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O hábito não faz a freira de Doce Fugitiva

Rita Pereira veste o disfarce de uma freira para protagonizar a nova telenovela da TVI. Mas na fábrica de chocolate onde trabalha, vai dar mais atenção aos doces do que à religião...

20 de outubro de 2006 às 00:00

Padres e frades, freiras e noviças, ingénuos ou rebeldes, povoam os enredos da ficção nacional. ‘Doce Fugitiva’, novela a estrear na TVI, recorre à receita já usada em ‘O Processo dos Távora’, na RTP1, ‘O Crime do Padre Amaro’, na SIC, e ‘Anjo Selvagem’, na TVI, onde as figuras de personagens religiosas são uma presença incontornável. Mas estarão todos de acordo com este recurso?

A vida de Estrela, a protagonista da estória de ‘Doce Fugitiva’ muda no dia em que, para fugir à prisão, troca de identidade com uma freira, vítima mortal de um acidente de viação. Com o hábito, Estrela assume também a profissão da falecida freira, a de mestre em doçaria conventual. Ao longo da narrativa, a jovem, em fuga permanente às autoridades, vai ter de engendrar muitos planos para tentar ser credível e conseguir manter o seu disfarce religioso.

“A Estrela não é freira na realidade, mas vai ter de lidar com o disfarce. E a cada gesto e em cada frase terá de lembrar-se deste facto. E como esta situação é muito difícil, a Estrela vai dar muita barraca”, conta Rita Pereira, a actriz que veste a pele da personagem. O recurso às personagens religiosas é recorrente na ficção nacional. Recorde-se o êxito que foi ‘Anjo Selvagem’, na TVI, cuja protagonista, Mariana (Paula Neves) nasceu e cresceu num convento. No núcleo das figuras religiosas sobressaía o Padre Manuel (Canto e Castro), a Madre Superiora (Maria Dulce) e a Irmã Bochechas (Cristina Cavalinhos).

A Maria Dulce a sua personagem de ‘Anjo Selvagem’, a Madre Superiora do convento, só lhe traz “boas recordações”. E conta um episódio passado no Alentejo, onde mora, uns dias depois de a telenovela ter terminado: “Ia eu de carro quando sou apanhada numa operação stop. O agente, um homem dos seus 40 e tal anos, pede-me os documentos do automóvel, dá uma volta ao veículo, aproxima-se de mim, e devolve-me os documentos dizendo: “A sua bênção Madre Superiora”. Ao que eu respondi: “Deus te abençoe meu filho”. Ao mesmo tempo fiz-lhe o sinal da cruz. E ele remata: “Pode seguir”. E eu segui viagem. Acho que cada um de nós se deve ter ficado a rir, ele na estrada, eu dentro do meu carro”.

A conhecida actriz, que acha “interessante o recurso às figuras religiosas na ficção”, conta que interpretou muitas vezes estes papéis. “Em Espanha fiz umas duas ou três personagens religiosas, e em Portugal fui muitas vezes madre e freira no teatro, no cinema e na televisão. Desde que esses personagens tenham conteúdo e estejam inseridos num contexto, faz todo o sentido recorrer a elas”. Também ‘Olhos de Água’, outra produção da TVI, tinha uma personagem religiosa no seu enredo, o Padre Carlos, personagem interpretada por Tozé Martinho. A propósito deste recurso da ficção, o actor e autor diz à Correio TV que ele tem “a obrigação de já não chocar ninguém. E acrescenta: “Apesar de não conhecer a estória de ‘Doce Fugitiva’, acho que não virá daí mal ao Mundo”.

O Padre José Borga sublinha que “os telespectadores já estão habituados à inclusão de personagens religiosas na ficção”. “Os padres e as freiras são estereótipos que servem para o público perceber o estatuto profissional das personagens. E a novela vale o que vale. Mas se o disfarce funciona significa que a interpretação é credível”. Já o Padre Vítor Melícias entende que “a ficção quanto mais ficcionada é, mais simpática é e não estorva nada”. Todavia, este porta-voz da Igreja levanta uma questão jurídica: “Está previsto no código penal que usar fardas sem autorização é crime. Vestir uma farda de militar ou uma batina de padre sem o ser é crime porque pode levantar questões morais e jurídicas”.

E enquanto o Padre António Rego prefere não se pronunciar alegando não conhecer a novela, Lili Caneças, que se assume “cristã”, “pessoa com fé” e “tolerante”, diz: “Eu jamais recorreria a uma brincadeira mais ou menos séria de modo a provocar a indignação alheia. Não se pode atingir a fé das pessoas”. Mesmo ressalvando não conhecer a estória de ‘Doce Fugitiva’, Lili Caneças recorda o filme ‘Música no Coração’, a fita mais rentável da história do cinema, onde a protagonista (Julie Andrews) era uma noviça rebelde que sai do convento para ir trabalhar em casa da abastada família Von Trapp. “Sou cristã, passei o dia 13 de Outubro em Fátima, e sou uma pessoa apaziguadora. Vivemos num mundo conflituoso e muitos são aqueles que procuram provocar polémica. Não me choca a Madonna, nem a última festa da ‘Lux’, cheia de freiras e cardeais, alguns deles um pouco andrógenos. Já não digo o mesmo do que fez Salvador Dali, um dos meus pintores preferidos”.

Quem, ao longo da sua vasta carreira, interpretou várias personagens religiosas foi o actor Ruy de Carvalho. Apesar de nunca se ter estreado como religioso em telenovela, o conhecido actor fez interpretações notáveis no teatro. Foi o caso da peça ‘O Crime da Aldeia Velha’ ou ‘A Ceia dos Cardeais’. Sobre a temática, diz Ruy de Carvalho à Correio TV: “As personagens religiosas têm quase sempre êxito na ficção. O público gosta de ver retratadas figuras católicas ou de outras religiões. E não creio que o recurso seja polémico. Se uns estão a favor e outros contra até é bom para discussão pública, desde que a intenção não seja destrutiva”.

"EMAGRECI PARA NADA"

Rita Pereira, que quis começar este trabalho com uma nova imagem, conta: “Fui acompanhada por uma nutricionista e estou numa clínica. Consegui perder mais de seis quilos. E quando chego à novela, pumba, dão-me um hábito larguíssimo para vestir... Dei-me ao trabalho de emagrecer para nada!”

TELENOVELAS 'PARA TODA A FAMÍLIA' COM MUITAS SEMELHANÇAS

DOCE FUGITIVA

É inspirada na novela argentina ‘Kachorra'.

Horário nobre: Passa às 21h30, na TVI .

Estrela: menina pobre emprega-se em casa de ricos.

Paixão: tem uma paixão pelo herdeiro rico.

Música: Rita Pereira também canta na novela.

FLORIBELLA

Baseada no original argentino ‘Floricienta’.

Horário nobre: Passa também às 21h30 na SIC.

Flor: Menina pobre trabalha como ama de uma família alemã.

Paixão: Morre de amores pelo patrão rico.

Música: Flor é a vocalista da banda.

'SEI QUE VÃO COMPARAR-ME COM A NOVELA FLOIRIBELLA'

- Como se sente no papel de protagonista da próxima novela da TVI?

Rita Pereira - Ansiosa, nervosa, feliz… Mas não estou a encarar muito isto como uma protagonista, porque o núcleo da novela é pequeno e é todo ele muito forte. Somos todos protagonistas.

- Como recebeu a notícia de que tinha sido a escolhida para ‘Doce Fugitiva’?

- Estava pronta para ir para Nova Iorque fazer um curso de três meses. A minha agente contactou-me, e quando me deu a notícia fiquei uns longos minutos sem dizer nada. Como é que podia ser, eu, Rita, escolhida para protagonista? Acreditava que a TVI ia apostar numa cara nova para um produto tão forte como este. Valeu a pena ter perdido o bilhete de avião para Nova Iorque.

- Que está a pesar mais neste papel?

- A responsabilidade. Por estar a trabalhar com pessoas tão experientes, desde os técnicos aos actores. Tenho medo de os desiludir!

- Qual foi a cena mais complicada?

- As cenas onde tinha de comer chocolate. Odeio chocolate. Desde criança. Nunca comi uma barra de chocolate. Prefiro salgados. E uma das minhas personagens é mestre chocolateira e adora chocolate. Então faço um esforço enorme nas gravações para mostrar um sorriso quando provo chocolate, mas mal a cena é cortada farto-me de fazer caretas.

- E está a gostar de vestir a pele da Estrela?

- Tenho vivido intensamente o papel. Mas faço mais do que uma Estrela. Sou a Estrela, a Maria Estrela, personagem muito sonhadora, muito engraçada, a Maria dos Anjos, que é a freira, e a Estrela normal para a família e os amigos. É contagiante ver, numa só frase, a mudança de uma personagem para outra.

- Como é a Estrela?

- A minha mãe viu a apresentação e disse-me: “Finalmente puseram-te a fazer o papel que fazes sempre nos natais em casa”, e estava a referir-se às minhas brincadeiras. A Estrela é um pouco assim, brincalhona, mas ao mesmo tempo super-verdadeira, uma miúda de carne e osso. Tentei não representar a Estrela como um boneco, mas uma pessoa real, que apesar de trapalhona e de inventar imenso é alguém que qualquer um pode encontrar na rua.

- Vai ser uma tentação compará-la à ‘Floribella’, em exibição na SIC?

- Eu sei que o vão fazer, comparar-me com a ‘Floribella’… Mas verão que a novela é para um público mais velho. Admiro o trabalho da Luciana, que está a fazer um papel fantástico e conquistou imenso público. Dou-lhe os parabéns. Quanto a mim, vou lutar pelo meu projecto.

- A Estrela é cantora?

- A Estrela tem quatro músicas gravadas para a novela. Mas a Estrela é que canta, não a Rita, e quando terminar a novela não vou lançar um CD. Quero continuar a ser actriz.

PROTAGONISTA À TERCEIRA

Rita Pereira tem 24 anos e um currículo de actriz nas novelas da TVI. Estreou-se em 2004 com o papel de soraia em ‘Morangos com Açúcar’ e depois foi Vera em ‘Dei-te Quase Tudo’.

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