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Provedoria considera ilegal exigência de título de residência para atestados de residência a estrangeiros

Em causa está uma ordem da presidente da Junta de Freguesia de Arroios.

14 de outubro de 2025 às 15:47

A exigência de título de residência válido para a emissão de atestados de residência a cidadãos estrangeiros "encontra-se desprovida de suporte legal", considera a Provedoria de Justiça, em resposta a uma queixa apresentada pelo Bloco de Esquerda.

Em causa está uma ordem de serviço da presidente da Junta de Freguesia de Arroios, em Lisboa, de 9 de fevereiro de 2024, onde determinou, a partir daquela data, "a obrigatoriedade de apresentação de título de residência válido para emissão de atestados de residência a cidadãos estrangeiros, extracomunitários, não se considerando como documento adequado a mera exibição de passaporte com visto de entrada".

A determinação originou uma queixa das eleitas do Bloco de Esquerda na Assembleia de Freguesia de Arroios, enviada à Provedoria de Justiça em 1 de março de 2024.

A lei estabelece que para esse atestado é suficiente o testemunho de duas pessoas recenseadas na freguesia ou uma declaração de honra da pessoa que requer o documento.

Em resposta, datada de 11 de agosto, mas da qual o BE só teve conhecimento no dia 05 de outubro, o provedor-adjunto Ravi Afonso Pereira adianta que a Junta de Freguesia de Arroios foi notificada para que "deixe de ser obstáculo na obtenção de documentos essenciais para a integração de pessoas migrantes".

Madalena Natividade, presidente cessante da Junta de Freguesia de Arroios (eleita nas listas da coligação "Novos Tempos", liderada pelo social-democrata Carlos Moedas) foi informada pela Provedoria da "necessidade" de alterar os procedimentos da emissão de atestados de residência a cidadãos estrangeiros.

Madalena Natividade será substituída à frente do executivo por João Jaime Pires, eleito nas autárquicas de domingo domingo pela coligação "Viver Lisboa", que juntou PS, Livre, BE e PAN.

Questionada pela Lusa na sequência da ordem de serviço aprovada no ano passado, Madalena Natividade respondeu, por escrito, que está obrigada ao "estrito cumprimento" da lei no âmbito das suas atribuições e competências legais, o que inclui estar "impedida de emitir documentos que contenham declarações e outras decisões que não estejam em conformidade com a lei aplicável".

Assim, disse, a autarquia "tem o dever" de "solicitar que o requerente faça prova de ser, de facto e de direito, titular de título de residência válido".

O caso gerou indignação e foi contestado pelo anterior Governo socialista e por representantes de PS, BE e CDU (PCP/PEV) na freguesia de Arroios.

Desencadeou ainda manifestações de coletivos e associações em frente à junta de Arroios, freguesia onde vivem cidadãos de dezenas de nacionalidades, muitos dos quais em situação precária, e protestos dos profissionais de saúde da zona, dado que o atestado de residência é um documento essencial para garantir as devidas comparticipações e taxas moderadoras a pessoas em situação irregular.

Na decisão comunicada em agosto, a Provedoria de Justiça constata ainda que "a flexibilidade do regime" do atestado de residência "tem gerado problemas no plano da sua aplicação", revelando-se "um campo fértil para práticas divergentes entre freguesias, criando-se desigualdade no tratamento dos interessados".

A ordem de serviço da junta de Arroios determina que o procedimento de emissão de atestado de residência "seja acompanhado de especial atenção, dadas as situações ilegais" com que alegadamente se tem confrontado.

A este propósito, o provedor-adjunto reconhece que não podem "desconsiderar-se as preocupações das juntas de freguesia quanto à integridade dos atos que praticam, tanto mais quando se verifica uma erosão, sobretudo nos grandes centros urbanos, das relações de proximidade e de vizinhança entre os fregueses e entre estes e as respetivas juntas".

Em comunicado enviado na sexta-feira, a associação SOS Racismo acusou o executivo liderado por Madalena Natividade de, apesar das "múltiplas denúncias públicas de mais de uma centena de organizações, de centenas de pessoas e da própria Anafre [Associação Nacional de Freguesias]", ter continuado "a cometer atos ilegais, agudizando assim a estigmatização e a criminalização da condição de imigrante".

Num parecer emitido em março de 2024, a Anafre defendeu que a emissão pelas freguesias de atestados de residência a cidadãos estrangeiros não precisa da apresentação de qualquer título de residência porque não é competência destas autarquias aferir a legalidade de permanência de imigrantes no país.

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