O camião é enorme, mete respeito. Tem 3,40 metros de altura, 11,7 toneladas de peso, 660 cavalos de potência. “Prenda bem os cintos de segurança das pernas e ajuste os dos ombros. Vamos andar aos saltos, convém que esteja seguro e se sinta confortável. É natural que nalgumas descidas sinta falta de ar. Não entre em pânico”, aconselha Elisabete Jacinto, enquanto calça as luvas e agarra firme o volante, ‘estranhamente’ pequeno, semelhante ao dos automóveis.
Dada a primeira lição, a única piloto do Lisboa-Dacar na categoria dos camiões arranca em direcção ao Erg Chebi – um imenso ‘mar de dunas’ de tom alaranjado, situado no sul de Marrocos, local de treinos por excelência da prova rainha do Todo-o-Terreno. São oito da manhã. O Sol já vai alto e o calor aperta. O ar seco, quase irrespirável, greta os lábios e seca a garganta. Estão trinta e tal graus, não tarda nada chega aos 40.
O roncar do motor suscita a curiosidade dos miúdos, que surgem do nada. Sentam-se na areia, mais parecida com pó, e seguem atentamente as manobras. A técnica é abordar a duna de frente em aceleração, para passar a crista. O segredo está em saber onde encontrar a areia mais dura, para não atascar. “Se fica preso, leva horas a tirar. É preferível perder alguns minutos e seguir por um caminho mais seguro”, diz Elisabete, enquanto o gigante aponta em direcção ao céu. Esta duna fez-se bem, o salto foi pequeno, mas a seguinte trouxe o estômago à boca: encosta abaixo, o camião ganha embalagem e afocinha, dando a sensação de que o mar de areia nos entra pela cara. O embate é forte, sente-se a pancada. Os cinco cintos que comprimem o corpo ao banco não conseguem evitar o salto no assento.
Mal refeitos, partimos para a próxima onda. O espaço para ganhar balanço é curto, mas não foi por isso que o camião parou a um metro do topo. “A areia está muito mole. O melhor é deixar descair e procurar outra saída”. Não foi fácil, mas a versatilidade e a força do veículo permitiram um pequeno ‘milagre’. O papel do mecânico, que viaja entre o piloto e o navegador, é fundamental nestas situações, aumentando ou diminuindo a pressão dos pneus, através de um mecanismo instalado na cabine.
Os Todo-o-Terreno atascam mais. A condução é mais ‘nervosa’, o trepidar mais constante. A emoção é maior. Sente-se a areia debaixo dos pés. A noção do espaço perde-se com mais facilidade. “Já não estou a ver muito bem onde estamos”, comentou Pedro Grancha, depois de algumas voltas pela montanha russa, com o seu Mitsubishi Pajero DiD. Terminada a sessão, é hora dos mecânicos ‘lerem’ o comportamento das peças e inventarem soluções mais resistentes. O tempo urge. Já falta pouco para a grande aventura.
"O STRESSE É GRANDE"
Professora de Geografia, Elisabete Jacinto, começou nas motos, em 1993, tendo arrancado vários primeiros lugares em troféus de senhoras. Depois passou para os Todo-o-Terreno, antes de se fixar nos camiões. Condecorada com a Ordem de Mérito atribuída pelo Presidente da República, a piloto do Montijo, de 41 anos, prepara-se para fazer o seu sétimo Dacar.
“Tão importante como o comportamento do veículo, é fundamental um bom entendimento da equipa: piloto, navegador, mecânico. Tem de se estar psicologicamente muito bem preparado. É preciso vencer o medo. Na areia não há lugar a hesitações. Se algum quebra, se o entendimento não for perfeito, nem sequer conseguimos chegar ao fim. A minha aposta é sempre a mesma: fazer melhor. No dia em que sentir que já não tenho condições para evoluir, regresso à escola e vou dar aulas – o que, aliás, gosto muito de fazer. Este ano, quero chegar aos quinze primeiros e, dentro de dois a três anos, entrar no Top Ten”.
"NÃO NOS PODEMOS EXCITAR"
Pedro Grancha iniciou a carreira desportiva em 1989 como piloto de motociclismo. O Todo-o-Terreno surgiu de 2001. É o primeiro Dakar do piloto de Cascais. “Já há algum tempo que sonhava fazer o Dakar e correr em África. É o desafio natural para quem se envolve a sério na competição de todo-o-terreno. Com a presença, este ano, no Rali de Marrocos, fiquei a perceber um pouco a filosofia destas provas e sinto que no Dacar poderei aspirar a um bom resultado. Quero ser o melhor português e ficar entre os 10 e os 15 primeiros da geral. Ganhar é impossível. Os pilotos das marcas oficiais têm meios, económicos e logísticos, que não estão ao alcance dos particulares. É uma prova muito longa e muito dura, onde temos de correr riscos. Não podemos ter medo, mas também não nos podemos excitar muito. Há que gerir muito bem as emoções”.
COMBUSTÍVEL
O camião de Elisabete Jacinto está equipado com dois depósitos com capacidade para 420 litros de gasóleo cada. Nas dunas, o consumo ronda os 65 litros aos 100. Em pista, entre 40 a 45 litros e, nas ligações, ronda os 25 a 30 litros.
VELOCIDADES
Os camiões de competição podem atingir velocidades da ordem dos 180 a 200 quilómetros por hora. Contudo, por razões de segurança, a organização do Dacar decidiu limitar a velocidade aos 150 quilómetros por hora.
CAIXA DE CARGA
A caixa de carga está equipada com macaco hidráulico e pneumático, caixa de peças suplentes, depósito com capacidade para 100 litros de água potável, três caixas para a bagagem pessoal da equipa e cinco pneus suplentes. Cada pneu pesa 100 quilos.
ALIMENTAÇÃO
Há etapas no Dacar que demoram 10 horas. Para não perder tempo, piloto e restante equipa alimentam-se em andamento. Os alimentos encontram-se numa pequena arca instalada ao lado do mecânico. A navegação faz-se através do recurso ao GPS, estando definida, à partida, uma pista com 3,5 quilómetros de largura.
DEPÓSITOS
O Mitsubishi Pajero DiD, inscrito pela VR2 Motorsport para o Dakar, será equipado com dois depósitos de combustível, com capacidade total para 350 litros. Nas dunas, o consumo pode atingir os 40 litros aos 100.
PESO E POTÊNCIA
O Todo-o-Terreno tripulado por Pedro Grancha pesa cerca de 1850 quilos. Tem 3200 cc de cilindrada e 220 cavalos de potência. O motor, a diesel, é de 4 cilindros e 16 válvulas. Está equipado com um macaco hidráulico, fundamental para mudar pneus e desatascar.
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