Cerca de 100 mil contos da época, correspondentes a 75% do PIB anual português em meados do século XVIII, é o cálculo que José Luís Cardoso, professor catedrático do ISEG, em Lisboa, faz sobre os prejuízos provocados pelo terramoto de 1755.
A catástrofe do dia de Todos-os-Santos foi devastadora e as perdas não se limitaram à derrocada de palácios e igrejas edificados com o ouro do Brasil, no então recente reinado de D. João V. Também há que contabilizar um riquíssimo património móvel, em jóias, obras de arte e dinheiro vivo que na época era só metálico. E as somas a que se chega são tão astronómicas que José Luís Cardoso, professor de História da Economia, verificou uma grande dissonância e notórios exageros quando investigou os valores referidos na época e que vão de 85 mil a 375 mil contos, com os mercadores estrangeiros, sobretudo ingleses, a queixarem-se de perdas na ordem dos 40 mil contos. Numa primeira abordagem, avaliou o volume dos prejuízos em 230 mil contos da época, mas ao confrontar esse valor com o que seria, então, o PIB considerou os números excessivos. Numa estimativa mais apertada aponta, agora, para 100 mil contos, correspondentes na altura a 75% da riqueza total produzida durante um ano em Portugal.
INCOMENSURÁVEL
Sobre os prejuízos do terramoto que estendeu a destruição por todo o Sul do País, desde Vila Real de Santo António a Castelo de Vide, na fronteira espanhola, e até à Ericeira, na costa Atlântica, José Luís Cardoso considera que há muito trabalho de arquivo por fazer. E quando houver resultados ter-se-á de admitir que mesmo os cálculos mais reduzidos podem parecer um exagero, já que os estragos foram incomensuráveis.
José Luís Cardoso tem uma comunicação intitulada ‘Pombal, o Terramoto e a política de regulação económica’, anunciada para dia 4, no colóquio Terramoto de 1755 – Impactos Históricos, promovido pelo ISCTE e o ICS, em que abordará as consequências económicas da catástrofe sob outras perspectivas. A sua apreciação sobre as decisões de Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal, é muito positiva: ‘A sua preocupação foi evitar que os preços aumentassem, que houvesse um açambarcamento de bens alimentares, naturalmente escassos, ou que os salários subissem, além de tomar medidas de abastecimento, segurança dos cidadãos e saúde pública”, explica José Luís Cardoso, observando que para a reconstrução de Lisboa o reino criou apenas um novo imposto de mais 4% nos direitos alfandegários sobre as mercadorias importadas. Não havia que massacrar mais uma economia portuguesa em fase depressiva. O terramoto acabou até por ajudar ao crescimento.
"ECONOMIA RECUPEROU NUM TEMPO CURTO" (José Vicente Serrão, presidente do Departamento de história do ISCTE, promove colóquio sobre 1755)
Correio da Manhã – Quais foram as consequências económicas do Terramoto?
José Vicente Serrão – O impacto foi tanto mais dramático quanto se veio inserir numa conjuntura crítica que vinha de trás e, em muitos dos seus aspectos, nada teve a ver com o Terramoto. Para a fase depressiva, que marca a economia portuguesa entre os meados da década de 1750 e os princípios da de 1770, contribuíram o declínio das chegadas de ouro do Brasil, a contracção do comércio externo, as dificuldades do mercado internacional de açúcar e tabaco, a crise de exportação dos vinhos, o extraordinário aumento das despesas inerentes à entrada de Portugal na Guerra dos Sete Anos, entre outros factores.
O Terramoto teve, obviamente, a sua quota-parte, mas estamos longe de poder fixá-la. Em contrapartida, não podemos deixar de assinalar as consequências positivas. A reconstrução abriu novas oportunidades de negócio. Os sectores da construção naval e da construção civil, pública e privada, foram os primeiros a aproveitá-las, para não falar dos reflexos adicionais em todas as indústrias a montante (cal, tijolo, pedra, vidros, ferragens, madeiras). A procura de mão-de-obra dinamizou o mercado de trabalho e de serviços. O mercado imobiliário e o mercado de capitais conheceram uma animação sem precedentes.
– Quanto tempo foi necessário para recuperar?
– Foi muito variável. Dou apenas quatro exemplos. O principal porto da capital, as alfândegas e os respectivos armazéns foram imediatamente transferidos para a zona de Belém e Junqueira e voltaram a estar operacionais em menos de dois meses; o abastecimento da população em bens de primeira necessidade foi restabelecido em poucas semanas ou meses; em contrapartida, 25 anos mais tarde, ainda se faziam contratos de aforamento de quintas sob a justificação de que os seus proprietários não tinham dinheiro para reparar instalações produtivas, arruinadas desde o tempo do Terramoto; no mesmo sentido, a reconstrução do património urbano arrastou-se até bem entrado o século XIX.
Num balanço global, agora à distância de 250 anos, pode dizer-se que a economia recuperou do abalo sofrido num tempo bastante mais curto do que aquilo que se poderia esperar, tendo em conta a dimensão dos estragos.
IMPACTOS HISTÓRICOS
De 3 a 5 de Novembro, decorre no ISCTE, à cidade Universitária, em Lisboa, o colóquio internacional ‘Terramoto de 1755 - Impactos Históricos” que reunirá 70 especialistas de uma dezena de países e tem na comissão organizadora Ana Cristina Araújo (Faculdade de Letras de Coimbra), José Luís Cardoso (ISEG-UTL), José Vicente Serrão (ISCTE), Nuno Gonçalo Monteiro (ICS-UL) e Walter Rosa (Faculdade de Ciências de Coimbra).
REAL ÓPERA DO TEJO
Excertos das óperas estreadas na Ópera do Tejo, que teve só um ano de existência no Terreiro do Paço, junto ao Palácio Real, até à sua completa destruição pelo terramoto, serão interpretados pela Orquestra Metropolitana de Lisboa no dia 1, às 21h30, na Igreja de São Domingos, ao Rossio, em Lisboa. O programa inclui obras de David Perez, António Mazzoni, António Teixeira e João Sousa Carvalho, compositor de um ‘Te Deum’.
ACTOS RELIGIOSOS
Em memória das vítimas do Terramoto de 1755 e de todas as outras catástrofes naturais em todo o Mundo, o cardeal--patriarca D. José Policarpo celebra missa no dia de Todos os Santos, às 9h30, nas ruínas do Convento do Carmo, em Lisboa, destruído pelo sismo. Para a mesma hora, está convocado o repicar dos sinos de todas as igrejas da cidade. Às 16h00, haverá um concerto e a apresentação das obras de recuperação na igreja da Madalena, na colina da Sé, e às 19h00 será a vez de D. Manuel Clemente, bispo auxiliar de Lisboa, celebrar na igreja de S. Nicolau, onde também decorre uma acção de restauro do património.
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