Cada vez mais os espectadores procuram conteúdos específicos, com preferência pelas séries escolhidas avulso.
Em 2014 confirmou-se a nova configuração da televisão. A televisão já não é uma tecnologia, é uma linguagem em conteúdos próprios. No mundo ocidental, aumenta o tempo de visão, mas diminui a audiência dos canais generalistas. Cresce a TV ‘à la carte’: canais norte-americanos como a HBO e a CBS juntam-se a serviços da Internet como a Netflix ou a Amazon na disponibilização de conteúdos avulsos, o que a SIC também já faz. Aumentam os conteúdos de TV na Internet e o consumo em aparelhos alternativos ao televisor. As séries confirmaram o seu lugar cimeiro entre os conteúdos de qualidade e de alcance global.
MODELO ANTIQUADO
No Brasil, uma das maiores empresas de TV do Mundo, a Globo, reformulou a sua estrutura para se adaptar à nova televisão, a TV dos conteúdos. Em Portugal não vimos nada de semelhante. A RTP reestruturou as suas chefias para defender essas chefias num modelo de TV dos anos 80. Tal como a TVI e a SIC, afunilou os géneros de programas, encharcando o dia de novelas, programas de conversa e televendas. A TV generalista portuguesa está menos generalista do que nunca. Procura desse modo manter as audiências que não fogem para o cabo, mas de pouco resulta. TVI, SIC e RTP já só atraem 2/3 da audiência total da TV e nos 80% da população com cabo os generalistas vão descendo a caminho de metade da audiência (54,5%). Apesar de a audiência total de TV se manter ou crescer em 2014, os generalistas perderam 2,5% da parte de audiência para o cabo e outros (só a RTP 1 cresceu, à conta do Mundial e de competir mais com os privados).
Com menos recursos e em emagrecimento, as generalistas não ousam novos géneros e programas. ‘Melhor que Falecer’, na TVI, desapareceu sem deixar rasto. Preferem repetir géneros e programas, como o ‘Big Brother’, rebaptizado ‘Casa dos Segredos’, na TVI desde 2000. Os três maiores canais chegaram a apresentar 18 episódios de novelas e cerca de 10 horas de talk shows por dia em 2014. A RTP acabou com ‘5 para a Meia-Noite’ e com a ‘Praça da Alegria’ e nada produziu de infanto-juvenis. A sua única aposta na ficção histórica, ‘Filhos do Rock’, foi maltratada pela estação e um falhanço.
ASSÉDIO AO ESPECTADOR
Os generalistas carregaram nos géneros que permitem receitas em telefonemas de valor acrescentado, num assédio sem precedentes aos espectadores. Em termos de criatividade, a TV generalista de 2014 foi menos que um deserto, foi um buraco negro. À parte melhorias na produção e concretização de telenovelas na SIC e também na TVI, não houve programas que se destacassem pela diferença e surpresa. À parte a ‘Casa dos Segredos’, foi um ano de "realities" de cantorias, danças e cozinhados. O futebol domina no desporto em transmissões de jogos e também nos programas de conversa.
Os noticiários generalistas, por razões comerciais, têm muito mais tempo do que conteúdo e apresentam cada vez mais publicidade mascarada de notícias. É nos noticiários que se nota mais o esvaziamento profissional dos canais: notícias sobre nada, notícias mal escritas, com erros, grafismos com erros. Em Maio, a noite eleitoral das europeias foi a pior de sempre nos generalistas. Apesar do seu horário nobre, apenas quatro programas de notícias estiveram entre os 50 mais vistos de 2014.
As audiências dispersam-se e os três generalistas concentram-se nos programas que forneçam audiências contínuas, como os reality shows, ou momentâneas, como o futebol, que gerou todos os 20 programas mais vistos do ano e mais quatro na lista dos 50 mais vistos. Sete episódios de novelas e seis edições da ‘Casa dos Segredos’ entraram nessa lista.
DEMISSÕES NA RTP
A política manteve-se em relação estreita com a TV, nos dois sentidos. O governo aprovou uma nova forma de governança para a RTP, que levou à demissão, por incompetência e desadequação ao conceito de serviço público, da administração da empresa pelo novo Conselho Geral Independente. A nova governação deu um passo na desgovernamentalização da RTP, mas não resolveu nos primeiros meses nenhum problema essencial da RTP: o seu controle pelas elites parasitárias, a obsessão com programação comercial, o total desinteresse por conteúdos de interesse público. A eleição no PS revelou-se uma luta entre o candidato do aparelho (Seguro) e o candidato da TV e apoiado pelos jornalistas (Costa), vencendo este, como no passado Santana e Sócrates. O PCP usou as minimanifestações para estar sempre na TV, mas mesmo essa estratégia cansou, no final do ano.
PRISÃO TELEVISIONADA
Culminando um ano de acontecimentos transformados em grandes eventos de TV, a prisão de Sócrates, a primeira de um ex-primeiro-ministro, foi um acontecimento histórico televisionado. O político que, em quase 40 anos, mais quis amordaçar a liberdade de imprensa e mandar a seu bel-prazer na TV e outros media acabou o ano, ele mesmo, atrás das grades. Só a prisão o tirou em 2014 do horário nobre da RTP, onde chegou por razões obscuras. Mas outros acontecimentos permitiram à TV reavivar o seu instinto informativo: a morte de Eusébio, a tragédia do Meco, a revolução em Kiev, a ‘manif’ de polícias em S. Bento, o regresso do fantasma de Maddie a Lagos, o Mundial no Brasil, o caso BES e suas audições no parlamento.
A SICN "libertou-se" de Mário Crespo, que dava alguma notoriedade ao seu horário nobre. O canal de notícias da SIC perde também relevância com o esgotamento do modelo da ‘Quadratura do Círculo’ e do jornalismo ‘sentado’. Em 2014, morreram alguns nomes que marcaram a história da TV portuguesa: Emídio Rangel, Fernando de Sousa, Sousa Veloso e Anthímio de Azevedo, e ainda o jornalista e comentador Miguel Gaspar.
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