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PJ acredita que Kate matou a filha

Madeleine poderá ter sido agredida. Mas também poderá ter morrido na sequência de um acidente, depois de ter sido sedada para dormir. É esta a convicção da Polícia Judiciária, que acredita ter sido Kate que matou Maddie, de forma acidental ou consciente. As certezas não existem, apenas indícios que apontam para a mãe da criança. Pelo seu comportamento, pela forma como agiu relativamente ao desaparecimento da filha, pelos odores a cadáver e vestígios forenses recolhidos pela polícia científica.

10 de setembro de 2007 às 13:00

Kate apresentou-se na quinta-feira na Polícia Judiciária visivelmente descontrolada. Fontes policiais contactadas pelo CM dizem que teve várias vezes, ao longo das mais de 13 horas de interrogatório, reacções histéricas. E recusou responder a muitas perguntas. Não explicou o sangue encontrado no carro, não respondeu se esbofeteava a filha. E nem sequer confirmou com clareza se sedava as crianças.

Certezas para a PJ são apenas os factos. E esses revelam que era Kate quem habitualmente cuidava das crianças, as deitava regularmente, enquanto Gerry jogava ténis ou descansava na piscina. O depoimento da septuagenária inglesa (Pamela Fenn), que ocupava um apartamento no andar de cima ao utilizado pelos McCann, indicia também que Kate às vezes se tornava violenta. Descontrolava-se, sendo audíveis os gritos da menina a chamar pelo pai. Há outra testemunha, também inglesa, que refere o mesmo cenário. Kate parecia ter momentos de agressividade perante os filhos, sendo o pai, embora mais ausente, quem revelava maior controlo emocional.

Kate refutou todas estas suspeitas na Polícia Judiciária de Portimão onde foi interrogada e foi nesse quadro que lhe foi explicado o enquadramento penal do homicídio por negligência. O CM sabe que os investigadores, embora não a confrontassem directamente com uma possível agressão, lhe explicaram que ao não confessar o acidente poderia abrir portas para um quadro legal mais penoso.

O que significa que deixaria de se tratar de um homicídio negligente, para passar a um crime qualificado ou com dolo eventual.

PAI PEDE PROVAS À PJ

Gerry teve também um comportamento invulgar durante o interrogatório judicial. Confrontado com as suspeitas da PJ, o pai de Maddie pediu repetidas vezes que lhe fossem fornecidas provas. Não negou peremptoriamente os factos, mas tentou perceber se as autoridades tinham indícios suficientes para sustentarem a tese de homicídio.

Para a PJ há também uma outra situação estranha. Se se tratou de um acidente, por que é que os McCann se desfizeram do cadáver e simularam um rapto? A hipótese de esconderem algo mais do que um acto irreflectido está em cima da mesa e os investigadores esperam apenas esgotar todas as hipóteses para que eles expliquem a morte. Depois disso avançarão para a acusação formal de homicídio e ocultação de cadáver.

JUDICIÁRIA FAZ RELATÓRIO E PROPÕE BUSCAS AO PROCURADOR

Os próximos passos da investigação terão de ser decididos pelo Ministério Público. Quando recomeçam as buscas à procura do corpo de Maddie e quando voltarão a ser inquiridos os McCann que ontem de manhã regressaram ao seu país.

A decisão cabe agora ao procurador José de Magalhães e Menezes, que hoje deverá receber o relatório intercalar elaborado pela PJ de Portimão.

O responsável do departamento deverá sugerir os novos passos a tomar, designadamente que sejam retomadas as buscas, o mais precisas possível, para evitar a repetição da procura incessante de Maio e também da “correria” que marcou o caso Joana.

Ontem, na Polícia Judiciária, o ambiente era de desalento. Diversas fontes contactadas pelo CM confirmaram o óbvio. Que a atitude dos McCann ao saírem do País estava coberta pela legalidade – o casal prestou Termo de Identidade e Residência na morada que possui em Inglaterra – mas que agora o processo corre sérios riscos de nunca mais ser resolvido. “A atitude é legal. Mas obviamente que vai complicar a investigação, porque temos de aguardar pelo cumprimento de formalidades legais”, disse ao CM o porta-voz da PJ, Olegário de Sousa.

GNR À ESPERA PARA AVANÇAR

A GNR foi contactada na passada sexta-feira, para a partir de hoje estar disponível para avançar para buscas nos terrenos a sul do Ocean Club. No entanto, as mesmas ainda não estão marcadas, devendo ficar dependentes da decisão do Ministério Público. É provável, no entanto, que sejam retomadas nos próximos dias, mas partindo para locais concretos.

MINISTÉRIO PÚBLICO RECUOU

Na quinta-feira, quando a Polícia Judiciária optou pela inquirição a Kate, os investigadores admitiam constitui-la arguida e, caso ela não respondesse cabalmente aos indícios recolhidos pela investigação, imputar-lhe pelo menos as suspeitas de um crime de homicídio com dolo eventual. Só assim a mãe de Madeleine poderia ser presente a primeiro interrogatório judicial, de forma a que o juiz de instrução lhe aplicasse medidas de coacção, além do Termo de Identidade e Residência.

Durante o dia de quinta-feira tudo mudou. O procurador, que começou por admitir a detenção fora do flagrante delito, entendeu então só haver indícios de homicídio negligente e ocultação de cadáver, sendo que nenhum destes crimes admite a aplicação da prisão preventiva e inviabiliza a apresentação a juízo.

TRATAMENTO VIP PARA OS MCCANN

Kate aperta o casaco amarelo, solta o cinto à pressa e pega na filha. Corre para casa com um rosto fechado que já não aguenta as câmaras. É a imagem do dia, fotógrafos nos escadotes, câmaras em guindastes, dois helicópteros no ar logo ao final da manhã. Está cercada a ‘Orchard House’ e os polícias fardados à procura de ordem ao portão dos McCann.

Quatro meses depois o regresso a casa, um regresso a quatro. Gerry passou por Rothley emdigressãopelo Mundo mas, para Kate, era ontem a primeira vez, sem Madeleine e agora suspeita pela morte da filha. Duas carrinhas deixam o Aeroporto de Midland East, perto de Leicester, em saída VIP e cruzam o portão de casa pelas 13h15. A família à frente e os assessores atrás. O tio Brian está lá para os receber e Kate passa directa ao andar de cima, evita os brinquedos junto à janela do primeiro quarto à esquerda. Gerry segue atrás com Brian ao colo, volta depois a buscar as malas e ignora as câmaras.

AGITAÇÃO NA PRAIA DA LUZ

Antes disso, na Praia da Luz, a agitação era grande. Durante toda a madrugada, esperava-se que o casal McCann abandonasse o apartamento alugado na Rua das Flores para seguir viagem ao volante da Renault Scenic em direcção ao Aeroporto de Faro. Assim que os ponteiros marcaram as 6h00, a GNR ofereceu-lhes um tratamento VIP.

O acesso à vivenda Vista do Mar foi vedado pela GNRaos jornalistas e curiosos que ali aguardavam a saída dos mais recentes arguidos do caso Maddie. Eram 06h20 e ainda faltavam três horas para embarcarem no voo 6552 da Easyjet.

Quinze minutos depois, alguns familiares dos McCann arrumaram as malas no porta-bagagens do carro alugado onde a PJ encontrou vestígios de sangue. O n.º 27 da Rua das Flores estava prestes a ser abandonado e minutos depois chegou ao local um táxi: um Audi A3 que depressa iniciou as manobras de saída. O porta-voz, David Hughes chegou ao local para se juntar à família, depois de a colega Justine McGuiness ter garantido horas antes que o casal não deixaria o Algarve.

Um elemento da GNR dirigiu-se entretanto aos jornalistas para transmitir um recado. Transformado em assessor de imprensa do casal disse que os arguidos só iriam fazer uma declaração pública quando chegassem ao aeroporto.

Às 07h05, Kate, Gerry, os assessores e familiares ocuparam as três viaturas e deixaram a aldeia de onde Maddie desapareceu no dia 3 de Maio. Seguidos pela comunicação social, chegam ao aeroporto quarenta minutos depois entrando pelo acesso VIP, usualmente utilizado por embaixadores e diplomatas. A prometida declaração não foi feita e os McCann deixaram Portugal às 09h45 sem passarem pelo check-in.

DISCRIÇÃO NA PREPARAÇÃO DE VIAGEM

Ao longo do dia de sexta-feira, Kate e Gerry e seus familiares permaneceram dentro de casa, sem levantar suspeitas de que se estavam a preparar para ir embora na madrugada seguinte. Sem alarido passaram a ideia que estavam apenas recolhidos

PORTA-VOZ DO CASAL NÃO FEZ COMENTÁRIOS

O britânico David Hughes, um dos assessores de imprensa do casal McCann recusou falar à imprensa quando chegou a casa de Kate e Gerry. Não disse uma única palavra aos jornalistas.

JUSTICE MCGUINESS MENTIU À DESCARADA

Ao início da manhã de sexta-feira, Justice McGuiness afirmou ao CM desconhecer quando os McCann iam viajar. Afinal os lugares no vôo estavam marcados há mais de uma semana.

"CLARO QUE EM PORTUGAL HÁ QUEM PENSE QUE FUGIRAM"

Não era a imagem que queriam deixar mas foi a que ficou. “Claro que em Portugal há quem pense que eles fugiram”, reconhece o tio de Kate. Mas “só o fizeram pelos dois gémeos”, quatro meses depois do crime, na semana em que passam a suspeitos de matar e esconder o corpo da filha.

E se forem chamados de volta, “logo se vê”. Certo é que “eles estão felizes e é óptimo tê-los de volta” a Rothley, diz Brian Kennedy. Só não voltam os cinco, como queria a mãe há uma semana. Mas, “ao que se sabe, as buscas por Madeleine continuam”.

Brian chegou pelas 12h45 à ‘Orchard House’ e preparou a chegada dos sobrinhos. “É muito difícil para a Kate que nunca mais voltou a casa. São momentos de grande emoção e só está a fazê-lo pelos filhos”, garante. O casal chegou meia-hora depois e não disse uma palavra, mas já em Inglaterra estão “calmos e felizes”. Até porque “não estão acusados de nada e a polícia não fez objecções”. De qualquer forma a família agradece o apoio de todos, tem falado com muita gente e “as pessoas sabem que são suspeitas patéticas”.

À hora de almoço os McCann estavam já “muito cansados”. O tio fala em silêncio para os próximos dias. E despediu-se ontem com um “muito obrigado a todos” à imprensa britânica, “pela forma como os têm tratado”.

VIZINHOS MOSTRAM-SE INDIFERENTES COM CASAL

Dois miúdos cruzam os carros de satélite de bicicleta e seguem caminho por entre os polícias. O espectáculo de Portimão não chega à cinzenta vila de Rothley. E os assobios à porta da Judiciária muito menos. Ali chega o casal mais mediático da Europa, jornais, BBC e Sky correm atrás e os vizinhos agradecem. Assistem pela televisão ou deixam para ler com calma no dia a seguir.

“Vocês vivem mais estas coisas, têm o coração ao pé da boca. São latinos”, comenta Constance à saída da mercearia. Em 72 anos já viu de tudo “mas nunca uma mãe matar a filha, esconder o corpo e correr a chorar ao Papa. Seria o pior dos crimes, que tipo de gente faz isso?”

“Até ver” os vizinhos estão com os McCann. Eram desconhecidos na vila mas “um crime destes, em família, é mau de mais”. Nada quebra o recato de um domingo em Rothley, talvez pelo mundial de râguebi umas, várias, canecas ao balcão do pub The Royal Oak. Já não estranham jornalistas mas pouco se misturam, não entendem centenas de curiosos no Algarve para uma chegada ou partida do casal. “Culturas”, reconhece John Simmon, um inglês de meia idade e todo tatuado pelo corpo.

Em dia de missa e reflexão Susan reza “pelo regresso ou pela alma de Maddie, uma inocente no meio de tudo isto”. E a vida segue no centro da vila como a 300 metros dali, na rua de quatro vivendas onde ninguém se chega à janela. Os McCann recolhem, os fotógrafos só esperam uma aberta para obter a melhor imagem e, durante a tarde, Phil rega com calma o jardim do lado. Mal os conhece e não quer saber.

LUZ DUVIDA DA CULPA DOS PAIS

Ester está sentada à porta da igreja antes de começar a missa. Os seus quase oitenta anos sintetizam a opinião reinante na aldeia da Luz. “Custa-me acreditar que os pais tenham alguma coisa a ver com o desaparecimento da menina. Mas se houve algum acidente deviam dizer a verdade.”

Kate e Gerry McCann abandonaram a Praia da Luz no dia em que a comunidade celebrou a sua padroeira com missa ao ar livre e procissão. “Deviam ter vindo aqui agradecer a esta comunidade que tanto os apoiou”, refere outra paroquiana. Inês não acredita na culpa dos McCann e é da opinião que “fizeram bem em ir embora por causa da pressão mediática”. Ester acrescenta: “Não foi uma fuga. Fizeram-no com o acordo da Polícia.”

Percebe-se que a comunidade se envolveu profundamente nos últimos quatro meses e tem agora dificuldades em acreditar que pode ter sido enganada. Ao lado de Inês, Lisdália comentava: “Se foram eles eu deixo de acreditar nas pessoas, seja o Bispo ou mesmo o Papa.”

CASO MADDIE É NOTÍCIA MAIS LIDA NO MUNDO

A reviravolta no caso Maddie, com os pais da menina inglesa a transformarem-se de vítimas em suspeitos. E, a partida imediata do casal McCann para o Reino Unido dominou nos últimos dias as notícias mais vistas nas páginas das edições on-line a nível mundial. Para além do Reino Unido (país de origem dos pais e da criança que terá sido alvo de um crime) e de Portugal (país onde ocorreu o desaparecimento), o caso Maddie despertou o interesse de milhões de leitores como o prova o motor de busca Yahoo. Nas versões francesa, norte-americana, canadiana, alemã, espanhola ou italiana o desenrolar da investigação policial reúne o maior número de buscas.

Em Espanha, as edições da internet dos dois jornais mais lidos, o ‘El Mundo’ e o ‘El País’, davam ontem o maior destaque ao Caso Maddie.

O ‘El País’ destacava a perda de confiança gradual dos britânicos no casal que criou a maior campanha alguma vez vista em torno de uma criança desaparecida. A causa para o crescer das dúvidas dos britânicos está directamente relacionada com as certezas sobre o ADN da pequena Maddie que foram obtidas nos resultados produzidos pelo laboratório inglês de Birmingham, com base em dados recolhidos no Algarve.

Mesmo o ‘The Sun’, jornal que não se tem poupado a críticas quanto ao trabalho de investigação da Polícia Judiciária, surge agora com uma postura mais moderada, sublinhando a confiança nos testes, descontadas algumas cautelas.

A imprensa britânica continua a criticar bastante o trabalho da Polícia Judiciária. A exemplo, ontem o ‘This is London’ noticiava como um absurdo a polícia ter mantido o carro onde foram obtidas provas determinantes nas mãos dos McCann até ao dia em que partiram para o Reino Unido. Contudo, “surgem também notícias que começam a abrir portas à possibilidade de que a polícia portuguesa tem razão e a pequena Maddie pode ter sido vítima de um acidente fatal”, escrevia ontem o ‘El País’.

Num artigo no ‘The Daily Mail’, um seu jornalista levantava essa hipótese, numa notícia encabeçada pela pergunta a que Kate não respondeu: “Por que havia sangue de Maddie no carro?”

PERGUNTAS SEM RESPOSTAS

A chegada emotiva dos McCann ao Reino Unido coincide com as primeiras notícias que lançam dúvidas sobre se o casal não foi apenas responsável pelos filhos ficarem sozinhos como também pelo desaparecimento de Maddie. O ‘ The Times’ recorda a última noite em que Maddie foi vista e coloca uma série de suspeitas para as quais não há resposta. Na mesma linha escrevem também o’ The Guardian’ e o ‘The People’.

"A polícia portuguesa está a ver o orçamento a acabar para esta investigação e quer, por isso, terminar." Kate McCann, ‘Sunday Mirror’

"Basicamente eles disseram-me se eu confessar que Madeleine teve um acidente e eu em pânico escondi o corpo numa mala durante um mês para depois livrar-me dele no carro teria dois a três anos de cadeia com pena suspensa." Kate McCann, ‘Sunday Mirror’

"Uma das peças de evidência de crime é uma página amarrotada da minha Bíblia com uma passagem em Samuel sobre uma criança morta." Kate McCann, ‘Sunday Mirror’

"Sinto-me numa posição muito vulnerável. Nunca tivemos nada a apontar até agora... Mas nós não matámos a nossa filha. Nunca pensei que isto acontecesse." Gerry McCann, ‘News of the World’

"Um sistema judicial que não conheces e no qual não acreditas é terrivelmente assustador." Gerry McCann, ‘News of the World’

"Agora estamos a lutar pelas nossas vidas." Gerry McCann, ‘News of the World’

O CASO NA IMPRENSA BRITÂNICA

'THE SUNDAY TIMES'

Pai de Madeleine não respondeu a 40 perguntas que lhe foram colocadas pela PJ, em Portimão.

BBC

“É assustador responder perante um sistema judicial que não conhecemos”, disse Gerry McCann.

'THE PEOPLE'

A polícia inglesa esteve nas instalações da PJ a ouvir o interrogatório sem conhecimento dos pais.

'PRESS ASSOCIATION'

O casal McCann realizou um regresso emotivo ao Reino Unido trazendo com eles um rasto de suspeita.

'DAILY MAIL'

McCann lançaram uma campanha em busca da filha, mas amigos de férias permaneceram calados.

SKY NEWS

“Que aconteceu a Maddie?” interroga o canal de televisão noticiando que recaem suspeitas sobre casal.

'THE SUN'

Jornal destaca que testes do caso Maddie foram feitos no Reino Unido e sublinha limites destes.

PGR E ADVOGADO DOS MCCANN ENCONTRARAM-SE

O procurador-geral da República e o advogado da família McCann, Carlos Pinto de Abreu, encontraram-se antes do interrogatório do casal, na Polícia Judiciária de Portimão. O encontro ocorreu numa altura em que Pinto de Abreu já era advogado da família inglesa mas o seu conteúdo permanece desconhecido.

Confrontado pelo CM com o encontro, o advogado escudou-se numa única declaração: “O estatuto da Ordem dos Advogados impede-me de revelar o conteúdo dos meus encontros profissionais”.

Do lado do procurador-geral da República não foi possível obter qualquer comentário. Os vários contactos feitos ao longo do dia pelo CM revelaram-se infrutíferos.

Este episódio causou profundo desagrado nos meios policiais ligados à investigação. Desde logo porque, ao longo dos contactos pessoais e telefónicos mantidos pelos investigadores com o procurador que tem o caso, Magalhães e Menezes, ficou claro para a PJ que este tencionaria efectuar a detenção do casal para os apresentar a um juiz. Teria em vista a aplicação de uma medida de coacção que poderia passar pela proposta de prisão preventiva e a mudança de atitude do magistrado ao longo dia deixou todos desagradados.

Além disso, para os investigadores era claro que a constituição de arguido poderia fazer com que os McCann abandonassem o país. E embora não seja provável que “desapareçam” é conhecida a falta de colaboração judicial das autoridades inglesas. Que começa no facto de não terem assinado o acordo de Shengen e não extraditarem cidadãos nacionais.

ATENÇÃO GOVERNAMENTAL

O CM sabe ainda que este caso tem merecido particular atenção ao mais alto nível do sistema judicial, mas nas últimas semanas o silêncio dos responsáveis tem sido a palavra de ordem.

O ministro da Justiça tem sido informado a par e passo de todas as evoluções mais recentes do caso, pela direcção-nacional da Polícia Judiciária. E no Governo ninguém esconde a delicadeza do processo, dado o envolvimento do governo inglês no caso e, em particular, do gabinete do próprio primeiro-ministro Gordon Brown. Em vários momentos ocorreram abordagens ao governo português por parte do embaixador britânico em Lisboa, para além dos contactos informais ao nível de governos.

Os mais recentes desenvolvimentos provocaram também uma “situação complexa”, nas palavras de um membro do governo português, dadas as implicações para a imagem de Portugal que o caso está a ter em Inglaterra.

Mesmo assim, o Executivo de Sócrates não tenciona responder às críticas da comunicação social e da opinião pública inglesas mas, no entanto, entende que Pinto Monteiro já deveria ter vindo a público dizer que Portugal é um país “onde se cumpre a legalidade”, conforme disse uma das fontes contactadas pelo CM. O que é justificado pela separação de poderes e para evitar a ideia de que há ingerência do Governo em matérias da PJ.

JUIZ PODIA RETER PASSAPORTE

Só o juiz de instrução podia reter o passaporte dos McCann, evitando que aqueles regressassem ao seu país. A decisão teria de ser pedida pelo Ministério Público de Portimão, se o procurador entendesse haver indícios de um crime que admitisse uma pena superior a três anos de cadeia. Não foi o que aconteceu e Gerry e Kate foram indiciados por homicídio negligente.

O SILÊNCIO DO PROCURADOR

A primeira e única declaração prestada publicamente pelo procurador-geral da República (PGR), Pinto Monteiro, sobre o caso Maddie data de 15 de Maio, à margem de um seminário sobre corrupção e após solicitação dos jornalistas. “Todos os órgãos de polícia criminal têm actuado muito bem. Todas as pistas são seguidas tal como todas as ligações”, afirmou o PGR que, desde então, salvo uma ou outra declaração pontual a jornais, tem estado em silêncio.

Os últimos desenvolvimentos do caso, com o casal McCann a ser constituído arguido, não mereceram qualquer comunicação oficial por parte do Ministério Público. Nem o engrossar das críticas dos ingleses teve qualquer resposta das autoridades portuguesas. A defesa ficou a cargo do ministro britânico dos Negócios Estrangeiros.

FIM DA INFORMAÇÃO OFICIAL

Apesar dos últimos desenvolvimentos no caso Maddie, a PJ não divulgou qualquer informação oficial para dar conta dos mesmos. As conferências de imprensa, que tiveram como porta-voz o inspector Olegário de Sousa, ficaram-se pelo mês de Junho quando ainda só se falava na tese de rapto.

Tal como o PGR, também o director nacional da PJ pouco se pronunciou sobre o caso, com excepção do dia 15 de Maio – quando remeteu para mais tarde uma resposta às críticas dos ingleses à polícia portuguesa – e na semana passada, em entrevista à SIC – quando confirmou ter sido recolhido ADN de algumas pessoas. De resto, Alípio Ribeiro falou para os jornais ingleses e espanhóis e, a 18 de Agosto, disse mesmo que a solução para o caso estava a “horas” de ser encontrada.

POLÍCIAS PORTUGUESES NAS MÃOS DOS INGLESES

Com o casal McCann em Inglaterra, as diligências decididas pelas autoridades portuguesas que envolvam os pais de Maddie, considerados suspeitos no desaparecimento da filha, passam a depender também da concordância das autoridades inglesas.

Se a Polícia Judiciária (PJ) quiser voltar a chamar Kate e Gerry a Portugal para novo interrogatório, a notificação terá de ser aceite e executada pela polícia inglesa. Já no caso de a própria PJ pretender deslocar-se ao Reino Unido para interrogar o casal em solo britânico, então o pedido terá de ser feito através de carta rogatória – um pedido de auxílio judiciário a uma autoridade estrangeira –, diligência que pode demorar bastante tempo.

A aplicação da medida de coacção mais leve prevista na lei a cidadãos estrangeiros não é inédita em Portugal. Aliás, neste caso, e uma vez que Kate e Gerry não foram presentes a juiz, nenhuma outra medida complementar ou mais gravosa poderia ser determinada. No entanto, e tratando-se de cidadãos naturais de Inglaterra, país pouco dado a colaboração internacional ao nível da justiça, que recusa extraditar cidadãos nacionais, alguns juristas contactados pelo CM estranham o rumo do processo e acreditam que tenha havido uma espécie de “pré-compromisso” assumido pelos McCann para se apresentarem sempre que seja solicitada a sua presença. Caso contrário, mesmo que Kate e Gerry desrespeitem uma chamada das autoridades portuguesas, pouco se poderá fazer, uma vez que os crimes que podem estar em causa – homicídio negligente e ocultação de cadáver – não permitem a aplicação de prisão preventiva.

De regresso a Inglaterra e à sua morada oficial, Kate e Gerry McCann só terão de dar justificações às autoridades se abandonarem a sua residência por um período superior a cinco dias.

PERGUNTAS E RESPOSTAS

- Uma vez constituídos arguidos, Kate e Gerry podiam ter saído de Portugal e regressar a Inglaterra?

- Sim. O casal está com Termo de Identidade e Residência, o que os obriga apenas a estar contactáveis na sua morada oficial.

- Quanto tempo permaneceu a família McCann em Portugal?

- Kate e Gerry McCann chegaram a Portugal a 30 de Abril para uma semana de férias, mas acabaram por ficar quatro meses.

- Quando desapareceu Madeleine McCann da Praia da Luz, no Algarve?

- A criança, que completou quatro anos a 12 de Maio, desapareceu na noite do dia 3 desse mês de um apartamento do Ocean Club.

- Quem são os suspeitos de envolvimento no desaparecimento de Madeleine McCann?

- Oficialmente há três arguidos: além dos pais de Maddie, Robert Murat, um britânico de 32 anos, foi o primeiro a ser constituído arguido a 15 de Maio.

- Que provas tem a Polícia Judiciária contra Kate e Gerry McCann?

- Foi encontrado sangue num carro que foi usado pelo casal e detectados odores de cadáver nas roupas de Kate.

- Qual é a principal pista das autoridades para o desaparecimento de Maddie?

- A PJ acredita que a menina tenha sido morta e os seu cadáver ocultado, mas os pais rejeitam esta acusação e mantêm que Maddie foi raptada e está viva.

LIGOU PRIMEIRO PARA A SKY NEWS

Os registos telefónicos analisados pela Polícia Judiciária dão conta de que Kate telefonou primeiro para a Sky News e só depois para a GNR, dando conta do desaparecimento da filha.

JANELA DO QUARTO ESTAVA INTACTA

A janela do quarto onde Maddie dormia estava intacta. Kate chegou a dizer nas primeiras entrevistas que teria sido destrancada, mas não foram recolhido indícios nesse sentido.

KATE REVELA TER VIVIDO PESADELO

Mãe de Maddie revelou ao ‘Sunday Mirror’ ter vivido um pesadelo enquanto foi interrogada, ter temido pela liberdade e sentir-se impotente.

FORTUNAS PARA SEGUIR VIAGEM

Jornalistas ingleses pagaram mais de 5000 euros por lugar aos passageiros do voo onde seguiam os McCann. Queriam acompanhá-los.

PAIS FALARAM EM MORTE

Foram os McCann os primeiros a admitir à Polícia Judiciária que a criança poderia estar morta. E contrataram um professor sul-africano para procurar o cadáver.

NÃO SAIR SEM MADELEINE

Durante meses, os pais de Maddie garantiram que nunca deixariam a Luz sem saberem o que aconteceu à filha. Diziam recusar-se a regressar com a família reduzida.

CAMPANHA DE MARKETING

Gerry e Kate McCann contaram com o apoio da imprensa inglesa para montarem a sua gigantesca campanha de marketing. Sky News liderou o processo.

DISSERAM QUE IAM EMBORA

A família de Madeleine só começou a admitir abandonar Portugal após as buscas feitas no apartamento com auxílio dos cães ingleses.

PAIS DE KATE DÃO ALERTA

Assim que Kate e Gerry se preparavam para ir para Inglaterra, a mãe de Kate avisou, por telefone, as estações CNN e Sky News.

MADRUGADA CONCORRIDA

O número de jornalistas ia crescendo à porta dos McCann à medida que as hora de saírem para o aeroporto chegava.

JORNALISTAS DE VIGIA

Dezenas de jornalistas ficaram à porta dos McCann à espera que saíssem. Para ficar de vigia passaram a noite acordados.

BILHETES ESGOTADOS

Apesar de o Aeroporto de Faro ser secundário, ontem às 01h00 já não havia bilhetes para seguir a bordo com os McCann.

CONFERÊNCIA ADIADA

Esteve marcada uma conferência de imprensa na Luz antes dos pais de Maddie deixarem a casa. Nunca chegou a acontecer.

ROMARIA ATÉ FARO

Os carros da imprensa seguiram, de perto e aparatosamente, o veículo dos McCann até à entrada do aeroporto de Faro.

SIC SEGUE CASAL DE MOTA

Ao jeito dos paparazzi, a SIC acompanhou a viagem de carro de Kate e Gerry, usando uma mota para não os perder de vista.

COLEGAS ESPERAM GERRY

No Glenfield Hospital, os colegas aguardam ansiosos pelo regresso de Gerry, que está com licença sem vencimento.

LOCAIS INSISTEM EM RAPTO

As pessoas que moram perto dos McCann continuam a acreditar na inocência do casal e na tese de que Maddie foi raptada.

SUSPEITAS DESPREZADAS

Um homem passa apressado pisando um jornal regional cuja manchete é: “Acusados.” As suspeitas encaradas com desprezo.

IGREJA A 100 METROS

A igreja local fica a pouco mais de 100 metros da casa dos McCann. O casal deverá amanhã sair para rezar por Maddie.

JORNALISTAS AFASTADOS

Ontem à noite a polícia vedou a frente da casa dos McCann para afastar a presença dos jornalistas. Dois polícias fazem vigia.

TV NO CENTRO DA VILA

As estações de televisão, entre outras, alemãs e norueguesas fazem constantes directos a partir do centro da vila de Rothley.

O MISTÉRIO DO CRIME

Hoje, ‘O Mistério de Maddie’ é o tema do programa ‘Prós e Contras’ de Fátima Campos Ferreira, na RTP 1.

ADVOGADOS INGLESES

McCann consultaram os advogados Kingsley Napley, e Michael Caplan QC and Angus McBride sobre o regresso a Inglaterra.

RESIDÊNCIA INGLESA

McCann forneceram morada inglesa à PJ para lhes ser aplicado o TIR. Morada para onde serão enviadas todas as notificações.

ALVO DE DUAS ACUSAÇÕES

Sendo suspeitos de homicídio por negligência e de ocultação de cadáver, Kate e Gerry não podiam ter ficado em preventiva.

CRIMES PODEM AGRAVAR-SE

Os crimes de que são acusados podem agravar-se para dolo eventual. Como médicos têm consciência das consequências dos actos praticados.

MURAT CONTINUA ARGUIDO

Robert Murat, sobre quem recai a suspeita de estar envolvido no desaparecimento da criança, continua a ser arguido no caso.

NOTIFICAÇÕES VÁLIDAS

Carlos Pinto de Abreu, advogado dos McCann em Portugal, garante que futuras notificações são válidas em solo britânico.

O QUE É O DOLO EVENTUAL

O dolo eventual é o facto de uma pessoa poder prever a morte e conformar-se com o resultado de forma consciente.

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