As cartas de amor de Mónica Calle
Mónica Calle foi desafiada a criar um espectáculo para o Pequeno Auditório da Culturgest, em Lisboa, e vai estrear, amanhã, ‘Julieta – Cartas Fragmentárias a um Amor Perdido’, uma criação para ver apenas até à próxima terça-feira.
Apesar do título, porém, que ninguém se convença que vai ver William Shakespeare em palco. Três actrizes – Ana Ribeiro, Mónica Garnel e Rita Só – dizem, à vez, cartas de amor que se inspiram na peça ‘Romeu e Julieta’ do dramaturgo isabelino, mas também em textos de Bernardim Ribeiro, Heiner Müller, Anton Tchekov e Arthur Rimbaud.
Num espectáculo que é quase uma síntese do trabalho de Mónica Calle, a criadora cita-se a si própria, usando temas, situações, gestos e frases inteiras de espectáculos anteriores. Claro que isto só será detectável pelos seus espectadores habituais... Quem não tem essas referências, ficará a zero.
Aliás, o espectáculo é tão típico de Mónica Calle que a encenadora recriou, no palco da Culturgest, o ambiente degradado onde costuma trabalhar: a Casa Conveniente, no Cais do Sodré. Ao entrarmos no Pequeno Auditório, vemo-nos, literalmente, perante um cenário de obras. Um plástico enorme cobre o chão, há tijolos, sacas de cimento e de areia amontoados, há tábuas e caixas de cartão velho. São as próprias actrizes que regulam a (pouquíssima) luz do espectáculo, com lanternas. Há pó de cimento por todo o lado.
E é aqui que se evocam os temas típicos da criadora: amor, sexo, maternidade, amizade, solidariedade, revolução. É aqui que a nudez, habitual na maioria dos espectáculos de Calle, aparece de forma mais sugerida do que real: as actrizes ficam em roupa interior, imersas na mais profunda obscuridade. Finalmente, há uma quarta actriz em cena – Alexandra Gaspar – cuja presença parece representar a própria encenadora. Ela manuseia livros, lê frases sugestivas... Como se estivesse à procura, dentro do seu baú literário, dos textos que irá levar à cena, na boca das restantes actrizes.
Por tudo isto, ‘Julieta’ recomenda-se sobretudo a quem aprecie o trabalho de Mónica Calle. Até ao próximo dia 22.
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