Descoberto manuscrito inédito com poema de diplomata português sobre viagens de Colombo

Documento terá passado despercebido aos investigadores, apesar de surgir como uma breve referência num antigo catálogo compilado pelo padre Alexandre Olivar em 1977.

15 de outubro de 2025 às 00:36
Quadro com retrato de Cristovão Colombo
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Uma investigadora descobriu o único manuscrito conhecido do poema épico "O Novo Mundo" na Biblioteca da Abadia de Montserrat, em Barcelona, obra do poeta e diplomata português Francisco Botelho de Moraes e Vasconcelos (1670-1747).

A Universidade de Barcelona (UB) divulgou na terça-feira a descoberta completamente inédita, considerando-a de "grande valor filológico e histórico, pois representa a primeira obra épica escrita em espanhol com Cristóvão Colombo como protagonista".

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O documento terá passado despercebido aos investigadores, apesar de surgir como uma breve referência num antigo catálogo compilado pelo padre Alexandre Olivar em 1977.

O manuscrito, com aproximadamente 40 páginas e diferenças assinaláveis em relação à edição impressa de 1701, contém excertos que não constavam do texto conhecido até então, alguns dos quais podem ter sido apagados ou modificados por razões ideológicas.

A descoberta foi realizada pela investigadora de pós-doutoramento Claudia García-Minguillán.

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O poema apresenta Colombo como um herói do imaginário político do início do século XVIII e insere-se num período de forte tensão dinástica, pouco antes do início da Guerra da Sucessão de Espanha.

O contexto em que a obra foi escrita - Barcelona em 1701 - é fundamental para compreender a estratégia de Botelho de Moraes e Vasconcelos, figura intimamente ligada à cena intelectual e diplomática da cidade e associada aos círculos austríacos.

O autor participou na fundação da Academia dos Desconfiados, antecessora da atual Real Academia de Letras de Barcelona, e assumiu um claro compromisso literário de ligar as proezas de Colombo aos valores políticos dos apoiantes do arquiduque Carlos de Áustria.

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O manuscrito, que será agora objeto de uma edição crítica e de um estudo monográfico, revela também uma intenção estética singular: apesar de escrito em espanhol, a composição segue modelos épicos clássicos mais comuns nas tradições latina e italiana.

A escolha do espanhol, neste caso, responderia a um desejo de intervir no debate cultural e ideológico da monarquia espanhola, defendeu a investigadora.

A descoberta foi possível graças a uma investigação sistemática do acervo da biblioteca monástica e a um cruzamento de referências bibliográficas com materiais manuscritos não catalogados.

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Segundo García-Minguillán, "o manuscrito permaneceu fora dos circuitos habituais de investigação durante décadas, pois nunca tinha sido digitalizado ou transcrito, e a sua autoria não foi explicitamente identificada em nenhuma base de dados moderna".

O estudo de 'El Nuevo Mundo' insere-se num projeto de investigação mais vasto, apoiado pelo Ministério da Ciência, Inovação e Universidades de Espanha, pelo Serviço Alemão de Intercâmbio Académico (DAAD) e pela Fundação Calouste Gulbenkian, para reconstruir as motivações políticas, literárias e culturais de Botelho de Moraes e Vasconcelos, bem como as dinâmicas de criação e censura na esfera literária da Barcelona barroca.

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