Filha de pais que se conheceram na ocupação da herdade torre bela, a deputada bloquista a que chamam ministra das Finanças gosta de andar de motorizada, de comer favas e de boas doses de cafeína. vinda ao mundo dois minutos antes da irmã joana, chegou ao parlamento num processo que ainda hoje lhe vale a acusação de ser uma criação de francisco louçã. já ela prefere criar (e anunciar) impostos.
Desafina bem na guitarra. Faz kickboxing. Sofre com prazos. Cumpre- -os, muito embora o apetite de fazer mil coisas em simultâneo possa trair datas-limite. Metódica, focada e com fraca capacidade de resistência ao erro. É segura se o assunto pertence ao seu domínio. Possui forte capacidade de trabalho e de investigação. Sabe alegar e justificar cada posição e é capaz, literalmente, de fazer malabarismo com três bolas. É elegante e diz frases pesadas, opina um ex-ministro socialista. Afinal, ela disse: "A primeira coisa que temos de fazer é perder a vergonha de ir buscar dinheiro a quem está a acumular dinheiro".
Em relação à criação de um novo imposto que incida sobre o património imobiliário acima de determinado valor – 500 mil ou um milhão de euros –, um deputado socialista não economiza escárnio: "Parece que teve treino para irritar determinadas pessoas". A exclamação travestida em pergunta vem a seguir: "Onde é que já se viu?!?". O visto habita noutra sentença pronunciada pela deputada mais nova de Portugal: "Só a esquerda radical pode salvar o capitalismo". No Facebook, o infindável céptico da aliança de esquerda, Sérgio Sousa Pinto, diria que Mariana Rodrigues Mortágua é um paradigma dos "jovens burgueses criptocomunistas e habilidosos pantomineiros da velha escola".
Gente da sua vila alentejana desconhece o fio da ciência política: "A Mariana é uma pessoa simples, comunicativa, não deixa nada por dizer. Poucos políticos são como ela; estão vivos e não são peças museológicas!". O sonho antigo estava no stand e não no museu. Uma motorizada. E não é a velocidade que a faz correr, é a liberdade que o veículo proporciona.
Deita-se tarde e o seu dia começa ainda o dia não veio. Numa madrugada de novembro de 2015 estava ao lado de Filomena Cautela no momento em que a 1ª divisão da PSP mandou parar a viatura onde seguiam. A condutora, a actriz, que fora mandada parar, às 05h27 de uma quinta-feira, na avenida Ribeira das Naus, em Lisboa, numa operação stop, acusava uma taxa-crime: valores de álcool no sangue superiores ao permitido.
O champanhe da deputada é a cafeína em chávena. Gosta de números e de matemática. E de favas. Prefere cerveja a vinho. Não gosta do escuro, de sentir-se presa a rotinas e de chegar atrasada. Menos simpatiza com as multas da EMEL, que deixaram de estar acumuladas desde que optou pela mota. Alérgica a burocracias e um ás a esculpir relatórios.
Filha de Camilo
O apelido associa-se de imediato ao fundador da LUAR, organização anti- -salazarista que protagonizou dois assaltos: o do paquete ‘Santa Maria’ e o da dependência do Banco de Portugal na Figueira da Foz. Ainda não acabámos. Falta dizer que o pai da deputada bloquista, que ultimamente tem sido afamada pela oposição de ministra das Finanças, desviou um avião da TAP e dirigiu a ocupação da Herdade Torre Bela, no Ribatejo, entre Alcoentre e Rio Maior. Nessa que foi a maior herdade murada de Portugal, Camilo Mortágua apaixonou-se pela actual directora do Núcleo de Respostas Sociais do Centro Distrital de Beja, Maria Inês Fernandes Maldonado Rodrigues, uma jovem do MRPP, 20 anos mais nova, que em 1986 lhe haveria de dar duas filhas da mesma gestação. Nascida de cesariana a 24 de julho, Mariana soube do mundo dois minutos antes de Joana. Parecidas, muito. Até na voz. Houve tempo em que só o piercing espetado na sobrancelha de Mariana as diferenciava.
A professora Marília Pelica deu aulas às gémeas do 3º e 4º ano. Além da óbvia traquinice, destaca-lhe "o sentido de responsabilidade e de justiça". Participativa e interventiva nas aulas e inserida numa turma unida , que certa vez fez um levantamento sobre o que Alvito necessitava. E o que fazia falta não era animar a malta, mas a resolução da passadeira da Escola Primária. Dirigiram-se ao presidente da Câmara Municipal da altura, José António Lopes Guerreiro, e a iniciativa deu fruto: "Não me lembro se a Mariana veio sozinha, se veio acompanhada, mas o assunto ficou resolvido".
Maria-rapaz na infância, crescida no campo, no ar descontraído, teve a sorte de ter uma boîte em casa e um pai que disse às filhas para pensarem pela própria moleira. À mesa do jantar, televisão acesa "jamais, jamais", como diria Mário Lino. Todos juntos à hora da refeição da noite. Aos 15 anos estava inscrita na ONG ‘Acção para a Justiça e Paz’, presidida por Teresa Cunha: "Conheci Mariana Mortágua, em Alvito. Foi-se integrando nas actividades da nossa associação [feminista e pacifista], assumindo variadas responsabilidades no planeamento e execução de actividades de intervenção comunitária e política". A dirigente da associação com processo de encerramento definitivo distribui-lhe elogios: "Inteligente, perspicaz, perseverante, tem bom humor e, sobretudo, é leal e solidária".
O secundário no Alvito não existia, e vai para o liceu Santiago Maior, em Beja. Notas boas, aliás excelentes. Agarra-se aos livros. Na faculdade, a viver em Lisboa, com a irmã, num apartamento no Bairro do Rego, é a melhor média em Economia, no ISCTE, a entrar nesse 2004, será a melhor do seu curso e a do mestrado.
Começa o doutoramento na School of Oriental and African Studies, sob a orientação do economista inglês Jan Toporowski, para a sua tese sobre Desequilíbrios Macroeconómicos da União Europeia.
Chamada por Louçã
Fica só um ano em Londres. O Bloco de Esquerda, o partido a que aderira em 2009, chama-a para deputada quatro anos mais tarde. O lugar deixado vago por Ana Drago, que batera com a porta, parirá um processo pouco discreto. Um grupo de militantes franziu a testa à escolha "nada transparente". Num abaixo-assinado, 100 nomes sublinham que para Mariana Mortágua ocupar a cadeira no Parlamento, nove candidatos na lista de Lisboa tiveram de desistir.
A crítica alargava-se ao "critério tecnocrata" que o Bloco de Esquerda aplaudira - Mariana Mortágua é considerada como o elemento que "melhor serviria os interesses do partido na Assembleia da República, em virtude dos seus conhecimentos na área da Economia". Na Comissão de Inquérito do BES, assegura quem não quer aparecer: "Deu a ideia de que é uma inquisidora. Estava ali com cara de má. Só faltou bater".
O ex-bloquista Gil Garcia garante, via telefone: "Mariana Mortágua é uma criação de Francisco Louçã. Quando obrigaram deputados a desistirem para que ela passasse para cima, está tudo dito; se não estivesse ao lado de Louçã, isso não tinha acontecido."
Louçã, o próprio, diz de sua justiça: "Creio que é uma das mais destacadas deputadas, pela sua imensa capacidade de trabalho e de diálogo, e pela fidelidade aos compromissos pelos quais foi eleita". Descrê "que tenha havido outro economista com menos de 30 anos que tenha participado numa obra colectiva com um Prémio Nobel", junta, referindo-se ao livro também assinado por Joseph Stiglitz.
Louçã disse recentemente que Mortágua é a figura mais popular da esquerda. Dá vontade de rir a Gil Garcia, que em 2011 saiu do Bloco depois de um mar de críticas à direcção: "Passa à frente de Mário Soares e de outros!". Prossegue: "O brilharete na comissão de inquérito é tudo feito em conjunto com Louçã – o Rebelo de Sousa da esquerda". Que fique escrito: "Reconheço qualidades na Mariana Mortágua". Que fique claro: "Entre ela e Vítor Gaspar para ministro das Finanças, prefiro a Mariana". Aos olhos do professor de Filosofia a euforia é injustificável: "Até Passos Coelho pensou no imposto [sobre o património imobiliário elevado]. Não propõe nada Mariana Mortágua, a Che Guevara de saias".
Curiosamente, a deputada só é vista de calças. E de ténis, já agora.
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