Isabel desapareceu em 24 de Maio do ano passado, Mariana em 14 de Outubro (e não em Novembro como se disse inicialmente) e Joana em Maio deste ano. Os homicídios que a Polícia Judiciária atribui a António Costa, de 53 anos, cabo da GNR na reserva, foram cometidos por altura dos momentos altos do culto na Cova da Iria, em Fátima – Maio e Outubro.
Os meses em que ocorreram os crimes são os mais importantes do culto mariano em Fátima: em Maio, foi a primeira aparição; em Outubro, a última, a sexta, e o milagre do Sol. Fonte da Polícia Judiciária atribui importância às datas porque “revelam um padrão de comportamento” como é próprio dos assassinos em série: “Constatámos que ele só matou em momentos do calendário religioso de Fátima.”
O desaparecimento e morte de Isabel, Mariana e Joana em Santa Comba Dão foi um murro no estômago de uma cidade pouco habituada ao macabro. Mais forte ainda quando o presumível autor é tido como pessoa acima de qualquer suspeita e católico praticante.
Quem conhece o cabo AntónioCosta, o ‘Tói’, sabe que tinha em casa fotografias do Papa João Paulo II e da Irmã Lúcia – além de retratos de Salazar, natural do vizinho lugar de Vimieiro e de quem o cabo António Costa ainda guardava grata memória.
Quatro dias após o desaparecimento de Joana, o suspeito foi em peregrinação a pé a Fátima, entre os dias 12 e 27. O cabo Costa estava arranhado no pescoço e nos braços e disse que se ferira nas silvas do quintal atrás da sua casa.
Agora, toda a gente em Santa Comba e a Polícia Judiciária atribuem outra origem aos arranhões. “A Joana era uma miúda forte e aquilo foi ela a resistir”, diz Miguel, o irmão mais velho da vítima.
Nas ruas e nos cafés discute-se o padrão dos crimes e a mente perversa do principal suspeito dos crimes que abalaram Santa Comba Dão.
A mulher do cabo Costa, Fernanda, a seguir à prisão, na quinta-feira, dia 22, partiu de Santa Comba Dão e refugiou-se numa terra vizinha. Está com o filho, André, também ele militar da GNR, com acompanhamento psicológico. O outro filho é emigrante no Luxemburgo. A mãe de António Costa, idosa e doente, está fechada em casa. Os irmãos deles, em Santa Comba Dão, não dizem nem uma palavra.
Um primo do principal suspeito dos crimes conta ao CM, sob anonimato, que também tem dificuldade em acreditar. “Custa-me a crer. Uma pessoa como ele fazer uma coisa destas? Mas, da mesma forma que acho que, se foi ele, deve pagar, não concordo que queiram culpar toda a família. Chamar assassinos aos irmãos e à mãe? Não se faz uma coisa dessas”, diz.
A verdade é que no dia da detenção de ‘Tói’ a relação entre a família do suspeito e as das vítimas sofreu um golpe irreparável.
Em casa de Joana, os pais e o irmão lembravam-se de o vizinho os ter ajudado a procurar a rapariga. O pai de Isabel não se esquecera do cabaz que António Costa levou lá a casa a seguir ao primeiro Natal sem a filha. E os familiares de Mariana ainda se recordavam todas as vezes que o cabo Costa tinha perguntado por novidades. “E afinal era ele”, diz Bruno, o irmão de Joana.
Nessa a quinta-feira à tarde, quando a PJ anunciou que tinha apanhado o principal suspeito dos crimes, a surpresa da população deu lugar a uma estranha combinação de choque e horror.
António Luís Costa, que a população se habituou a respeitar, agora na cadeia da Polícia Judiciária de Coimbra, é o homem de quem todos falam. A “virtude” em pessoa, dizem uns. Um “cidadão exemplar”, garantem outros. ‘Tói’, suspeito de três crimes de homicídio e outros tantos de ocultação de cadáver, fazia parte da cidade e, como o granito das casas, parecia estar por toda a parte.
Se não estivesse a cuidar do jardim em Cabecinha de Rei, nos limites da cidade de Santa Comba Dão, estaria por certo, mais à noite, na casa do Benfica que, tão dedicadamente ia ajudando a crescer. Uma vida normal, mas que encerrava um mistério tão negro quanto incompreensível.
E SE ELE FOR DECLARADO DOENTE?
O Tribunal, por iniciativa dos próprios juízes ou a pedido da defesa de António Costa, pode mandar submeter o arguido a exames psiquiátricos no Instituto Nacional de Medicina Legal – para determinar se os crimes foram influenciados por distúrbio mental ou, pelo contrário, se ele tinha perfeita consciência dos actos. Em qualquer dos casos será julgado. Mas se for considerado doente (inimputável) não cumprirá o normal castigo de prisão como um imputável: será internado para tratamento por um período nunca inferior a três anos – até que os médicos digam que já não representa perigo para a sociedade.
'NÃO FEZ JOGO COM A POLÍCIA'
Os crimes de Santa Comba Dão e o comportamento do principal suspeitam intrigam o psicólogo criminal Carlos Poiares: o presumível homicida – diz aquele investigador da Universidade Lusófona – não fez “um jogo” com a Polícia como é próprio dos ‘serial killers’. Um dos comportamentos típicos de um assassino em série passa por matar sempre da mesma forma – para que os investigadores policiais saibam que os crimes são cometidos pelo mesmo criminoso. O próprio homicida deixa pistas úteis à investigação. O suspeito destes casos de Santa Comba, diz Carlos Poiares, “teve o cuidado interessante de ocultar os cadáveres em locais onde dificilmente pudessem ser detectados” e tornou-se “cooperante com a família das vítimas”. Ainda assim, o psicólogo Carlos Poiares reconhece no suspeito, cabo António Costa, alguns pormenores que o aproximam do ‘serial killer’ padrão’: “As vítimas foram sempre adolescentes e o método que utilizou para as matar parece ter sido o mesmo”: pancada.
'O CABO COSTA TRAIU OS AMIGOS'
O triplo homicídio atribuído ao cabo António Costa dominou todas as conversas dos comerciantes e dos clientes da feira semanal de Santa Comba Dão – que o suspeito frequentava habitualmente. “Ele vinha sempre à feira, quanto mais não seja para falar com os amigos e pôr a conversa em dia”, disse ao CM um feirante.
As mortes e, principalmente, o suspeito dos crimes espantaram e deixaram chocada a região. A reputação que António Costa criou junto da população ao longo de meio século de vida choca, agora, com o perfil de um “psicopata de primeira categoria”, como disse ao nosso jornal José Carlos Calisto, de 73 anos, um “amigo do peito” do suspeito. “Amigo não, ex-amigo”, emenda imediatamente. “ Não tenho vergonha de dizer que fui muito amigo dele, mas perante tudo o que aconteceu, quem poderá ser amigo de uma pessoa destas?”, diz José Calisto. Garante que não irá vê-lo à prisão.
“O cabo Costa traiu os amigos, que também estão a sofrer com tudo isto”, diz João Bernardes, de 65 anos, que sempre manteve uma amizade com o suspeito e que não lhe perdoa “a vergonha que cometeu”. “É muito triste a gente confiar e admirar um pessoa e, na volta, ele faz coisas dignas de um monstro. Já diz o ditado: quem vê caras não vê corações”, afirma Artur Baptista.
No posto da GNR de Santa Comba Dão, o ambiente nos últimos dias tem sido de “choque e estupefacção”, não só por o suspeito dos crimes brutais ser um homem que frequentou aquela casa durante quase 30 anos mas, também, por as famílias acusarem a Guarda “por não ter feito tudo” na altura do desaparecimento das jovens.
“A notícia da detenção do ‘Tói’ caiu no posto de Santa Comba como uma bomba. Ninguém queria acreditar que aquele homem fosse capaz de fazer uma coisa destas”, disse um militar da GNR sob anonimato, acrescentando:“Como colega só posso dizer bem dele. Sempre cumpriu a sua missão com grande profissionalismo e brilhantismo.”
Nestes dias, muitos habitantes da cidade de Santa Comba Dão têm-se deslocado às habitações dos familiares das vítimas para lhes oferecer ajuda e solidariedade. “Eles precisam de todo o apoio do Mundo”, diz Maria Neves.
FALTA ENCONTRAR CABEÇA DE UM CORPO
Duas pernas, que tudo leva a crer pertençam ao corpo de uma das vítimas do ex-cabo da GNR de Santa Comba Dão, foram ontem encontradas na pequena barragem de Penacova. Os restos do corpo foram encontrados por funcionários da barragem quando procediam à limpeza das grades que filtram as águas à entrada de túnel. Segundo disse Pedro Carmo, director da PJ de Coimbra, tudo aponta para que sejam “partes do corpo que há cerca de um mês foi encontrado desmembrado neste local” e que, muito provavelmente, pertencem a Mariana. No entanto, disse o director da PJ de Coimbra, “só os exames laboratoriais permitirão tirar todas as dúvidas”. Os membros inferiores foram transportados para o Instituto Nacional de Medicina Legal de Coimbra. Mariana Lourenço foi a segunda vítima. Ainda falta encontrar a cabeça. “É possível que se tenha partido”, disse António Simões, comandante dos Bombeiros de Penacova.
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