Eduardo Cabrita liderou a pasta da Administração Interna durante quatro anos. Para além do Ministro da Administração Interna mais tempo em funções, foi seguramente o Ministro mais polémico neste setor.
Inevitavelmente Eduardo Cabrita deixa um legado de polémicas que envolveram diversos setores desde Segurança Interna, Proteção Civil e até Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que dificilmente algum Português se poderá orgulhar.
Assumiu a pasta do MAI logo a seguir à tragédia de Pedrogão Grande, no setor dos incêndios florestais tomou medidas de acordo com as orientações de António Costa e através da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), fez "tábua rasa" ao sistema de defesa da floresta que existia até então, entrou em conflito direto com os Bombeiros, criando novas estruturas de prevenção e combate, aumentando brutalmente o orçamento das forças existentes e recentemente criadas, em detrimento dos Bombeiros que mantiveram o orçamento num claro sinal de desvalorização e desprezo pelo trabalho que os Bombeiros Portugueses realizaram na luta contra os incêndios durante décadas. Em 2017 Portugal gastava 143 milhões de euros na defesa da floresta e em 2021 o orçamento passou para 635 milhões de euros. Apesar deste aumento o orçamento dos Bombeiros manteve-se praticamente igual e não reduziram a atividade no setor.
Ainda em 2018 continuou a sua demanda contra os Bombeiros, forçando alterações estruturais muito polémicas no setor, ignorando de forma arrogante os protestos e reivindicações com declarações que envergonham qualquer democracia. Chamou publicamente irresponsáveis aos mais de 400 Comandantes dos Corpos de Bombeiros do Pais, por apenas terem interrompido o fluxo de informação estatística para a tutela, em sinal de protesto. Esta medida não tinha qualquer consequência nas operações de proteção e socorro. Sempre arrogante, incoerente e com um claro desconhecimento da realidade do setor, fez declarações "incendiárias" e de total desrespeito pelos milhares de Bombeiros que servem o País.
Pouco tempo depois, tendo sido confrontado por uma jornalista sobre o tipo de golas em tecido sintético que eram distribuídas no projeto "aldeias seguras pessoas seguras", como sendo golas antifogo, Eduardo Cabrita reage de forma agressiva, batendo nos microfones dos jornalistas e com as suas declarações mais uma vez incendiou os órgãos de comunicação social e a opinião publica. Não assume qualquer tipo de responsabilidade política, mudando pouco depois o discurso e desvalorizando a polémica que ele próprio gerou devido às investigações que levaram a identificar irregularidades nos concursos de aquisição das golas, que não passavam de lenços promocionais.
Em 2020 um cidadão Ucraniano morre devido aos maus tratos infligidos por inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), revelando-se um conjunto de inconformidades e problemas estruturais. Mais uma vez Eduardo Cabrita não assume as suas responsabilidades políticas, envergonhando o País numa clara desvalorização dos direitos humanos. Opta por extinguir o SEF de forma abrupta. Medida que aparentemente e na opinião de muitos especialistas representa um retrocesso sem precedentes no setor, em que ninguém sabe muito bem as verdadeiras consequências desta medida. Nem mesmo as instituições que irão acumular as responsabilidades e funções do SEF.
Em junho deste ano o carro onde seguia Eduardo Cabrita, atropelou um trabalhador que executava trabalhos de manutenção na A6. Este trágico acontecimento que resultou na morte de Nuno Santos, desencadeou a polémica declaração do Ministro que garantia não existir sinalização quando os trabalhos estavam a ser realizados na autoestrada, numa clara tentativa de "fugir" às suas responsabilidades morais e políticas, mesmo sabendo que poderia estar a penalizar a família da vítima em termos indemnizatórios, demonstrando total insensibilidade pelo trágico acontecimento em que estava envolvido. Esta declaração foi desmentida pelo Ministério Público que na acusação de homicídio por negligência ao Motorista, confirma a existência de sinalização que não foi respeitada pelo veículo que circulava a mais de 160 km/hora.
Na sua declaração de exoneração do cargo de Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita menciona o aproveitamento político da oposição devido ao acidente. Aproveitamento que utilizou inúmeras vezes quando mencionava os excelentes resultados da prevenção rodoviária, mas não referia que em confinamento pandémico o País parou a circulação rodoviária, ou os excelentes resultados do combate aos incêndios florestais em que as condições meteorológicas muito favoráveis não foram sequer mencionadas. Ou até mesmo ao considerar que num estado de direito, um Ministro que circula num veículo de serviço a 160 km/h é apenas um passageiro. É caso para dizer que sabe muito bem o que é aproveitamento político.
Terá sido dos Ministros mais controversos e polémicos na história da nossa democracia. Também dos mais resilientes com um forte instinto de sobrevivência política. Mas na verdade, deixa um legado polémico e sombrio que perdurará nas instituições tuteladas pelo MAI através de algumas opções estratégicas que terão efeitos a médio longo prazo.
Esta demissão apenas peca por tardia.
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