Antifascista que nunca caiu nas mãos da PIDE: quem era Camilo Mortágua
Radicado em França até ao derrube da ditadura fascista, nunca cedeu na sua luta pela liberdade e a solidariedade.
A audácia e a capacidade de reflexão distinguiram sempre a ação política e social de Camilo Mortágua, combatente contra a ditadura do Estado Novo, falecido na sexta-feira com 90 anos de idade. Ele foi protagonista de operações espetaculares, como a ocupação do paquete ‘Santa Maria’, o desvio de um avião TAP e o assalto à delegação do Banco de Portugal na Figueira da Foz, mas mesmo condenado à revelia a uma pena de 20 anos de cadeia, nunca esteve nas mãos da polícia política PIDE-DGS.
O antifascista, mais referido como pai das deputadas do Bloco de Esquerda Joana e Mariana Mortágua, nunca cedeu na sua luta pela liberdade e a solidariedade. Natural de Oliveira de Azeméis, emigrou aos 17 anos para a Venezuela, onde começou por ajudar um tio num negócio de padarias. Porém, o seu espírito de reflexão tornou-o animador radiofónico e abriu-lhe contactos com exilados políticos. Esteve com Henrique Galvão, em janeiro de 1961, na ocupação durante 13 dias do paquete ‘Santa Maria’, na primeira operação política na história da navegação.
A missão seguinte foi com Palma Inácio e outros, em 10 de novembro de 1961, na antevéspera de votação para a Assembleia Nacional, quando choveram sobre Lisboa 100 mil folhetos contra o regime, lançados de um avião TAP que fazia a ligação Casablanca-Lisboa. O mesmo grupo assaltou, em 17 de maio de 1967, a agência do Banco de Portugal na Figueira da Foz, numa operação que levou ao aparecimento da LUAR (Liga de Unidade e Ação Revolucionária). Após esta ação, Camilo Mortágua viu-se condenado à revelia, mas a pena acabou anulada após o 25 de Abril por se tratar de um ato de luta política.
Radicado em França até ao derrube da ditadura fascista, empenhou-se depois no desenvolvimento do mundo rural. Liderou a cooperativa Torre Bela, no Ribatejo, e em 1979 foi para Moçambique dinamizar o movimento cooperativo. Regressou em meados dos anos 80 e criou projetos da mesma índole na zona de Alvito, distrito de Beja. A sua mais recente iniciativa concretizou-se com o Fórum Liberdade e Pensamento Crítico que promoveu quatro encontros anuais em Lisboa.
PRESIDÊNCIA LUTA CONTRA DITADURA
Numa nota, Marcelo Rebelo de Sousa recordou Camilo como “lutador contra a ditadura durante muitas décadas do século passado”, que morreu “ao fim de uma longa e multifacetada vida ao serviço dos ideais que abraçava”.
FILHAS REAÇÃO NAS REDES SOCIAIS
Mariana e Joana homenagearam o pai nas redes sociais: “Há nomes tão fortes que a morte só leva emprestado. Camilo Mortágua é um deles”, escreveram. O funeral parte, este sábado, pelas 11h00, da casa mortuária para o cemitério de Alvito.
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