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Morreu Adolfo Gutkin, encenador que renovou o Teatro português após o 25 de Abril

Percurso de Adolfo Gutkin no teatro passou pela Argentina, Cuba e Portugal, atravessando vários regimes políticos, e trazendo ao teatro português técnicas contemporâneas.

26 de outubro de 2025 às 20:37

O ator, encenador e pedagogo argentino e português Adolfo Gutkin morreu no sábado aos 89 anos no Hospital Egas Moniz, em Lisboa, disse este domingo à agência Lusa fonte da família.

Nascido em Buenos Aires, Argentina, em 1936, o dramaturgo, que morava em Oeiras, esteve internado durante alguns meses em várias unidades hospitalares da capital devido a problemas de saúde e morreu no sábado, segundo a mesma fonte.

Ao longo de mais de cinco décadas, o percurso de Adolfo Gutkin no teatro passou pela Argentina, Cuba e Portugal, atravessando vários regimes políticos, e trazendo ao teatro português técnicas contemporâneas.

O encenador e produtor, que completou 89 anos a 03 de agosto, fundou em Lisboa nos anos 1980 o Teatro do Mundo, com sede no Teatro Aberto, e, posteriormente, o Teatro Maizum, além de ter sido o mentor do projeto de criação do Instituto de Formação, Investigação e Criação Teatral (IFICT) em Portugal.

Adolfo Gutkin iniciou-se como ator ainda na Argentina, no Nuevo Teatro de Buenos Aires, onde interpretou autores fundamentais da dramaturgia moderna, como Bertolt Brecht, Bernard Shaw e Georg Büchner.

Ainda jovem, fundou, com Augusto Fernandes, Agustín Alezzo e Carlos Gandolfo, o Grupo Juan Cristóbal, mais tarde rebatizado La Máscara, antes de integrar o Teatro Popular Bonaerense, um dos palcos independentes argentinos mais ativos da época.

Em 1962 mudou-se para Cuba, motivado pelo ambiente cultural efervescente que se seguiu à Revolução no país, e aí foi ator, pedagogo e encenador, fundando uma escola de teatro em Santiago de Cuba e o Conjunto Dramático de Oriente, que dirigiu durante vários anos.

No país caribenho encenou obras de Strindberg, Arrabal e Pinter, conquistando prémios nos principais festivais teatrais cubanos e latino-americanos, destacando-se pela ousadia estética e pelo olhar político sobre o papel do teatro na sociedade.

Em 1969 viajou para Lisboa, aceitando o convite para dirigir o grupo cénico da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, tendo encenado "Volpone", de Ben Jonson, que lhe valeu o Prémio da Associação Portuguesa de Críticos de Teatro e o Prémio da Casa da Imprensa para Melhor Espetáculo do Ano.

Ainda nesse período, regressou temporariamente à Argentina, onde apresentou uma nova versão de "Cemitério de Automóveis", de Fernando Arrabal, em Buenos Aires e Montevideu.

No ano seguinte, voltou a Lisboa para repor "Volpone" e estrear "Melin 4", ambos distinguidos pela crítica e selecionados para o Festival Internacional de Teatro de San Sebastian, em Espanha, em 1970.

Tornou-se membro de honra da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, mas a sua atividade libertária chamou a atenção da PIDE, levando a que fosse perseguido e expulso do país em 1973.

Regressou a Cuba, retomando o trabalho com o Conjunto Dramático de Oriente e colaborando na criação de uma nova estação televisiva em Santiago de Cuba, fase em que consolidou a sua reputação como encenador internacional e pedagogo do teatro contemporâneo.

Após o 25 de Abril de 1974, Gutkin regressou definitivamente a Portugal em 1980 e instalou-se em Coimbra, onde dirigiu o Teatro dos Estudantes da Universidade, com produções que circularam por festivais europeus.

No Teatro Maizum, companhia que fundou em Lisboa em 1982, dirigiu "Um Jipe em Segunda Mão", de Fernando Dacosta, encenação distinguida pela Associação de Críticos e pela Secretaria de Estado da Cultura.

Gutkin apresentou em 1981 à Fundação Calouste Gulbenkian o projeto de criação do IFICT, destinado à profissionalização de quadros artísticos e técnicos, com especial atenção aos países africanos de língua portuguesa. O projeto, apoiado pelo Fundo Social Europeu, viria a concretizar-se em 1982, tendo o dramaturgo como seu primeiro diretor.

Em 1994, obteve a cidadania portuguesa, e mais tarde encontrou um espaço de opinião no programa de rádio da TSF chamado "Não Alinhados, com Adolfo Gutkin".

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