O Yôga Antigo primordial, foi codificado em meados do século XX pelo Mestre DeRose, e após essa sistematização tomou a designação de SwáSthya Yôga. Dentro da sua primeira e principal característica, o ády ashtánga sádhana está inserido o tema do artigo desta semana: mudrá, a primeira parte da prática.
As oito partes que constituem esta aula são: mudrá – gesto reflexológico feito com as mãos; pújá – retribuição ética de energia; mantra – vocalização de sons e ultra-sons; pránáyáma – expansão da bioenergia através de exercícios respiratórios; kriyá – actividade de purificação das mucosas; ásana – técnicas orgânicas; yôganidrá – técnicas de descontracção; samyama – concentração, meditação e hiperconsciência. Todas estas partes serão exploradas, uma a uma, nos próximos meses. No artigo desta semana descobrimos a importância dos mudrás, gestos que constituem apenas um conjunto de técnicas, cujo instrumento é simplesmente a sua mão.
Mudrá significa gesto, selo ou senha, em espanhol significa apenas clave, portanto chave será mais uma tradução da palavra sânscrita. Como técnica de Yôga, designa os gestos feitos com as mãos. Alguns tipos de Yôga modernos aplicam a mesma designação para outras técnicas, como ásana, técnica corporal ou bandha, contracções de plexos e glândulas. Na codificação do Yôga Antigo, na qual nos baseamos, quando referimos mudrá referimo-nos exclusivamente a gestos feitos com as mãos, tendo consciência que a força do gesto é sentida desde o ombro até á ponta do dedo médio e que a sua estética, factor visível das senhas do Yôga, depende da acção do braço, por isso na dança clássica indiana mudrá toma também a designação de hasta – mão.
Vale a pena referir que em algumas obras se traduz mudrá como símbolo, embora grande parte dos mudrás tenham uma grande carga simbólica, chegando alguns a ser a representação plástica desses símbolos; esta tradução é tão ampla que pode levar a confusão. Para símbolo existe um termo em sânscrito bem definido: yantra, que significa símbolo ou imagem.
Os tipos de Yôga que contam com a presença de mudrá, pújá e mantra são os Yôgas mais antigos que preservam as suas raízes tântricas. No caso do Yôga pré-clássico o mudrá está intimamente ligado á identificação com os arquétipos, conduzindo o praticante a um peculiar estado de consciência que o coloca em contacto com o conhecimento ancestral de determinada linhagem. É tão nítida esta funcionalidade do gesto, que actualmente, durante a prática recomenda-se referir o mudrá, identificação com os arquétipos.
Mudrá é o 1º anga do ády ashtánga sádhana, a prática em 8 partes. Mudrá pronuncia-se com á aberto. Neste caso a sílaba longa coincide com a sílaba tónica. Tenha em atenção que a pronúncia incorrecta dos termos sânscritos altera substancialmente o seu significado.
Os mudrás actuam no nosso corpo simultaneamente por reflexologia, por simbolismo e por magnetismo, e abrangem três planos: o físico com a sua estética; o nível energético com o magnetismo gerado principalmente pelo movimento; e o emocional usando a iconografia do mudrá, com uma ligação directa ao psiquismo.
Esta técnica actua intensamente no emocional associada a uma outra designada de nyása, que significa identificação. Como refere o Mestre Sérgio Santos no livro “Yoga Sámkhya e Tantra”: “O nyása é como um cristal transparente, que absorve em si a forma e a cor do objecto que lhe é próximo”. Neste caso, o objecto que lhe é próximo é o mudrá que se assume durante a prática.
Estão codificados pelo Mestre DeRose, 108 mudrás. O número é suficiente para não ter de lançar mãos de gestos não sistematizados. Dado que o gesto funciona como chave para aceder ao registo do inconsciente colectivo, se pretender entrar na porta certa terá que usar a chave certa, e essas chaves são os mudrás. A sintonia é subtil, mas funciona se a ‘password’ for a correcta. Isto é, se utilizar mudrás do Yôga pré-clássico, vai aceder aos registos do Yôga Antigo; se usar mudrás do Yôga Clássico vai-se ligar á informação do Yôga de Pátañjali; mas se utilizar gestos do Yôga Medieval, que são já muito escassos entrará em contacto com o Yôgas modernos carregados já com uma forte influência Vêdánta – filosofia teórica de cariz espiritualista, que surge na época medieval por oposição ao Sámkhya – Naturalista.
Ainda hoje os cientistas procuram saber se foi a gesticulação e a capacidade preênsil do polegar que desenvolveram a mente, ou se foi a mente que fez desenvolver a capacidade de execução das mãos. Na nossa observação, foi sem dúvida a interacção de ambos que fez com que o homo sapiens desenvolvesse culturas e civilizações. Sabemos hoje que a movimentação das nossas mãos ocupa 80% da actividade mental. As nossas mãos, que Aristóteles designava como “a ferramenta das ferramentas”, são um dos três elementos determinantes para o aparecimento da mente simbólica na nossa espécie. Os outros dois são: a visão tridimensional e o cérebro capaz de processar essa informação visual.
Desde tempos muito antigos se sabe que as mãos carregam a marca única de cada indivíduo, os ceramistas das porcelanas chinesas assinavam as suas obras com a impressão digital, o mesmo conceito que mais tarde foi usado na Scotland Yard para a detecção e cadastro de criminosos. Os traços da personalidade estão registados na palma da mão, a quiromancia, arte característica do povo cigano, teve origem na Índia, há mais de 4000 anos, que como outras passou por egípcios, sírios, sumérios, caldeus e babilónios, mas também gregos e romanos usam e alimentam essa busca do destino na palma da mão.
A sintonia intemporal de que falamos vem por consequência da força de comunicação do gesto: desde a agitação manual, o vulgar acenar ou dizer adeus, passando pelo toque, até á palavra passando pelo clássico aperto de mão; comunicar é o maior factor de agregação, indispensável para o desenvolvimento de culturas e civilizações.
A sua intemporalidade é determinante para o aparecimento da mente simbólica, que é uma das bases do inconsciente colectivo. Os olhos vêem, o cérebro pensa e a mão do Homem reproduz, pintando ou esculpindo, criando uma memória externa perene e paralela à memória etérea. Há 5 milhões de anos, desde que o australopiteco libertou as mãos conquistando a postura erecta, que a comunicação toma uma importância definitiva para a agregação de sociedades.
Temos vindo a afirmar que o mudrá é a chave para aceder a esse mundo das ideias, que mais tarde, na psicologia moderna é definido como inconsciente colectivo. O instrumento que executa essa técnica, as mãos, capta um conjunto de toques e de sensações, formando um conjunto de informações sensoriais, que fazem parte desse outro mundo. As mãos são portanto esse contacto com o mundo sensível.
Recorremos a estes conceitos para tentar explicar aquilo que os yôgins sempre souberam que existia. O Yôga, que como refere o Mestre DeRose, tem uma garantia de fábrica de 5000 anos é a única filosofia prática, que só se entende quando se pratica, e sobrevive do empirismo, “o saber de experiência feito” parafraseando Camões.
Todos os mudrás actuam nas suas três vertentes: reflexológica, simbólica e magnética. Contudo a proporção de cada uma das características varia: uns são mais magnéticos, outros actuam mais profundamente por reflexologia, outros são quase só simbólicos. Neste último caso convém referir que os símbolos têm uma forte influência sobre o nosso inconsciente; como referia C.G.Jung, o inconsciente humano subsiste passeando-se por uma floresta de símbolos.
Exactamente como um bolo, que não deixa de o ser por ter mais açúcar ou menos farinha, também o mudrá tem esses três ingredientes em quantidades diferentes, da alquimia desses três ingredientes, da dedicação e do prazer que a prática lhe proporciona, depende o resultado do mudrá, bem como de qualquer outra técnica de Swásthya Yôga.
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