de roubo de ilustrações para estampas em camisolas vendidas a baixo custo. A denúncia é de Lara Luís na sua página de Instagram.
Ao CM, a designer portuguesa diz sentir-se "frustrada e de coração partido". "Senti-me frustrada por mais uma vez estarem a copiar um trabalho meu mas na altura nem sabia da dimensão que tudo isto viria a ter", disse ao CM, Lara Luís.
Perante este caso de plágio, a artista tem vontade de fazer justiça, mas "é impossível apagar tantos fogos sozinha sem recursos legais" que a defendam, confessa.
As possibilidades financeiras que a impedem de arranjar um advogado e o facto de não conseguir - pelas mesmas razões - registar globalmente os seus desenhos são razões que não permitem que Lara Luís faça justiça contra "marcas gigantes como a Shein". "Não há nada que possa fazer e é um sentimento excruciante. Estou de coração partido", confessa.
Levi Strauss processou a Shein
Em 2018, num processo idêntico ao movido pela AirWair, a Levi's acusou a Shein de ter copiado o símbolo da marca que normalmente é visível nos bolsos traseiros das calças de ganga. Este caso terminou com um acordo não divulgado, segundo o Financial Times.
Pandemia não afetou o negócio
A pandemia não afetou o negócio, pelo contrário. A Shein continua a registar um aumento no volume de vendas, especialmente porque todas as encomendas são tratadas através da Internet, não existem lojas físicas.
Até outubro de 2020, a Shein tinha atingido 229,4 milhões de downloads, superando H&M e a Zara. Segundo dados revelados pela Reuters, a H&M conseguiu 123,5 milhões e a Zara 90,6 milhões. Na última semana de setembro de 2020, a Shein foi a aplicação de compras mais transferida em iPhones, de acordo com a plataforma 'App Annie'.
Já este ano, nos EUA, a Shein conseguiu roubar a coroa à Amazon e tornou-se a aplicação de compras mais descarregada para iOS e Android. Em maio, a Shein era a principal aplicação de compras para iOS em 54 países e estava entre os primeiros na mesma categoria em dispositivos Android de 13 países.
A origem
Apesar de Chris Xu ser apontado como fundador da marca, pouco se sabe sobre ele. A história da Shein terá começado oficialmente em 2012 quando Chris desistiu do seu negócio de vestidos de noiva para adquirir o domínio Sheinside.com. Em 2015 o nome da empresa mudou para Shein e apontou ao mercado externo.
Os Estados Unidos são hoje o maior mercado da Shein, embora a marca já esteja em mais de 220 países da Europa ou Médio Oriente.
A empresa tem já seis centros de logística em Foshan, Nansha, Bélgica, Índia e nas costas leste e oeste dos Estados Unidos. A marca conta ainda com sete centros de atendimento ao cliente. Na totalidade, a Shein empregará mais de 10 mil pessoas.
O centro de operações da cadeia está localizado em Panyu. Tal como a Zara, todas as empresas de cadeia de manufacturação ligadas à Shein estão localizadas naquela região, o que permite um ágil e rápido processo de manufactura.
Da produção à venda
Os artigos vendidos pela Shein são fabricados através de uma grande rede de fornecedores com sede na China. A empresa utiliza um sistema de análise de dados para transformar as tendências no mundo da moda em produtos de baixo custo para a empresa e também para o consumidor, tudo isto em tempo recorde.
Se a Zara consegue trazer produtos novos para as suas prateleiras de três em três semanas, a Shein, em apenas uma semana, consegue disponibilizar uma série de novos modelos através das suas plataformas online. Se a Inditex [dona da Zara] cria cerca de 50 mil modelos novos de roupa por ano, a Shein consegue colocar online 30 mil novos produtos numa semana, segundo um cálculo da Caixin, citado pelo jornal Folha de São Paulo.
Como forma de garantir a qualidade dos seus produtos, a Shein avalia todos os seus fornecedores e os 10% que apresentarem pior desempenho a cada trimestre deixam de trabalhar com a marca, segundo revela um funcionário de uma empresa de roupa feminina de ginástica citado pelo Folha de São Paulo.
O grande volume de encomendas permite que a Shein seja elegível para envios com portes de baixo custo e outras vantagens disponibilizadas pelo serviço postal chinês, reduzindo assim os custos da empresa.
A verdade é que, se uma calças na concorrente Zara podem custar cerca de 30 euros, a Shein consegue vender um produto idêntico por metade do preço. A popularidade, essa, cresce de dia para dia... mas as críticas e processos em tribunal também.
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