Prosa: Nunca gostei de cemitérios

Com os olhos meio abertos e meio fechados, peguei no telemóvel, eram 5h30 da manhã.

28 de abril de 2015 às 17:00
geração arte, prosa
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Com os olhos meio abertos e meio fechados, peguei no telemóvel, eram 5h30 da manhã.

- Porra, ainda é tão cedo!

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Olhei para o lado e ainda não tinhas chegado a casa - pensando bem, nestes últimos quatro anos, nunca te vi chegar - levantei-me, tomei banho, vesti-me, fui à cozinha e abri o frigorífico… não tinha nada para comer! Vês, como tudo fica vazio sem ti?! E agora? Estava tudo fechado, cafés, supermercados, tudo! Sentei-me no sofá a ler as tuas cartas e, só para passar o tempo, rasgava as nossas fotos e colava-as só para voltar a rasgá-las. Não sei, não sei porque passado tanto tempo ainda te amo, depois de tudo.

Eram 9h00 da manhã, peguei nas chaves, fui às compras, sabes, aquele bolo de chocolate que tu tanto adoravas comer ao meu lado?! Decidi comprá-lo para ti. Passei pela florista e pedi o ramo de rosas mais belo que ela tinha e, com um sorriso enorme nos lábios como quem queria saber tudo, pergunta-me:

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- É para alguém especial?

E eu respondo:

- É sim, é sim.

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Nisto, ela pega num frasquinho, perfuma todas as rosas do ramo e deseja-me boa sorte. Será que ela pensava que as flores eram um pedido de desculpas?! Não sei, não sei porque é que toda a gente acha que a culpa é minha quando foste tu que erraste!

Fui-me embora como se não soubesse onde ir, como se os meus pés se movessem sozinhos e o meu corpo fosse guiado por outro alguém. E eu, com as compras na mão e um ramo atrás das costas, andando sem saber para onde ir.

Espera, eu reconheço este lugar, vínhamos para aqui no Verão, lembras-te? Abri a porta, pousei as compras no balcão da cozinha e preparei o pequeno-almoço, o teu preferido: o bolo de chocolate e o sumo de pêssego.

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Fui ao nosso quarto, estavas deitada. E passados quatro anos, estavas linda como sempre. Pousei o tabuleiro e o ramo de rosas na cama e deitei-me ao teu lado, li todas as nossas cartas, todas aquelas que trocávamos quando a distância nos separava. Passei a mão no teu rosto, estavas branca, senti um arrepio, estavas tão gelada. E aquele vestido branco, hoje estava vermelho, como a cor do sangue. Eu sei, eu sei, a florista tinha razão, as flores eram um pedido de desculpa, por não ter aguentado e ter apertado o gatilho, disseste que estavas melhor morta do que comigo, eu fiz-te a vontade. Lembras-te? Prometi-te que, se um dia tudo acabasse, podias ficar aqui a morar? Vês, eu cumpri a promessa, estás melhor aqui. No fundo, também nunca gostei de cemitérios.

Texto enviado pela participante Andreia Filipa Dominges Paiva, 22 anos, de Rio de Mouro.

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