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João Ricardo: “Gostava de interpretar uma mulher ou um serial killer”

Ator que dá vida a Acácio em ‘Sol de Inverno', na SIC, assume que gosta do registo cómico, mas reconhece que já precisa de interpretar um papel com uma  "carga emocional grande".

21 de março de 2014 às 00:30

Procura nas suas memórias afetivas inspiração para as personagens cómicas que o catapultaram para a fama. Tinha dez anos quando sentiu o apelo para a representação, com o filme ‘O Destino Marca a Hora'. Representar é um talento que divide com a encenação e a escrita. Depois de ‘Queres Namorar Comigo?', seguir-se-á ‘O Homem Que Acordou com uma Nuvem na Cabeça'.

CorreioTV - O Acácio de ‘Sol de Inverno' [pai de Fátima - Luciana Abreu] é uma personagem que lhe tem dado gozo ‘pintar'?

João Ricardo - Sim. A aferição a esta personagem tem sido diferente. No início foi-me dito que entraria só em três episódios, mas parece que vai continuar.

E a personagem evoluiu...

Podemos dizer que sim. A nível de texto, começo a implantar algumas coisas minhas, que acho que podem ter graça, e mesmo do estudo que fiz da personagem. Estive no Norte.

E como foi essa pesquisa?

Tinha uma avó que era de Estarreja (Aveiro) e utilizava muito esta coisa dos ‘v' e dos ‘b' - como o ‘binho' (vinho). E depois alguns nomes e trejeitos das gentes do Porto, que a personagem utiliza, vieram por assimilação. Por exemplo, o culto a St.ª Maria Adelaide ou os nomes que nós conhecemos mas que geograficamente não existem no nosso imaginário, como ‘Cedofeita'. Acho bonito. As pessoas no Norte têm muita afetividade nas palavras.

E leva tudo isso para Acácio?

Às vezes quem escreve intelectualiza muito as figuras populares.

Os autores dão espaço para o improviso?

Depende da contracena. Neste momento, estou a contracenar com a Luciana Abreu. Ela tem aquela raiz nortenha, que se expõe muito, portanto transmite aquilo que está no imaginário da sua infância e, para mim, é mais fácil ir ao seu encontro. Nós, atores, só brilhamos se o outro nos fizer brilhar. É uma questão de generosidade mútua.

Com Acácio, temos um seguimento do Armando, de ‘Laços de Sangue'?

Tento modificar alguma coisa. E neste pensei vou pôr-me careca, era só para 2 ou 3 episódios, e propus que a personagem tivesse uma cabeleira que ficasse mal. Curiosamente, há um indivíduo que trabalha na rua dos Fanqueiros, em Lisboa, que tem uma cabeleireira assim [risos]. Isto para dizer: esta figura popular existe. Para quê intelectualizar?!

Acha que, de algum modo, está conotado a este tipo de personagens?

Para ficar contente comigo, penso: já fiz o Armando Coutinho e, agora, o Acácio. Portanto, tenho um leque e qualquer dia posso fazer um espetáculo. É bom as pessoas conhecerem-me neste registo, para depois, numa próxima novela, ou num próximo trabalho, poder ter autoridade para dizer quero mudar e experimentar fazer outras coisas. Espero ter essa a oportunidade. Mas agradeço à SP e à SIC estas personagens que me projetaram, sem dúvida.

Acha que este Acácio terá o mesmo impacto?

Será que sou eu que estou deslumbrado? Que às vezes me atrevo a dizer que vai ter mais impacto?! Em três dias no ar tive logo feedback das pessoas. Se calhar porque o público já está fidelizado com a novela. Mas acho que as pessoas simpatizam muito com o ator João Ricardo.

E que outro registo gostava de experimentar?

Gostava de interpretar um serial killer e uma mulher. Uma mulher que só no fim se descobrisse que é homem. Gostava que não fosse uma personagem cómica. Que fosse uma história sobre a tragédia de uma mulher [homem] sem filhos, que fosse bastante feminina, com os seus rituais de maquilhagem. Gostava de fazer uma coisa com uma carga emocional grande.

E porquê um serial killer?

Gosto do bom gosto e do lado sádico da projeção do mal, mas com a tal dignidade. Ou seja, poder dizer ‘amo-te' e ao mesmo tempo estar a pensar ‘mas mais tarde vou dar cabo de ti'. Todos temos um lado terrível escondido [risos].

Vê as telenovelas em que participa?

Vejo um episódio e depois pergunto às pessoas se gostaram. Sinceramente não gosto de me ouvir, não gosto de me ver. Quando estou a fazer, divirto-me, mas depois acho que podia ter feito outra coisa.

Ter contrato de exclusividade com a SIC é uma segurança?

É um agradecimento. Se a TVI estivesse em pé de igualdade com a SIC, e se me desse muito mais dinheiro, não tenho dúvida de que optava pela SP e pela SIC. Já trabalhei na TVI, mas foi esta casa que me fez. Foi esta casa que me projetou e estou agradecido à Gabriela Sobral e ao António Parente. São duas pessoas que tenho no coração. E depois, nesta casa já conhecem as minhas birras. Sinto que as pessoas têm carinho por mim. E nunca me cortaram as pernas, pois sempre tive os meus projetos.

É reconhecido na rua?

Sim e fico muito vaidoso.

O público vai ao teatro?

Acho que para mal de alguns colegas, as pessoas vão ao teatro quando há caras que veem na televisão. É um erro, mas é a realidade. Há uns anos tive a sorte de me puxarem para projetos televisivos.

Os atores são mal pagos?

São. Estamos numa profissão em que temos de ler, de viajar, em que damos o que temos às pessoas, e para dar precisas de ser feliz. Não é o poder de compra que dá a felicidade, mas permite-te saber, ter poder de argumentação. Tenho muitos colegas que neste momento passam fome e procuram trabalho. E são bons atores e boas atrizes.

Quantos estão no desemprego?

Há muitos, não tenho ideia do número. Se pensarmos que numa novela cabem 30 atores... depois há os veteranos e ainda os que saem do conservatório - que entram numa novela e depois em outra, atingem a ribalta, mas depois desaparecem. Como se preparam as pessoas para isto?

Tem-se falado num sindicato, qual a sua opinião?

A sindicância é sempre a força. Tem é que se criar uma estrutura. Como é que alguns ganham muito - e eu não me queixo, porque ganho acima da média - e outros pouco? Como vamos criar estabilidade? Um padeiro tem uma tabela. Criar uma tabela? Bom, mas também é como os jogadores de futebol, se jogas na primeira divisão ganhas mais. É complicado.

Quais são os seus próximos projetos?

Estou no Teatroesfera, uma coisa que se chama ‘Fábrica de Sonhos', e ando com a Ana Sofia Gonçalves [ilustradora] a divulgar o livro que escrevi, ‘Queres Namorar Comigo?'. Tem sido muito gratificante.

O que o levou a escrever um livro infanto-juvenil?

Fascina-me o teatro para a infância. Dizem que o homem é aquilo que foi na infância e eu acho que não tenho o complexo de Peter Pan, mas tenho um filho de oito anos e aprendi a redimensionar-me, a voltar a brincar...

A escrita vai estar cada vez mais presente na sua vida?

Sim. Sou intrinsecamente feliz com os papéis que faço, com as histórias que invento.

E gosta de encenar?

É o lado que acho que me dá pinta como intelectual. É engraçado para as pessoas que não imaginam que consiga fazer uma coisa tão disciplinada.

É indisciplinado?

Sou muito disciplinado e acho que a ideia contrária me prejudica um pouco.

Do que não abdica?

De dar um beijo a quem me apetece ou dar um colo a quem precisa.

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