Conferência Episcopal de Moçambique defendeu que a marginalização da juventude pode fazer alastrar a insurgência armada no país.
Analistas disseram este domingo à Lusa que a falta de políticas de emprego "mais ambiciosas" em Moçambique para acabar com "a marginalização dos jovens" pode "alargar a base de recrutamento" do extremismo violento no país.
Os bispos católicos transmitiram, na terça-feira, ao Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, a sua preocupação com a vulnerabilidade da juventude face ao recrutamento por grupos insurgentes, nomeadamente os que realizam ataques armados no norte do país, reiterando uma posição que já tinham tomado no dia 16, em conferência de imprensa.
Comentando a posição dos bispos, Fernando Lima, jornalista e presidente do Mediacoop, o mais antigo grupo de comunicação social de Moçambique, afirmou que a mensagem dos líderes católicos moçambicanos traduz uma "preocupação genuína de todo o país" e um alerta para que se adotem "políticas de emprego mais ambiciosas e agressivas" para os jovens.
"O Governo está atrasado no ataque ao desemprego jovem, sobretudo na província de Cabo Delgado, onde eclodiu esta violência armada que tende a descontrolar-se", disse Fernando Lima.
O executivo, prosseguiu, deve adotar estratégias de emprego mais pragmáticas e consentâneas com a realidade de zonas pobres, mas com recursos naturais.
"O argumento da falta de qualificações para empregar os jovens em multinacionais que operam com tecnologia de ponta não será procedente e não vai travar a violência, é preciso apostar em formação acelerada para empregar trabalhadores com menos competências, mas que sejam necessárias nos megaprojetos", avançou.
O jornalista assinalou que "o desemprego e a falta de horizontes são também causas da delinquência nos centros urbanos".
Adriano Nuvunga, politólogo e diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), organização da sociedade civil, considerou que o desespero provocado pelo desemprego poderá "aumentar a vulnerabilidade e alargar a base de recrutamento por parte do extremismo violento".
"A pobreza abjeta é, sem dúvida, uma das raízes do extremismo violento. É preciso criar uma esperança para os jovens não serem aliciados por grupos terroristas", declarou Nuvunga.
A marginalização dos jovens é um "flagelo crónico" em todo o país, mas a questão ficou "mais explosiva em Cabo Delgado", porque "começou a haver manifestações de muita riqueza com a presença de multinacionais, estrangeiros e membros da elite moçambicana", apontou.
"Com os projetos de gás natural em andamento, as diferenças e as injustiças sociais ficaram mais expostas e foram aproveitadas por extremistas para estas reações violentas que estamos a ver", enfatizou Adriano Nuvunga.
Dércio Alfazema, analista e diretor de projetos do Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD), organização não-governamental, também apontou o elevado desemprego como causa de violência e insegurança em Cabo Delgado, assim como no resto do país, alertando para o perigo de "simplificação" dos fatores de conflitualidade social.
"Qualquer tipo de violência deve merecer um estudo e análise mais profundas, porque as causas são sempre várias", advogou Alfazema.
Para dar substância à sua tese, o dirigente do IMD afirmou que todas as províncias do país têm "bolsas de pobreza e desemprego gritantes", mas apenas Cabo Delgado regista uma onda de violência associada ao extremismo.
"O desespero e a falta de perspetivas nos jovens é comum em todo o país, pelo que é preciso aprofundar o conhecimento das causas de violência em Cabo Delgado, para não cairmos em simplismos", defendeu.
Na mensagem que divulgou na semana passada, a Conferência Episcopal de Moçambique (CEM) defendeu que a marginalização da juventude pode fazer alastrar a insurgência armada no país, apontando a "falta de esperança no futuro" entre os jovens como uma das causas da violência em Cabo Delgado.
"Reconhecemos que um dos motivos que move os nossos jovens a se deixarem aliciar e a juntar-se às várias formas de insurgência, desde a criminalidade ao terrorismo, assenta na experiência de ausência de esperança num futuro favorável", declarou o porta-voz da CEM, João Carlos.
Para a CEM, a maior parte da juventude, principalmente no meio rural, sente-se marginalizada pelo poder político, o que resulta da ausência de um "projeto comum" para o desenvolvimento do país.
"É fácil aliciar pessoas, cheias de vida e sonhos, mas sem perspetivas e que se sentem injustiçadas, vítimas de uma cultura de corrupção, a aderirem a proposta de uma nova ordem social imposta com a violência", afirmou João Carlos, que é também bispo de Chimoio.
Grupos armados aterrorizam Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.500 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e 714.000 deslocados, de acordo com o Governo moçambicano.
O mais recente ataque ocorreu em 24 de março contra a vila de Palma, provocando dezenas de mortos e feridos, num balanço ainda em curso.
As autoridades moçambicanas recuperaram o controlo da vila, mas o ataque levou a petrolífera Total a abandonar por tempo indeterminado o recinto do projeto de gás com início de produção previsto para 2024 e no qual estão ancoradas muitas das expectativas de crescimento económico de Moçambique na próxima década.
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