Em várias cidades europeias, crescem movimentos antiturismo. Lisboa e Porto começam a encarar o problema.
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Em Barcelona ou Veneza, os movimentos antiturismo lançados por residentes exasperados ilustram os limites de uma industrialização da viagem que ganhou velocidade, mas que, segundo analistas, arrisca a autodestruição.
Este verão, decorreram ações de protesto em várias cidades espanholas organizadas por grupos de habitantes, denunciando os efeitos prejudiciais do turismo de massa na sua vidas.
Em cidades portuguesas como Lisboa e Porto, apesar de não terem sido visíveis protestos do género, têm sido tomadas medidas para controlar o fluxo de visitantes. Na capital, por exemplo, a câmara municipal anunciou no final de julho a proibição de circulação de autocarros turísticos com mais de nove lugares na Sé e no Castelo de São Jorge, para evitar problemas de ruído e congestionamento de trânsito para os moradores.
A diretora-geral do Património Cultural, Paula Silva, em abril, chegou mesmo a defender a diversificação da oferta, através da criação de itinerários e roteiros, para combater a concentração de turistas em determinados monumentos.
A responsável afasta a hipótese de existir uma pressão turística em Portugal como a que existe noutros locais da Europa, como por exemplo Veneza e Barcelona, mas diz que "a questão dos hotéis deve seguir a mesma lógica", defendendo hotéis na zona da Ajuda, em Lisboa, e menos unidades destas na Baixa.
Paula Silva dá o exemplo da diferença: Barcelona recebe cerca de 32 milhões "e em Lisboa ainda não se atingiram os quatro milhões".
No Porto, a responsável deixou a ideia de levar os turistas a visitar a zona da Foz e "dotá-la de conteúdos culturais, que neste momento não tem".
A responsável defendeu a criação de itinerários turísticos que façam com que as pessoas que vão a Fátima, por exemplo, visitem outro património, como os Mosteiros de Alcobaça e Batalha, e de roteiros que façam com que os turistas visitem o interior do país, para reduzir a pressão em determinadas regiões.
Tudo para manter longe de território nacional as formas de "turismofobia" que têm crescido há anos em cidades como Veneza, Dubrovnik, Ibiza, Girona e Maiorca, onde o número de visitantes tem crescido.
Isto apesar destes turistas -- acusados de todos os males -- serem muitas vezes apenas "o bode expiatório de um mal-estar que esconde outro: o das empresas fragmentadas pela indústria do turismo", diz o antropólogo Jean -Didier Urbain, no último dia da Feira de Turismo Top Resa, em Paris.
O turismo em massa produz "efeitos extremamente preverso sobre a população local: por um lado, as pessoas ficam ricas, por outro lado, as pessoas estão a sofrer, são proletárias e marginalizadas", disse o especialista à agência France Presse (AFP)
"E um viajante, quem quer que seja, é um intruso eterno. A sua intrusão é sempre mais ou menos vivida em relação ao que traz, e relata, ao 'visitado'", resume Urbain, que leciona da Universidade de Paris V.
Nessas cidades, saturadas durante todo o ano, "acaba por ser um equilíbrio dificil entre a vida quotidiana dos habitantes e uma atividade turística que gera muitos incómodos, com pessoas que vêm acima de tudo para se divertir sem respeito das populações locais ", diz Didier Arino, diretor do gabinete Protourisme.
Mesmo sem recorrer a excessos, os turistas podem pagar o preço dos residentes hostis: "O nosso apartamento do Airbnb em Barcelona tinha um terraço no qual as janelas dos andares superiores davam para um terraço. À noite, jantávamos lá. Nós não fazíamos particularmente barulho, mas de manhã o terraço estava cheio de ovos podres esmagados, aparentemente o hábito de alguns moradores do prédio ", diz Anne-Laure, uma francesa de 41 anos.
E, acima de tudo, cria problemas relacionados com a acomodação dos turistas que crispam as relações com os habitantes locais, sobretudo o barulho ou desaparecimento de algumas lojas de bairro a favor de lugares criados para os 'estrangeiros'.
O 'boom' dos alugueres sazonais do tipo Airbnb levou a um aumento dos preços dos imóveis, sobretudo em bairros mais populares.
"Nós teremos um multiplicador nessas áreas se as autoridades públicas não tomarem medidas para regular a habitação sazonal", disse Didier Arino.
Para a antropóloga Saskia Cousin, "não se trata de proibir uma prática que revele a inadequação do sistema hoteleiro - especialmente para as famílias - e preenche uma necessidade real, mas o papel da política pública não é também para proteger os habitantes?", questiona.
Em Portugal, um estudo recentemente divulgado revelou que o impacto do alojamento local na economia da Área Metropolitana de Lisboa superou os 1.660 milhões de euros, representando 1% do Produto Interno Bruto gerado nesta região.
Este testudo, encomendado pela Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), seguiu-se a um outro, apresentado em março, segundo o qual a maioria das unidades de alojamento local disponíveis na zona de Lisboa resultaram de imóveis desocupados, mas 19% do total estavam arrendados antes de serem convertidos ao turismo.
A própria marca Lifecooleer, da empresa portuguesa Sítios, reveliu este verão que pretendia aproveitar residências universitárias, vazias em agosto, para receber turistas que querem visitar Lisboa numa época que têm muita procura.
Dados recentes revelaram ainda que a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) fiscalizou 142 operadores de alojamento local em julho - o primeiro mês de cruzamento de dados com as plataformas digitais --, instaurou 30 processos de contraordenação e suspendeu a atividade de um estabelecimento.
Os 30 processos de contraordenação instaurados tiveram como motivos a violação das regras de identificação e publicidade dos estabelecimentos de alojamento local, falta de cumprimento dos requisitos de segurança aplicáveis aos estabelecimentos de alojamento local e falta de sinalização no interior dos locais.
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