Há um velho ditado popular que diz muito sobre a incapacidade de planeamento em Portugal: “Só nos lembramos de Santa Bárbara quando troveja”. O dilúvio que deixou um rasto de destruição, desespero e avultados prejuízos na área de Lisboa até pode ser um sinal das alterações climáticas, mas a verdade é que este fenómeno é relativamente frequente.
Muita gente se recorda da tragédia de novembro de 1967, que ceifou centenas de vítimas. O número total de mortos ainda hoje é um mistério, porque a censura da ditadura impediu que ficássemos a conhecer toda a verdade. E desde aí quase nada aprendemos. As barracas da ribeira de Odivelas arrasadas pelas cheias deram lugar a prédios que aumentaram a impermeabilidade dos solos. As quintas de Benfica deram lugar a mais betão. Quantas vezes o arquiteto Gonçalo Ribeiro Telles alertava para esses perigos e avisava para a necessidade de uma cidade com corredores ecológicos, que respeitassem também a corrente das águas. A zona de Sete Rios não se chama assim por acaso. As tempestades podem tornar-se mais frequentes, mas a incúria na gestão do território e a falta de previsão já é um fenómeno antigo.