Prosa: Um velho banco
Em busca de algo sobre o qual escrever, sentou-se num velhinho mas não caduco banco, verde, que ali se acostumara a acolher, serenamente enquanto escutava a estranha e intrigante melodia do silêncio, as pinhas que ao céu repugnavam.
Votação fechada. Vê os resultados na fanzine publicada com o Correio da Manhã de dia 25 de junho. Entretanto, recordamos que o concurso é mensal e contamos com os teus trabalhos (vê aqui o
Votação fechada. Vê os resultados na fanzine publicada com o Correio da Manhã de dia 25 de junho. Entretanto, recordamos que o concurso é mensal e contamos com os teus trabalhos (vê aqui o regulamento).----------
Em busca de algo sobre o qual escrever, sentou-se num velhinho mas não caduco banco, verde, que ali se acostumara a acolher, serenamente enquanto escutava a estranha e intrigante melodia do silêncio, as pinhas que ao céu repugnavam. Como se as palavras que pretendia apanhar transpirassem na viscosa e inexorável resina que tão denso arvoredo não pudera evitar. Não obstante, ali, daquele banco comido pelo tempo, seria capaz de jurar que do lado de lá da húmida folhagem, um manto negro persistia, brutal, feroz, impiedoso. Olhou as antiquadas traves férreas em que se achava apoiado. Cobertas pela ancestral ramagem, julgou ver, por um instante que à eternidade nada deveu, voluptuosas raízes que rasgando a terra molhada, ao banco se haviam imiscuído. Neste momento, como que sendo atingido pelo pior do existir, um ataque de lucidez dele se apoderou. Era tamanha a clarividência que seus funestos efeitos não se furtaram à aparição: uma eloquente conclusão. Oh! As traiçoeiras conclusões! Como todas e nenhumas, deste mundo só a volatilidade aprendeu. E mesmo esta teimam em renegar. Que sapiência mais ignóbil… De pena empunhada, neste pérfido de tão sagaz momento, acreditou que sua busca tinha no destino do inglorioso, hora marcada: toda a sua demanda havia sido em vão. As palavras, apetecíveis de tão simples, nunca haviam ali permanecido, em tão inóspito lugar, às coisas abraçadas. Semicerrou os olhos na esperança de ver brotar palavras no lugar das rasteiras ervas daninhas…Mas que diferença, se o houvesse podido ver com seus próprios olhos, encontraria entre elas? Sugado até às entranhas por tão insaciável perspicácia, não o havia podido perceber… Esgotado e rendido, fechou, por fim, as pálpebras dirigindo os olhos para a obscuridade. Como se as coisas só existissem quando as vemos diante nós… Angustiadamente, degladiava-se interiormente. Insistiu. Adormeceu. Agora, havia podido, enfim, sentir as tórridas labaredas que o dragão a ele lhe projectava desmedidamente. As palavras…essas, haviam caído no esquecimento. Diga-se, em jeito de suspeição, que por ora de nada serviriam: a lucidez desvanecera-se. Viveu.
Trabalho enviado pelo participante José Maria de Carvalho, de 24 anos, de Algés.
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