Nos últimos 11 meses houve pelo menos oito atentados à bomba no nosso País, três dos quais em apenas 15 dias no distrito de Aveiro. Os danos nunca foram extraordinários, mas volta-nos à memória o período quente do pós-25 de Abril de 1974
No final dos anos 70, princípio da década de 80, a explosão de oito bombas em Portugal era uma média anual aceitável para a realidade de então. As bases lançadas pela revolução de 25 de Abril de 1974 estavam a dar os primeiros passos, a instabilidade social era grande e os atentados bombistas uma forma relativamente acessível de fazer justiça pelas próprias mãos. Actualmente, oito bombas em 11 meses é algo de ainda mais grave e preocupante.
A explosiva cronologia iniciou-se a 25 de Novembro de 2001, quando um carro foi totalmente destruído por uma bomba em Moimenta da Beira, vila do distrito de Viseu. Não muito longe dali, precisamente um mês depois, em Repeses, uma nova explosão teve consequências idênticas.
Mas se nestas duas situações os estragos foram meramente materiais, no de 30 de Dezembro de 2001, em Malta, concelho de Pinhel, a morte de um indivíduo de 56 anos manchou o caso de sangue. À semelhança das explosões anteriores, as suspeitas apontaram para vingança, já que a vítima tinha, pouco tempo antes, destruído o carro da mulher também com uma bomba.
Um episódio de características similares ao de Manuel da Silva, que, em Dezembro de 1993, armadilhou o carro da ex-mulher, em Lagos. Além de a ter morto, Manuel da Silva feriu dois dos seus filhos — então com 11 e 12 anos —, crime pelo qual foi condenado a 20 anos de prisão.
Depois de um final de 2001 intenso, os primeiros quatro meses deste ano devolveram a tranquilidade aos portugueses, mais habituados a ouvir falar de atentados bombistas no Médio Oriente, em Espanha e na Irlanda. Porém, a 30 de Abril, uma nova explosão saltou para as primeiras páginas dos jornais. Desta vez, a vítima foi a professora de Português Teresa Vaz Simão Soares, 40 anos, docente na Escola Secundária Afonso de Albuquerque, a maior da cidade da Guarda. O engenho explosivo estava colocado no motor do carro de Teresa Soares – um Toyota Carina – e, segundo testemunhas, deflagrou quando ela iniciou a manobra de marcha atrás, provocando--lhe ferimentos ligeiros num pé.
TUDO POR VINGANÇA
Com a chegada do Verão, o calor das bombas arrefeceu. Durante seis meses não houve registo de qualquer atentado, mas no início de Outubro a temperatura voltou a subir. E de que maneira. Desde então explodiram quatro bombas, uma no Algarve e três no distrito de Aveiro.
A primeira rebentou numa vivenda recém-construída nas Açoteias, Albufeira, no dia 4 de Outubro. Com a casa armadilhada com um rastilho, valeu o facto de a moradia estar desabitada, já que o interior da mesma ficou reduzido a destroços. Como já tinha acontecido noutros casos, a vingança foi apontada como móbil da explosão. “As autoridades não excluem a hipótese de se tratar de uma acção de represália de trabalhadores da obra – imigrantes de Leste –, que teriam seis a sete meses de salários em atraso”, revelou à Lusa fonte da Polícia Judiciária (PJ).
Quatro dias depois, mais a Norte, a PJ foi novamente chamada a investigar a deflagração de um engenho explosivo, agora em Oiã, distrito de Aveiro. Passavam cerca de 40 minutos do meio-dia quando José Lopes, um escriturário reformado de 64 anos, decidiu recolher a correspondência da sua caixa do correio. Pouco depois, o regresso a casa foi travado por uma explosão – ao que tudo indica detonada na abertura de uma das cartas –, que provocou ferimentos graves na cara, pescoço e tronco de José Lopes. De acordo com alguns vizinhos, a explosão ouviu-se “num raio de mais de um quilómetro”. A vítima teve de ser assistida no Hospital da Universidade de Coimbra, onde acabou por ser operada aos olhos.
Apesar de, numa primeira abordagem, este caso parecer semelhante aos relatados anteriormente, a verdade é que é bastante singular, não só porque foi a primeira vez que uma bomba chegou por carta — antes, o mais parecido eram encomendas em pacotes —, mas, sobretudo, pelas características do engenho utilizado (ver caixa).
A secção regional de Coimbra de Combate ao Banditismo da PJ mal teve tempo para analisar os contornos do caso de José Lopes, porque precisamente uma semana depois, a 15 de Outubro, ocorreu uma outra explosão em Vila Nova da Palhaça, a somente cinco quilómetros de Oiã. Maria Oliveira Julião, 57 anos, e o marido, António Ferreira Lopes, 52, remexiam num monte de lenha quando ela pegou numa garrafa de vidro e esta lhe rebentou nas mãos. A explosão feriu o casal, mas foi Maria Julião a mais atingida, sofrendo queimaduras de segundo grau na cara, nas mãos e no tronco.
E, por incrível que pareça, na terça-feira seguinte, dia 23, voltou a explodir uma bomba no distrito de Aveiro. O alvo foi o carro de José Moreira, residente em Frossos, Albergaria-a-Velha, estacionado no parque privado da casa do proprietário, e o presumível autor do atentado (um indivíduo de 34 anos) foi a semana passada detido pela Polícia Judiciária. Por ter ocorrido de madrugada, quando toda a família estava a dormir, a explosão não atingiu ninguém, mas reforçou a impressionante média de uma bomba em cada mês e meio, desde Novembro de 2001. Π
A região de Aveiro foi, em menos de 15 dias, palco de três atentados à bomba, sempre à terça-feira, e com uma distância de escassos quilómetros entre elas. Apesar da diferença de métodos – carta-armadilhada, uma garrafa explosiva e, por último, um pacote que rebentou com um carro – a Polícia Judiciária não descarta a possibilidade de existir uma relação entre os três casos. Mas prefere falar em “coincidências”. Admitindo que se tratam de casos sem ligação, como afiançam as últimas investigações policiais, a verdade é que, pelo menos em Aveiro, o atentado à bomba parece estar na moda. Especialistas ligados às forças da autoridade revelam que “é muito fácil conseguir a matéria-prima para fabricar um engenho explosivo rudimentar. Muitas vezes, basta um pouco de pólvora e um detonador”. Se nos mais recentes casos (Vila Nova da Palhaça e Frossos) há a suspeita de se tratar de um “ajuste de contas” levado a cabo por um ou dois amadores, já na situação da carta-armadilhada, detonada em Oiã, a PJ não esconde alguma surpresa por se ter deparado com um engenho refinado, de construção relativamente complexa.
Camarate: atentado ou acidente
Os atentados à bomba efectuados pelas FP-25 (Forças Populares 25 de Abril) ficaram célebres, mas na história recente de Portugal o ataque bombista mais mediático nem sequer está confirmado. Trata-se da queda do avião de Francisco Sá Carneiro e Amaro da Costa, na madrugada de 4 de Dezembro de 1980, em Camarate. A comissão parlamentar de inquérito confirmou pela terceira vez, em 1999, que o Cessna foi alvo de um atentado, mas na semana passada António Viçoso, responsável pelo inquérito da Direcção-Geral de Aeronáutica Civil ao caso, disse perante a mesma comissão que os elementos apurados na altura da investigação indicavam “subtracção de combustível” ao aparelho. “A nossa convicção é que não houve nenhuma explosão, quer na fase de voo, quer depois da queda”, justificou António Viçoso. Até haver provas concretas, fica a dúvida
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