Jornalista do Correio da Manhã esteve no almoço de apoio ao ex-primeiro-ministro.
Deu-me pena quando o Sócrates saiu da prisão com aquela t-shirt cinzenta velhinha", comenta uma mulher, de meia-idade, que finta as câmaras dos jornalistas – as alunas não a podem ver ali, são de direita; "a gente tem de saber viver", confidencia a quem a ouve. Eram 13h24 de domingo, dia 22, quando o ex-primeiro-ministro irrompeu pela sala do restaurante da antiga FIL, em Lisboa: sorridente, vestindo um fato escuro de fino corte. Aos 58 anos, sobressaía o brilho da gravata vermelha sobre a camisa branca.
"O nó da gravata continua ali aprumado. Vaidoso!" elogia mais tarde uma segunda mulher. "A falar e a vestir é imbatível", avalia a professora, que veio da região Norte.
Os 400 apoiantes que o esperam para almoçar gritam, de pé, com um som que não podia vir mais de dentro: "Sócrates! Sócrates! Sócrates!" Um ano e um dia depois de ter sido detido no aeroporto de Lisboa, o antigo primeiro-ministro acena para as centenas de pessoas agitadas pela sua presença e vai distribuindo um "obrigado"; mais um aceno; um "obrigado"; outro aceno – e assim por diante até atravessar meio restaurante.
Mário Soares entra em cena, através de uma porta refundida. Só tinham passado três minutos. Eleva-se o som das palmas. Os olhos afastam-se de Sócrates. Grita-se agora: "Soares é fixe! Soares é fixe!" O ex-Presidente da República acena e, num passo lento e apoiado, dirige-se para o amigo homenageado – o que acontece dois minutos depois –, e no cumprimento entre os dois volta a ouvir-se gritar por Sócrates.
O VINHO DE VILA REAL
Até aqui se dava pela presença dos três seguranças, Nuno Maia, Jardel e Marco, que não perdiam de vista o ex-PM. Pouco antes, quando ainda se fazia uma fila à porta para pagar os 25 euros do almoço, e por onde passaram, entre outros, históricos do PS como Almeida Santos e António Campos, os ex-ministros Mário Lino e Alberto Costa, os ex-secretários de Estado Paulo Campos, Vitalino Canas e Valter Lemos e o atual secretário-geral da central sindical UGT, Carlos Silva, os seguranças retiraram de um autocarro (que percorreu 400 quilómetros) duas dezenas de caixas de vinho – que não foi servido à refeição – da Adega de Vila Real, Vinha dos Altos, e bolos.
No mesmo local (a antiga FIL) onde outrora decorreu o Fórum Novas Fronteiras, espaço de debate aberto à sociedade civil para fazer propostas ao então governo de Sócrates, às 13h33, como aperitivo para o almoço, o antigo primeiro-ministro discursa. O som é projetado por colunas estridentes: meia hora, durante a qual José Sócrates ataca o Presidente da República e a Justiça e desfia o seu processo lendo uma passagem do inquérito. "A minha voz está de volta ao debate público em Portugal", diz. O ex-PM está perante "amigos" – simbolizando em Mário Soares. Agradece por isso aos organizadores do encontro, fundadores do movimento cívico José Sócrates Sempre: o amigo e conterrâneo, o empresário José António Pinho, ex-preso político antes do 25 de Abril, e Ana Lúcia Vasques, funcionária da Câmara de Vila do Conde, responsável pelo grupo coral da paróquia de Santa Cecília e apoiante de movimentos no Facebook como PS Maior, Soares é fixe e Apoio total a António Costa.
Está frio na sala. Há quem não tire o casaco quando é servida a sopa de coentros. Os copos enchem-se. Um com água. O outro com vinho Grão Vasco branco ou tinto, ou sumo. As mesas redondas são para dez pessoas. São poucos os que têm lugar reservado – exclusivo à mesa de Sócrates e a duas ou três à volta.
"Os pastéis de Belém ficam a quanto tempo daqui, 45 minutos a pé?" – quer saber um apoiante de Braga, que se levantou às seis da manhã para vir à capital, de comboio. "Meia hora, no máximo, e é sempre em frente." A vinda a Lisboa é motivo de conversa nesta mesa. O mesmo homem mete-se com um rapaz, de 10 anos, filho de uns amigos. "Daqui a uns anos, quando passares aqui perto, vais dizer: ‘Eu já estive aqui com o José Sócrates e o Mário Soares.’"
"Com o Mário Soares!? Ninguém vai acreditar!" – acrescenta uma das mulheres do grupo. Mas o miúdo não valoriza.
Esta é talvez a mesa com a média de idades mais baixa – por ter uma criança e os pais. A maioria dos apoiantes são de meia-idade, com as mulheres em vantagem.
É servido o prato principal: cachaço de porco no forno com batatas e castanhas e couve-lombarda salteada com feijão e bacon. As garrafas de vinho não estão em cima das mesas, mas os empregados, atentos, vão tirando o vazio aos copos. Já se ouve um brinde: "Ao PS!".
Soares levanta-se às 15h00. Enquanto se dirige para a saída, elevam-se as vozes paraa outra acrescenta que "lhe falta uma esposa".
o aplaudir. Duas mulheres comentam: "É uma figura ímpar, comove-me vê-lo";
a outra acrescenta que "lhe falta uma esposa".
Sócrates também já não volta a sentar-se à mesa, nem para comer o petit gâteau de chocolate com gelado. Todos querem novamente abraçá-lo e beijá-lo.
TODOS À FOTOGRAFIA
O ambiente fica descontraído. José Sócrates é permanentemente puxado para tirar uma e mais uma fotografia – selfies até – agarrado aos apoiantes, muitas vezesde polegar estendido. Não haverá uma única em que não esteja a sorrir. O próprio até comenta algumas das imagens em tom de brincadeira.
"Já fiz muita campanha política com ele, mas nunca tínhamos tirado uma foto juntos. Agora é que vale a pena, porque ele está em baixo", diz, eufórica, uma apoiante de Vila do Conde, enquanto mexe e remexe no telemóvel com a imagem.
"Que orgulho!" – suspira outra apoiante, segurando o livro escrito pelo ex-primeiro-ministro e que o próprio autografou: "A C.S. com amizade, José Sócrates."
Às 15h45, Sócrates dirige-se para a saída, com um ramo de rosas na mão e alguns sacos com ofertas que os fãs lhe trouxeram. "Obrigado, obrigado", diz. As pessoas, levantadas, aplaudem-no, e, à medida que desaparece pela porta, algumas colam-se aos vidros da janela. Querem vê-lo entrar no carro, no estacionamento em frente. "Ele continua a ter seguranças?", ouve-se perguntar. "Parecem pelo menos uns três." Os guarda-costas rodeiam o BMW de Mário Lino, onde o ex-primeiro-ministro vai à boleia. À medida que o carro de luxo avança, ainda há quem faça adeus por trás do vidro do restaurante.
Os amigos de Braga, que pelas contas à viagem de Alfa só estariam em casa perto das 23h00, levantam-se agora para ir aos pastéis de Belém. "Quanto tempo demoramos depois até à estação de Santa Apolónia, a pé?" – "A pé!? É muito longe."
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