DESEMPREGO AFECTA ACTORES PORTUGUESES

Num país onde o desemprego é uma realidade assustadora, também os actores sentem na pele o problema. Mas há quem consiga dar a volta à crise: Maria Dulce arranjou forma de ultrapassar a depressão, Florbela Queiroz mudou de vida…

07 de fevereiro de 2004 às 00:00
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A actriz Lídia Franco deu o mote. Numa entrevista recente, queixou-se da falta de trabalho e lamentou o facto de estarem a chegar ao fim os tostões que amealhou com o seu trabalho em ‘Nunca Digas Adeus’ (2002, TVI) e ‘Olá Pai’ (em exibição na TVI). Este não é, porém, o único caso. Outros ‘veteranos’ da representação encontram-se nessa condição há anos. Mas há quem tenha conseguido dar a volta à crise.

“Nós vivemos do nosso trabalho. Não faço nada há um ano e três meses porque neste tempo ninguém me chamou”, afirma ao Correio TV Maria Dulce, que vimos pela última vez na telenovela ‘Anjo Selvagem’ (que começou em Setembro de 2001 e terminou em Fevereiro de 2003 na TVI). A situação arrasta consigo um role de dificuldades. “É tudo negativo, desde as condições de subsistência até ao problema da ocupação espiritual”, revela a actriz, que já completou 53 anos de carreira.

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Nem todos os que deixámos de ver no pequeno ecrã estão desempregados. Embora mais novo que Maria Dulce, Nuno Homem de Sá, que vimos em ‘Roseira Brava’ (1995, RTP1) e reapareceu em 2002, eclipsou-se desde então. “O público não iria levar-me muito a sério depois de eu ter participado no ‘Big Brother Famosos’”, argumenta o actor. E acrescenta: “Nasceu-me, também, uma filha e as propostas de trabalho que recebi então não eram aliciantes”, revela. Por isso, fez uma paragem voluntária, durante a qual deu aulas de teatro. Agora, afirma-se interessado em regressar à actividade. “Estou a encarar novas oportunidades, preferencialmente telenovelas, séries e teatro”, revela.

O problema da paragem forçada afecta sobretudo os mais velhos, alguns dos quais de reconhecida qualidade. Depois de mais de duas dezenas de participações em criações televisivas, António Montez, que interpretou o papel do industrial ‘Luís Pimenta Marques’ na série ‘O Olhar da Serpente’ (uma aposta da SIC anunciada em 2002, que acabou por ter ‘despachada’ para a madrugada em 2003), afirma amargamente: “Actualmente não tenho perspectivas nenhumas.” O seu caso é sério: “A situação afecta-me profundamente”, assume.

A actual produção televisiva privilegia os mais novos. Segundo Montez, as telenovelas e séries “reúnem uns jovenzinhos, a quem juntam um casal de meia-idade ou mais velho, e seguem em frente.” Este actor questiona, também, a qualidade do produto, que, se não for tida em conta, pode comprometer o futuro do sector. “A ficção nacional, que já deu um pulo, necessita agora de um grande investimento na qualidade”, argumenta. Em sua opinião, são boas histórias e bons e experientes actores que fazem falta. “Parece que estão a fazer a aposta que já fizeram no Brasil, e que aí mesmo acabou por ser abandonada – é chapa 5, respeitável, mas não perdura”, afirma. Refere, entre muitos dos seus trabalhos, alguns que lhe deram prazer e que obedeceram a critérios de qualidade que reputa indispensáveis: ‘Na Paz dos Anjos’ (1994, RTP1) e ‘O Conde d’Abranhos’ (2000, RTP1), além do referido ‘O Olhar da Serpente’.

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Perante o impasse, alguns actores decidiram mudar de vida. É célebre o caso de Florbela Queiroz, muito falado quando a actriz colocou anúncios em jornais pedindo emprego. Hoje é peremptória: “As pessoas têm que pensar e partir para outra.” Florbela dedica-se à tarologia e à cristaloterapia, actividades pelas quais se interessava desde há 30 anos, mas que eram apenas objecto da sua curiosidade. Tirou um curso. Agora ganha dinheiro com elas.

A ocupação do tempo é um problema chave para os artistas sem colocação. “Eu não preciso de dinheiro, preciso é de trabalho”, sublinha Florbela Queiroz, que vimos em 1994 na telenovela ‘Desencontros’ (RTP1) e, mais recentemente, numa participação na série ‘Super Pai’ (2002-3, TVI).

Não será o caso da maioria, mas a própria Maria Dulce, cuja paragem chega ao fim nesta semana, com o início das gravações de ‘Sentimentos’, afirma: “Foi muito doloroso, mas tenho-me mantido ocupada no meu pequeno jardim e horta, leio muito, vejo quase tudo na TV para me manter actualizada”, confessa.

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Entre aqueles que se lançaram em novas actividades, são muito recordados os exemplos de José Viana, que se dedicou por inteiro à pintura antes de falecer, e de Carlos Miguel, que se entretém a escrever e a pintar, segundo o testemunho de Florbela Queiroz.

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