Violava jovens desde o Técnico
Contou à PJ de Lisboa que abusou de cerca de quatro dezenas de mulheres ao longo dos anos. Chorou ao sair do tribunal, quando foi para a cadeia. <br/>
Foi a chorar que o maior predador sexual conhecido até agora em Portugal deixou as instalações do Tribunal de Instrução Criminal, no Campus da Justiça, em Lisboa, ontem, cerca das 21h00. O engenheiro, de 30 anos, é acusado de ter violado raparigas desde o tempo em que estudava no Instituto Superior Técnico, em Lisboa. Cometeu dezenas de crimes e confessou cerca de quarenta aos investigadores. Apenas foi indiciado por oito casos de abusos sexuais, mas as autoridades procuram agora reconstituir as histórias contadas pelo homem, para as quais não foram apresentadas queixas à polícia.
Conhecido como o violador de Telheiras, o suspeito tinha o hábito de atacar sempre às terças-feiras. Roubava objectos das vítimas, como telemóveis ou aparelhos de música, que usava e que foram apreendidos. Mostrou arrependimento e garantiu várias vezes que agiu por não controlar os impulsos sexuais. Mesmo assim, mostrou também ser frio e calculista, e em alguns momentos revelou não ser capaz de controlar o seu comportamentos.
Ao princípio da noite – horas depois de ter sido apanhado na empresa de telecomunicações em que trabalhava – o homem acabou por aceitar contar todo o passado. Disse que sempre abusara de raparigas e que escolhia as mais novas, maioritariamente menores.
Atacava-as nas escadas dos prédios e obrigava-as a prática sexuais. Foi contando casos atrás de casos, relatos que as autoridades admitem poder chegar às quatro dezenas. Não há no entanto queixas que as suportem, e a Judiciária de Lisboa procurará agora dar rosto às situações relatadas. E, nos casos em que ainda for possível, aconselhar as vítimas a apresentar queixa.
Ontem, o homem chegou ao tribunal num carro descaracterizado da Polícia Judiciária, cerca das 11h30. Mas só por volta das 16h30 começou o interrogatório, que se prolongou até às 21h00 e que determinou a sua prisão preventiva.
DIZ SER DOENTE E TER PROCURADO AJUDA MÉDICA
As autoridades nunca pensaram que confessasse mais crimes do que aqueles que eram conhecidos. Mas o suspeito fê-lo, e chegou mesmoa explicar que se tratava de uma doença. Garantiu já ter procurado ajuda médica para o facto de não controlar as pulsões sexuais, mas que nunca conseguiu evitar o desejo de maltratar as jovens a quem obrigava a manter contactos íntimos. Ao longo dos interrogatórios mostrou falta de controlo.
PORMENORES
DEZ CASOS CONHECIDOS
Eram apenas dez as situações conhecidas pela Polícia Judiciária de Lisboa. Mas a prova reunida era mais forte em oito casos, e foram aqueles que ontem foram apresentados ao juiz de instrução criminal. A aplicação da preventiva era inevitável.
JOVEM ADVOGADA
A defesa do suspeito está por enquanto entregue a uma jovem advogada oficiosa que ontem se encontrava de escala no tribunal. A sua continuidade neste caso ainda será avaliada.
PJ AUMENTA VIGILÂNCIA
O trabalho da Judiciária de Lisboa foi intenso nos últimos meses. Desde Setembro/Outubro a vigilância policial em Telheiras foi intensificada, e a partir daí o homem não mais atacou.
VIGIADO ATÉ À DETENÇÃO
Há alguns dias que a PJ de Lisboa acreditava ter encontrado o violador de Telheiras. Nos últimos dias, o engenheiro foi vigiado e a escolha da detenção na empresa onde trabalhava foi decidida para evitar que aquele reagisse de forma mais violenta. Foi detido aofinal da tarde de anteontem.
ESCOLHIA AS VÍTIMAS LONDE DA ZONA ONDE MORAVA
O número de mulheres jovens, a maioria menores, que o homem poderá ter violado ou obrigado a práticas sexuais, é desconhecido, mas parece certo que nunca actuava na sua zona de residência. Morador em Queluz, o predador atacou em Telheiras, Alfragide e Linda-a--Velha, evitando sempre os locais onde poderia ser reconhecido.
O facto de actuar de cara destapada levava já a Polícia Judiciária de Lisboa a suspeitar disso mesmo. O homem tinha de ter alguma segurança de que não seria reconhecido pelas vítimas, já que dificilmente aquelas se cruzariam com ele noutras circunstâncias.
Recentemente, deixou crescer a barba, depois de perceber que a pressão policial aumentara. Desde Outubro do ano passado que não havia registo de qualquer violação ou abuso sexual na zona de Telheiras, onde os ataques tinham sido mais intensos. Temia ser apanhado e parecia ter dominado os seus impulsos.
Anteontem, quando a PJ o interceptou na empresa de telecomunicações em que trabalhava, o homem ainda reagiu com violência. Tentou agredir os polícias, foi dominado e rapidamente reconheceu as acusações.
A prova era também ela muito consistente. Cinco das oito vítimas reconheceram-no de imediato, sem qualquer sombra de dúvida, enquanto três delas deixaram no ar algumas dúvidas.
O ADN recolhido no local dos abusos e também uma impressão digital encontrada pelos elementos do laboratório de Polícia Científica permitirão fundamentar a prova contra o suspeito.
Suspeito que inclusivamente já reconhece os abusos mais recentes e ainda muitos outros crimes que, no entanto, nunca terão sido participados às autoridades policiais
PREFERIA PRÉDIOS COM ESCADAS EXTERIORES
O violador de Telheiras tinha os locais de ataque muito bem definidos. Telheiras era onde atacava com mais frequência, e sempre à terça-feira. A arquitectura de alguns dos prédios deste bairro era um dos motivos. Os que tinham escadas exteriores permitiam surpreender as vítimas sem que o predador tivesse de entrar no prédio. Mas o engenheiro agora detido também chegou a violar raparigas em Alfragide e em Linda-a-Velha, locais onde deixou alguns vestígios biológicos.
ENGENHEIRO COM CURSO NO TÉCNICO
O violador de Telheiras estudou há cerca de dez anos no Instituto Superior Técnico (IST), em Lisboa. Foi nessa altura que os primeiros ataques a raparigas mais novas começaram. Cometeu mais de quarenta crimes desde então.
As principais áreas de ensinono IST são a engenharia, a ciência, a tecnologia e a arquitectura.A zona onde está situada a escolaé uma das áreas de prostituição de rua mais conhecidas da capital.
TELHEIRAS RECUPERA DO PESADELO
Foram dois anos de medo que terminaram anteontem com o conhecimento de que tinha sido detido o violador das raparigas no bairro de Telheiras, em Lisboa. Maria Fernanda Augusto olha com alívio para a porta de entrada do seu prédio, na rua Professor Vieira de Almeida, ao saber que foi removida a fotocópia com o retrato-robô do violador.
'Já não é necessário', referiu depois de contar que, sobretudo, as raparigas da idade do filho, com 13 anos, é que andavam mais assustadas, perante as sucessivas notícias de jovens que tinham sido vítimas do predador sexual.
Numa onda crescente de sustos e de medos, a população local procurou organizar-se para proteger as suas filhas do criminoso, sobretudo à noite.
Odete Neves, que há 24 anos vive no bairro, conta que nunca houve tanto receio de sair à rua como com a história do violador à solta. 'Era um medo terrível. As miúdas para virem ao café vinham com os irmãos ou os amigos porque mesmo de dia tinham medo', disse. 'Havia um sentimento de impotência generalizado. Mesmo as mulheres mais velhas tinham medo de, por exemplo, ir para a estação do metro', acrescentou.
Instalado o alarme social, apesar de os moradores confirmarem uma presença reforçada da polícia, ninguém queria facilitar. Os maridos acompanhavam as mulheres às paragens dos autocarros, os miúdos só saíam da escola aquando da chegada dos pais.
'Há uns tempos que já não saio à rua sozinha', disse Maria Fernanda Augusto, depois de há três meses ter surgido o retrato-robô do violador de Telheiras.
MULHERES RECORDAM DIAS DE PESADELO
'NINGUÉM ESPERA QUE ACONTEÇA NO SEU BAIRRO': Filipa Varela Licenciada Estudos Europeus
Ninguém está à espera de que uma coisa destas aconteça no seu bairro. Ninguém está preparado para enfrentar uma situação em que é informado de que há um violador a perseguir raparigas menores num local em que julgávamos ter segurança.
'ACREDITO QUE VAI SER PUNIDO PELOS CRIMES': Maria Coalho Reformada
Acredito que a Justiça portuguesairá trabalhar para que o violador seja punido pelos crimes que cometeu. Espero que sim, para o bem de todos nós. São coisas monstruosas de que nunca tinha ouvido falar apesar de viver aqui há seis anos.
'OUVI FALAR DE UMA RAPARIGA QUE CONSEGUIU FUGIR': Maria Fernanda Augusto Doméstica
Ainda bem que a polícia conseguiudeter o homem, porque os jovens andavam muito assustados com as sucessivas histórias de violação. Soube do caso depois de ouvir que uma rapariga chegou a ser apanhada, mas ele largou-a depois de ela gritar.
'PREFERIA ESTE BAIRRO DEVIDO ÀS ESCADAS EXTERIORES': Odete Neves Reformada
O violador era esperto e calculista.Durante o dia estudava isto tudo.Dizem que ele atacava em Telheiras porque muitos prédios têm escadas exteriores para os terraços. Ele agarrava as raparigas e levava-as lá para cima, para ninguém ver.
A CINCO MINUTOS DO LOCAL DO CRIME
Engenheiro de 30 anos, o violador de Telheiras trabalhava numa empresa de telecomunicações na zona do Rego, em Lisboa. O seu local de trabalho ficava a apenas cinco minutos de carro do bairro onde durante dois anos praticou sucessivas violações de menores. Moradores de Telheiras acreditam que o agressor estudou o bairro e aproveitou os edifícios com pisos térreos, destinados a estacionamento, abertos e com recantos escuros, para poder abordar as vítimas.
GINÁSIO JUSTIFICAVA ATRASOS
O violador de Telheiras justificava junto da companheira, com quem vivia em Queluz, os atrasos em chegar a casa com as idas ao ginásio. Segundo apurou ao CM, o jovem de 30 anos alegava que ia ao ginásio às terças-feiras ao final da tarde. Este foi o dia da semana em que praticou a maioria dos ataques a menores em Telheiras.
O violador afirmava à companheira que praticava desporto nesses dias da semana e as violações ocorriam depois de cada deslocação ao ginásio. Com a publicação do retrato-robô, o violador optou por mudar o visual, preferindo usar barba, para assim passar despercebido junto dos restantes utentes.
No entanto, no maior ginásio de Telheiras, o rosto do jovem não é conhecido de funcionários e utentes. Ontem, o CM abordou vários frequentadores do espaço e ninguém disse conhecer o jovem a partir do retrato-robô. 'A cara não me é estranha, mas como moro em Telheiras pode ser do bairro que o conheço', disse uma jovem que preferiu não revelar o nome. 'O que mais me surpreendeu no retrato foi o nariz, parece o nariz de uma mulher', acrescentou.
NOTAS
2004: ATACADA NO ELEVADOR
Já em 2004 eram noticiados no ‘CM’ ataquesem Telheiras suspeitos de terem sido cometidos por este predador. Na altura, uma jovem foi violada no elevador quando chegava a casa
ABUSOS: CIFRAS NEGRAS
O facto de ter confessado abusos de que a PJ não tinha conhecimento não surpreendeu osinvestigadores. Os abusos sexuais são o crime que apresenta a maior taxa de cifras negras
SILÊNCIO: MEDO E VERGONHA
O facto de a maioria das vítimas se ter mantido em silêncio poderá ter ocorrido por medo ou vergonha. O direito de queixa também prescreve ao fim de seis meses após a maioridade
LISBOA: RUAS DESERTAS
A rua professor Francisco Gentil, uma das que têm maior número de lojas em Telheiras, ao cair da noite ficava deserta perante o medo do próximo ataque do violadorSOLIDARIEDADE: VIZINHOS
Telheiras é um bairro caracterizado porpouco convívio entre vizinhos. Uma situação que se inverteu nos últimos meses com o reforço da vigilância, sobretudo das jovens
COLEGAS: SEM SUSPEITAS
Os colegas de trabalho do violador ficaram perplexos com a notícia da sua detenção.O jovem assumia um comportamento banal e nunca entrou em conflitos
DETENÇÃO: VIOLADOR RESISTIU
A detenção do violador de Telheiras no local de trabalho, ocorrida anteontem, não foi pacífica.O ‘CM’ sabe que o engenheiro resistiu e tentou agredir os inspectores da Judiciária
RETRATO-ROBO: OJ DIVULGOU
A Polícia Judiciária conseguiu elaborar umretrato-robô do violador de Telheiras que foi amplamente divulgado pelos órgãos de Comunicação Social a 25 de Fevereiro
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