O desejo da artista é "ver a justiça prevalecer e Israel comparecer perante a justiça e a comunidade internacional, e as leis serem aplicadas".
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Um edifício em ruínas, na Póvoa de Santa Iria, às portas de Lisboa, serviu nas últimas semanas de tela a mais de 50 artistas, criando uma galeria temporária de alerta para a crise humanitária em Gaza.
Nas paredes da Red Zone Gallery, que a Lusa visitou na semana passada e será inaugurada no sábado, há retratos, frases, composições gráficas, onde sobressaem as cores da bandeira da Palestina - preto, verde, vermelho e branco. A bandeira daquele país, o lenço 'keffiyeh' e a melancia, símbolos da resistência palestiana, assim como a pomba branca, que representa a Paz, são comuns em várias pinturas.
Vhils, Bordalo II, Akacorleone, Tamara Alves, c'marie, Gonçalo Mar, a dupla Halfstudio, Miguel Januário (±), Jaime Ferraz, Jorge Charrua, Rita Ravasco, Sepher AWK, Mafalda MG e António Alves são alguns dos artistas envolvidos no projeto.
Na génese desta galeria temporária está um mural de João Pereira, que assina Bugster e guiou a Lusa na visita ao espaço.
Tudo começou com a vontade que tinha de pintar um mural que abordasse o que se passa na Faixa de Gaza, e com o qual pretendia "desafiar a atenção das pessoas".
Ia fazê-lo na rua, mas como não encontrou nenhuma parede com as dimensões que queria, João Pereira acabou por optar por criá-lo no edifício onde entretanto nasceu a Red Zone Gallery, que já conhecia e onde "poderia estar com alguma tranquilidade".
Num local que é conhecido e frequentado sobretudo por jovens da zona, mas também por elementos da comunidade do graffiti, conseguiu passar três dias a pintar sem ser incomodado.
No final, abordou três adolescentes que ali estavam e quis saber o que achavam da obra, o que viam, o que lhes transmitia.
O diálogo que teve com eles impulsionou-o a querer mais. Partilhou a ideia com alguns artistas com quem tem mais proximidade, explicando-lhes o que tinha feito e onde, que havia mais espaço e que poderiam juntar-se todos um dia a pintar.
Fotografou todas as paredes disponíveis, embora haja também intervenções em vigas, colunas e até no chão, e dividiu os espaços, que numerou e foram sendo 'reservados'.
Como um dia não chegava para conseguirem fazer tudo, um encontro passou a vários. Uns artistas foram convidando outros e os espaços acabaram por ficar rapidamente atribuídos.
Ao longo das últimas semanas, em ritmos e dias diferentes, os mais de 50 artistas foram intervindo no espaço, que "comunica uma mensagem mais forte do que todas as peças e obras".
O edifício onde a galeria nasceu, abandonado há pelo menos duas décadas, é "um lugar destruído e a ser destruído". Com as devidas distâncias, é quase como se a exposição acontecesse no lugar para onde querem que o mundo olhe.
"Tomámos esta sala como se quiséssemos fazer uma exposição em Gaza. Como é que conseguíamos fazer? Se calhar era num sítio parecido com este, num cenário mais otimista", referiu João Pereira.
Um dos objetivos é que a Red Zone Gallery seja "um lugar de conversa, de diálogo". "Essa é a base da nossa linha, criar coisas que iniciam conversas", disse.
Na entrada da Red Zone Gallery, ao cimo de umas escadas, foi colocado um texto explicativo e um desenho de uma criança palestiniana, feito a partir de Gaza, que funciona como ponto de partida para o que o visitante irá ver.
No dia da inauguração, entre as 14:00 e as 19:00, haverá conversas, sobre, por exemplo, "o poder da expressão artística na construção da consciência sobre a causa palestiniana" e "o papel da comunicação social na cobertura do genocídio palestiniano, o impacto da morte de jornalistas e a formação da opinião pública", que contam com a participação de artistas de várias áreas, jornalistas e elementos de organizações como a Médicos Sem Fronteiras, a Parents for Peace e do MPPM - Movimento pelos direitos do povo palestino e pela Paz no Médio Oriente.
O programa de sábado inclui também a escuta coletiva de um podcast do projeto de media independente Fumaça, performances e uma visita guiada por artistas.
Depois de o sol se pôr, haverá atuações musicais, mas num outro local: o Espaço Cultural Fernando Augusto, também na Póvoa de Santa Iria.
A partir das 20:00 irão atuar, entre outros, as cantoras Jüra e Cristina Clara, os 'rappers' Buda XL, Riça, Tilt e Maze, e o produtor spock.
No dia em que a Lusa visitou a Red Zone Gallery, estavam dois artistas a trabalhar, uma era a palestiniana Dima Abu Sbeitan, uma das fundadoras do projeto educativo Seeds of Hope, criado para apoiar crianças em Gaza.
Dima nasceu na Jordânia, cresceu em Omã e viveu durante treze anos nos Estados Unidos, país que trocou há três por Portugal, mas especificamente por Lisboa.
A obra de Dima na Red Zone Gallery está dividida em três partes. Numa pintou a 'red zone' [zona vermelha, em português] de Gaza, "uma área pronta a ser bombardeada e chacinada, com o pressionar de um botão", noutra decidiu "honrar a imprensa, os jornalistas que foram mortos, por mostrarem histórias e contarem a verdade", e na terceira escreveu mensagens que lhe chegaram de Gaza.
Em contacto permanente com palestinianos que estão em Gaza, Dima ouviu frases como "quero acordar feliz", partilhado por uma criança de dez anos, "gostava de ter amado quem eu queria", "gostava de poder ter viajado", "gostava de poder comer o que quiser".
O desejo da artista é "ver a justiça prevalecer e Israel comparecer perante a justiça e a comunidade internacional, e as leis serem aplicadas".
"Gaza precisa que o genocídio páre. Gaza precisa que a comunidade internacional assuma uma posição e se posicione ao lado da Lei Internacional. Gaza precisa que as pessoas falem e que a justiça prevaleça e ter o direito de viver como toda a gente neste mundo. Gaza precisa de liberdade, de saúde, de comida", disse à Lusa.
Dima espera, pede e deseja que o genocídio acabe em breve, mas lembra que até isso acontecer a população "está a morrer aos olhos de todos" e "cada dia se torna cada vez pior".
O exército israelita tem em curso uma ofensiva na Faixa de Gaza desde que o grupo extremista palestiniano Hamas atacou Israel em outubro de 2023, matando cerca de 1.200 pessoas, além de ter feito 251 reféns.
A ofensiva israelita, que uma comissão independente da ONU e um número crescente de países e organizações internacionais classificam como genocídio, já causou mais de 65.500 mortos na Faixa de Gaza, a destruição de quase todas as infraestruturas de Gaza e a deslocação forçada de centenas de milhares de pessoas.
Israel também impôs um bloqueio à entrega de ajuda humanitária no enclave, onde mais de 400 pessoas, na maioria crianças, já morreram de fome e desnutrição.
João Pereira entende que, após a inauguração no sábado, cada dia que a Red Zone Gallery continuar a existir, "é uma vitória para o projeto".
A localização da Red Zone Gallery é divulgada por passa palavra, "através de quem já está envolvido no projeto".
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