Posições públicas do Papa têm sido criticadas por movimentos de extrema-direita, que acusam a Igreja de estar a virar à esquerda.
O esforço da Igreja Católica na defesa dos imigrantes e dos mais pobres ou na condenação do capitalismo selvagem é saudado por católicos de esquerda, enquanto os mais conservadores salientam que esse discurso sempre existiu.
Os católicos Paulo Rangel (PSD) e José Manuel Pureza (BE) são exemplo de dois olhares distintos sobre a defesa da Doutrina Social da Igreja, com o primeiro a destacar a continuidade do discurso e o segundo a saudar o "discurso mais claramente condenatório" do capitalismo e da desumanização dos mais pobres, com destaque para os imigrantes.
Dias antes da primeira viagem apostólica à Turquia e ao Líbano, que tem início na quinta-feira, Leão XIV pediu aos bispos norte-americanos que condenassem a violência contra os imigrantes nos EUA.
Este tipo de posições públicas tem sido criticado por vários movimentos de extrema-direita, que acusam a Igreja de estar progressivamente a virar à esquerda.
"Na verdade, há uma grande constância na doutrina" e "vai sempre haver grupos que vão procurar reivindicar, apropriar-se das coisas e procurar dizer qual é a linha" que deve ser seguida pelo Vaticano, afirmou à Lusa Paulo Rangel, também professor na Universidade Católica e atual ministro dos Negócios Estrangeiros.
O também docente universitário José Manuel Pureza discorda e insiste que, "com o Papa Francisco, a Igreja passou a ter um discurso muito mais claramente condenatório do capitalismo liberal, nas suas diversas manifestações, e da agressividade de uma extrema-direita racista, xenófoba, anti-imigrantes pobres, porque a extrema-direita não é contra os imigrantes, é contra os imigrantes pobres".
"O foco do discurso político hegemónico virou claramente à direita um pouco por toda a parte" e o discurso da Igreja "choca com isso, em muitos casos", perante a "agressividade que existe contra os mais pobres, imigrantes e pessoas racializadas", considerou José Manuel Pureza.
Para Paulo Rangel, a Igreja tem tido "um discurso constante", recordando que Leão XIII, cujo nome inspirou o atual Papa, já havia condenado o "capitalismo e liberalismos selvagens, mas também o marxismo-leninismo e a recusa completa da visão que tinham Marx e Engels e todos os seus seguidores".
Depois, no Concílio Vaticano II, na década de 1960, a hierarquia definiu o seu "lugar no espaço político" e qual a obrigação social dos católicos, além de condensar todos os princípios da Doutrina Social da Igreja.
"Essa doutrina social, julgo, não é sequer a que leva hoje a uma certa tensão entre progressistas e conservadores, especialmente alguns extremamente progressistas ou extremamente conservadores dentro do quadro católico", considerou o ministro, salientando que o que está em causa, nessa divisão, "é a doutrina moral ou muitas vezes litúrgica" interna.
Por isso, a posição do Papa sobre os imigrantes, defendeu, não é uma crítica contra as políticas públicas, mas sim contra a violência sobre as pessoas e a defesa do "tratamento de todas as pessoas humanas com humanidade, um dado indiscutível da doutrina da Igreja e de qualquer humanista".
No plano económico, a Igreja tem-se mantido equidistante, defendeu Paulo Rangel, recordando que João Paulo II condenou o capitalismo, na década de 1980, mesmo quando era aliado de Reagan e Thatcher no "combate à ditadura comunista", algo que os "irritava muito".
João Paulo II "nunca deixou de condenar o comunismo sem condenar o capitalismo no sentido selvagem do termo", disse Rangel, recordando que, "ao contrário do que se pensa, a doutrina é muito constante", no pós-concílio Vaticano II, apesar de "cada Papa ter o seu estilo".
José Manuel Pureza não vê que exista uma distância tão grande entre marxismo e catolicismo: "Esta economia mata, diz Francisco. E estava a referir-se ao capitalismo".
"Já dizia o Papa Francisco, em 2014, que é preciso que juntemos forças para evitar a desumanização das nossas sociedades".
O atual "ultraliberalismo agressivo" exige ao pensamento católico "uma firmeza na defesa de posições", porque a "doutrina social também se foi ajustando à realidade que mudou", disse Pureza, considerando que muitos bispos e sacerdotes foram incorporando na sua prática o discurso dos Papas.
"Mas eu não me iludo: não obstante essa evolução no sentido de uma centralidade nos pobres e nos mais desfavorecidos no discurso da Igreja", continuo a achar que muitos dos bispos e membros do clero e leigos continuam a ter uma posição bastante longe daquilo que, sobretudo, o Papa Francisco introduziu na linguagem e no pensamento da Igreja", acrescentou.
Pureza deixou um desafio aos católicos: "A Igreja ou corre riscos ou não é fiel à sua missão inicial" e uma instituição que "foge do risco de ser vista como revolucionária ou como crítica dos poderes estabelecidos não serve para nada".
No seu entender, perante a "dimensão e a complexidade de muitos dos problemas" da atualidade, que "têm a ver com essa crescente agressividade social e económica muito encostada à direita, com o problema da deterioração da nossa casa comum, por força de um capitalismo predador dos recursos e do clima", se a "Igreja não assume uma voz forte" é "infiel ao mandamento que Jesus deixou com Pedro", considerado o primeiro Papa.
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