Barra Cofina

Correio da Manhã

Domingo

ELES CAÍRAM EM DESGRAÇA

Paulo Pedroso era o ‘menino de ouro’ do PS até se ver envolvido no escândalo da Casa Pia. Outros há que por causa de noitadas ou filmes ‘caseiros’ caíram do pedestal...
1 de Junho de 2003 às 18:43
Para Tomás Taveira, o Outono começou mais cinzento naquela segunda-feira 2 de Outubro de 1989. A revista ‘Semana Ilustrada’ publicava, logo ao segundo número, as fotos que provavam o envolvimento do arquitecto em filmagens ‘hardcore’ com várias mulheres. O título de capa não deixava dúvidas do que se tratava: ‘As Loucuras Sexuais de Tomás Taveira’. Lá dentro, os ‘frames’ das filmagens feitas às escondidas no escritório pareciam tirados de ‘Sexo, Mentiras e Vídeo’, o filme de Steven Soderbergh estreado no mesmo ano. Mas tudo aquilo era real, tinha o homem que idealizou as Amoreiras no papel principal e constituiu o primeiro grande escândalo sexual a envolver uma personalidade famosa no período pós-25 de Abril.
Na altura, as imagens causaram grande polémica, destruiram o casamento de Taveira e afastaram-no das luzes da ribalta durante anos. O arquitecto e professor universitário não caiu em desgraça no plano profissional e continuou a projectar edifícios, mas ao nível pessoal teve dificuldade em voltar aos meios sociais, em especial ao ‘jet set’, do qual era uma das figuras de destaque. Foi apenas um dos primeiros acontecimentos a abanar a imagem que grande parte da população tem de figuras que, normalmente por outras razões, aparecem nas páginas das revistas. O mundo não desabou, mas ficou menos cor-de-rosa.
E assim continuou até meados de 1992, quando um dos homens mais famosos da banca fugiu para os Estados Unidos, num momento em que nada o fazia prever. Nessa altura, Pedro Caldeira era a imagem do galã bem sucedido. O gel a repuxar o cabelo para trás e os fatos caros de corte fino e delicado assentavam-lhe que nem uma luva. Na Bolsa ou num qualquer evento social, fazia sucesso pela aparência – a lembrar o melhor estilo ‘yuppie’ –, e pelo toque de classe que emanava a cada gesto. Transbordava sucesso e havia quem olhasse para ele com um misto de inveja e de admiração. Tinha-se tornado, em poucos anos, na coqueluche do mercado bolseiro, era um entendido em tudo que envolvesse as transacções e parecia ser feliz, assumindo uma projecção social que o tornava famoso não só junto dos profissionais do sector, como da população em geral.
Só que o sonho deste ‘self made man’ da econonia acabou em pesadelo. Há precisamente 11 anos, o então jovem corretor rumou ao estrangeiro, num golpe que veio, uma vez mais, abalar as estruturas sociais. E não foi ‘descalço’. Na bagagem, Pedro Caldeira levava 300 mil contos subtraídos à empresa da qual era fundador, um bom pé de meia que lhe dava para viver bem e, quem sabe, gozar dos prazeres da vida longe do ‘stress’ da Bolsa; da angústia de ganhar ou perder milhões num único movimento. Ninguém queria acreditar no sucedido. Afinal, aquele a quem muitos famosos entregaram avultadas quantias - prontas a serem duplicadas em especulações financeiras de monta - tinha dado o golpe e ficado com o dinheiro. A história acabou por ter um final pouco feliz, com o FBI a descobri-lo num hotel de Atlanta, nos Estados Unidos, a 19 de Março de 1993. Muitos ficaram a saber que, como diz o ditado, ‘as aparências iludem’.
BRONCA NO PARLAMENTO
Ainda a refazerem-se da história de Pedro Caldeira, os portugueses assistiram à ecatombe que se abateu sobre o ‘cavaquismo’. No dia 9 de Dezembro de 1994, o semanário ‘O Independente’, então liderado pelo actual ministro da Defesa, Paulo Portas – hoje às voltas com o conturbado ‘caso Moderna’ –, vivia um período de ouro, com investigações que ajudaram a derrubar o governo ‘laranja’.
Uma das principais contava a rocambolesca história de como Duarte Lima, à data líder parlamentar dos sociais-democratas, teria enganado o Fisco através da apresentação de valores de compras de imóveis muito mais baixos do que na realidade teriam custado. A manchete ‘Casa Cheia’ fazia desde logo referência às alegadas irregularidades, que consistiam na compra de andares de luxo no centro de Lisboa, assim como de uma quinta em Sintra, sempre com a apresentação de custos longe da luxuosa realidade de cada uma das habitações. A história envolvia terceiros (entre eles uma ‘modesta’ sobrinha do próprio Duarte Lima), assim como o não pagamento do imposto de Sisa durante seis anos e dificuldades várias, por parte do governante, em conseguir explicar de onde lhe vinha o dinheiro. Resultado, aquela que era uma das principais figuras do PSD abandonava a governação aos 39 anos. Quando todos viam Duarte Lima como um dos principais agentes do futuro do partido, então já em fase descendente junto da opinião pública, eis que o escândalo deitou tudo a perder.
Contudo, a definitiva machadada na liderança cavaquista aconteceu ainda nessa semana, com o rebentar da polémica em torno do caso dos 120 hemofílicos que, entre 1985 e 87, foram contaminados com o VIH.
Leonor Beleza já não era ministra da Saúde quando o Ministério Público (MP) a constituiu arguida, mas não se safou do envolvimento num assunto ainda hoje por resolver, arrastando-se pelos tempos num autêntico ‘pingue-pongue’ entre o Tribunal Constitucional (que deu razão a Beleza) e o Tribunal da Relação de Lisboa. Após anos e anos de uma batalha judicial em que muitas vezes se falou de prescrição do processo - ou da sua inconstitucionalidade - certo mesmo só o facto de várias pessoas terem conhecido a morte mercê de indevidas (e, segundo o MP, conhecidas) transfusões de sangue – em 1994, o MP imputou aos arguidos o crime de propagação de doença contagiosa com dolo eventual.
Leonor Beleza, que viu a própria mãe envolvida no processo, nunca chegou a ser julgada, mas ficou com a carreira política manchada. Hoje, mesmo sendo deputada, saberá melhor do que ninguém que o seu nome ficará para sempre ligado a um caso que travou a possibilidade de mais altos voos políticos.
REBELDES FORA DOS RELVADOS
O fenómeno das jovens promessas que acabam por nunca passar disso mesmo - de promessas - não é apenas exclusivo da política ou da economia. No futebol, somam-se os casos de atletas de quem se esperava o sonho e se viram a contas com um pesadelo. Em Portugal, o caso mais emblemático – tirando o do malogrado Vítor Batista – dá pelo nome de Daniel da Cruz Carvalho, vulgo Dani, ex-
-jogador do Sporting, do West Ham, do Ajax e do Benfica. Em todos estes clubes, Dani era apontado como um futebolista de eleição, como o futuro grande atacante de uma nação que vive como poucas o fenómeno futebolístico. Só que tal nunca aconteceu. Porquê?
Dani viu a fama (e o talento, inquestionável) baterem-
-lhe à porta cedo demais. Adorado pelo público feminino – chegou a ser modelo num ou outro desfile – e fã de discotecas, aparecia muitas vezes em Alvalade quando o treino da manhã já ia a meio, cansado e sem forças para disputar o lugar com os colegas. A fama e o proveito de ‘bon vivant’ seguiram-no sempre, tanto que a passagem por Amesterdão, num clube habituado a formar grandes jogadores, revelou-se conturbada, com queixas de barulho a altas horas e festas de arromba que incomodavam os vizinhos.
A estada no Benfica, onde Dani poderia ter relançado a carreira, também não foi bem sucedida e, na sequência de um processo instaurado pelos ‘encarnados’, o atleta acabou por rescindir contrato de forma unilateral. Sem razão, decidiu o ano passado a Comissão Parital Arbitrária. Actual-mente no Atlético de Madrid, Dani é um daqueles casos que, não tendo deitado tudo a perder, sofre de uma subvalorização.
Como ele, Jardel é outro dos craques que passou ‘do oito ao oitenta’. Vencedor um pouco por todos os clubes por onde passou, viveu a última época no Sporting – pelo qual conquistou o título de campeão nacional em 2001/2002 – em fase descendente. A ‘trama’
começou antes do início do campeonato, quando anunciou que não voltaria ao clube. Depois disso, Jardel viveu um ano de inferno, com o regresso contra vontade, casos de indisciplina, lesões, separação matrimonial, noites conturbadas em hotéis de Lisboa e tudo o mais que ajudaria a escrever o argumento de uma grande telenovela da Globo. E a história ameaça não ficar por aqui.
PEDOFILIA DEITA-OS A PERDER
O primeiro soco no estômago aconteceu quando o ‘senhor televisão’, Carlos Cruz, foi preso no Algarve. Estávamos a 1 de Fevereiro e o País acordava boquiaberto com a detenção daquele que foi considerado (quase unanimemente) o maior comunicador português da actualidade – só Herman José podia, aliás, dividir as opiniões. De resto, o humorista é o mais recente e popular nome associado ao caso. Quando recebeu a intimação para comparecer no DIAP, Herman mostrou total disponibilidade para colaborar com a Justiça, acrescentando desde logo que o processo "tem de ir até ao fim", nem que ele mesmo sofra por causa disso. Herman também negou, mas a suspeita pode ofuscar uma carreira imparável. Tal como Carlos Cruz, visto como uma pessoa sem mácula; um pai de família exemplar e um profissional a toda a prova.
O segundo choque da nação ocorreu na manhã do dia 21 de Maio, quando o juiz Rui Teixeira se deslocou à Assembleia da República para pedir o levantamento da imunidade parlamentar de Paulo Pedroso. O porta-voz do PS apresentou-se ainda nesse dia no Tribunal de Instrução Criminal, de onde só saiu na manhã seguinte. Acusado de 15 crimes de abuso sexual de menores, o antigo ministro do Trabalho e Solidariedade está em prisão preventiva. Com 38 anos e um futuro político que todos esperavam risonho – era apontado como uma das opções para substituir António Costa na bancada socialista, de que é vice-presidente –, espanta a opinião pública pelo facto de ser muito novo, ter uma filha de apenas seis anos e ser conhecido pelo carácter solidário (é, aliás, o ‘pai’ do rendimento mínimo garantido). A partir daqui, pode surgir qualquer nome.
A morte dos mitos
A MORTE DOS MITOS
Portugal não é o único país onde grandes talentos acabam a carreira quando pareciam ter tudo para chegar mais longe. Lá fora, somam-se os casos deste tipo, a começar pelo de Diego Armando Maradona, por muitos considerado o melhor futebolista de todos os tempos que, de estrela maior do ‘calcio’ e da selecção argentina, passou a quase anedota. Com muitos quilos a mais, ‘El Pibe’ é hoje a pálida imagem do jogador que marcou um golo com ‘a mão de Deus’, erguendo por isso a Taça de Campeão do Mundo pela formação azul celeste. A droga e as muito faladas ligações à mafia italiana destruiram-no, acabando prematuramente com uma carreira que chegou ao fim em 1994, no Mundial dos EUA, depois de uma análise positiva no controlo 'antidoping' (a partir daqui manteve-se nos relvados mas foi ‘sempre a descer’). Hoje, Maradona continua a ser notícia, quase sempre pelas piores razões. E até já esteve às portas da morte. Mas se Maradona escapou por pouco, Rob Pilatus, um dos vocalistas dos Milli Vanilli, não aguentou o peso da fama e da polémica. O começo do fim teve lugar no Verão de 1990, quando o duo recebeu um Grammy para ‘Melhor Artista Revelação’. Nessa altura, Rob Pilatus e Fab Morvan contaram toda a verdade sobre a falta de capacidade musical do grupo. Numa conferência de Imprensa, acabaram por entregar o prémio e revelar que as vozes do disco não eram as suas. Parecia piada, mas não era. Rob não resistiu a tamanha vergonha e, após uma falhada tentativa de relançar a carreira, tentou o suícidio, atirando-se da suite de um hotel de Beverly Hills. Não morreu aí, mas acabou por consegui-lo em Frankfurt, com uma overdose de comprimidos e álcool. Tinha 32 anos e o registo de 14 milhões de álbuns vendidos em todo o Mundo. Para os quais só tinha emprestado a imagem.
O ESCÂNDALO LITERÁRIO
Clara Pinto Correia é a mais mediática figura da cultura e ciência a fazer rebentar um escândalo no campo editorial português. No início deste ano, a professora universitária, investigadora científica, escritora e cronista viu a revista ‘Visão’, da qual era colaboradora, suspender-lhe a colaboração semanal. Aos 43 anos, Clara inspirava-se demais nos artigos da ‘The New Yorker’, levando a que começasse a correr a informação de que plagiava textos da conhecida revista. Reconhecendo a gravidade da situação, mostrou-se arrependida, confessou o erro cometido numa ou noutra ocasião e chegou mesmo a afirmar que copiou “com carinho”. De nada lhe valeu. Hoje, terá alguma dificuldade em fazer valer que muitos dos seus textos foram mesmo fruto da sua imaginação.
LISTA
Nome: Clara Pinto Correia
Profissão: bióloga, escritora
Acusada de plágio
de artigos da‘The New Yorker’
Nome: Carlos Cruz
Profissão: apresentador de TV
Detido preventivamente no âmbito do ‘caso Casa Pia’
Nome: Dani
Profissão: futebolista
As festas de arromba deitaram a perder uma carreira promissora
Nome: Duarte Lima
Profissão: jurista
e político
O imposto da Sisa
manchou-lhe a imagem impoluta e afastou-o do Governo
Nome: Herman José
Profissão: Humorista
O escândalo da Casa Pia está a ensombrar-lhe a vida e a carreira
Nome: Jardel
Profissão: futebolista
Sucessivos boatos e escândalos mancharam a imagem deste goleador
Nome: Leonor Beleza
Profissão: jurista
e deputada
O caso dos Hemofílicos destronou-a do Ministério da Saúde
Nome: Pedro Caldeira
Profissão: corretor
A coqueluche do mercado bolseiro aplicou um golpe na empresa em que trabalhava e fugiu
Nome: Tomás Taveira
Profissão: arquitecto
Protagonista do primeiro escândalo sexual pós-25 de Abril
Nome: Diego Maradona
Profissão: futebolista
Era o rei do futebol mas a droga e a vida desregrada acabaram-lhe com a carreira
Ver comentários
C-Studio