Ex-Presidente da República descreve antigo primeiro-ministro como "teimoso, arrogante, capaz de mentir" em livro polémico.
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Era capaz de fazer tudo, sem olhar a meios para ganhar eleições." A frase é de Cavaco Silva sobre José Sócrates, que diz ser "capaz de mentir". O ex-Presidente não poupa nas palavras para descrever o ex-primeiro-ministro: teimoso, arrogante, exaltado e irascível são apenas alguns exemplos dos adjetivos a que Cavaco recorre para traçar um retrato de Sócrates.
Um ano depois de deixar Belém, Cavaco regista no livro ‘Quinta-feira e Outros Dias’, que ontem lançou no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, as memórias das reuniões com José Sócrates: 188 encontros, alguns muito tensos. Foi o ca- so das reuniões do verão de 2009, em vésperas de legislativas, quando explodiu o caso das escutas a Belém. "O diálogo chegou a azedar e, quando se exaltou ao ponto de subir o tom de voz, interrompi-o e chamei-o à ordem, dizendo que não estava a falar com membros do seu gabinete."
Cavaco fala em "intriga política insidiosa" e da "tenebrosa máquina de propaganda do PS, com o objetivo de minar a credibilidade do Presidente". Quanto à carta que Sócrates escreveu ao presidente do BCE sobre a atualização do PEC, Cavaco conta: "Eu já sabia que as cartas existiam. E era evidente que o primeiro-ministro procurara escondê-las. Como podia confiar nele?"
Sem dúvidas de que Sócrates era capaz de mentir e de ser desleal institucionalmente, o ex-Presidente da República revela ainda que Sócrates era "resistente ao diálogo" e muito sensível ao que a comunicação social dizia, vendo os "críticos como inimigos".
Negócio da PT era para "desconfiar"
Ocaso do negócio da venda da Vivo à Telefónica e a posterior compra da operadora brasileira Oi mereceu um capítulo de seis páginas no livro do ex-Chefe de Estado. Trata-se de um negócio que, segundo Cavaco Silva, "acabou por revelar-se desastroso" e cujos contornos o deixaram desconfiado. O caso não era para menos pois alguns dos factos estão agora em investigação no âmbito da Operação Marquês, em que José Sócrates é o principal arguido.
O ex-Presidente fala também da tentativa de controlo da TVI, em 2009, e revela um estranho pedido do ex-primeiro-ministro para que pusesse fim à comissão parlamentar de inquérito sobre o assunto, o que considerou "absurdo": "Limitei-me a responder: o senhor primeiro-ministro sabe que isso é uma ideia absurda."
Sobre a venda da PT, Cavaco diz que, ao contrário da "satisfação" do ex-primeiro-ministro e do presidente do conselho de administração da PT, Zeinal Bava, o negócio "foi, afinal, a destruição de uma empresa de referência nacional, num processo pleno de interrogações".
Cavaco Silva explica que avisou o ex-primeiro-ministro José Sócrates de que a compra da brasileira Oi era um mau negócio para a PT: "A PT vai pagar cerca de 3500 milhões de euros pela compra de 22% do capital da Oi. Parece-me muito dinheiro para uma empresa que se diz não ter qualidade. E, quanto ao controlo da gestão pela PT, tendo presente experiências portuguesas com algumas empresas brasileiras, há que desconfiar".
O ex-Presidente diz que ficou surpreendido com os avanços e recuos de Sócrates no uso da Golden Share da PT durante a negociação com a Telefónica para a venda da Vivo. E conclui o capítulo escrevendo que "diversos gestores" lhe tinham feito chegar a mensagem de que "nunca antes se tinha verificado tanta interferência do Governo na vida das grandes empresas".
Outra matéria de que Cavaco Silva desconfiava era a relação entre José Sócrates e o então Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, assunto que foi abordado em 18 reuniões com o ex-primeiro-ministro.
Cavaco Silva conta que, em janeiro de 2008, disse a Sócrates "que a comunidade portuguesa era uma boa razão para visitar Caracas, mas recomendava-lhe "cuidado nos negócios com as autoridades venezuelanas". Os negócios em causa tinham que ver com a compra de petróleo por parte da GALP a troco de exportações de produtos portugueses que poderiam atingir um montante de 400 milhões de euros, a venda dos computadores ‘Magalhães’ e a exportação de casas pré-fabricadas. Este último negócio, ainda que não esteja explicitado no livro, envolvia o Grupo Lena. "Quanto mais via o entusiasmo do primeiro-ministro com os negócios das empresas portuguesas com a Venezuela, mais desconfiado eu ficava. Não me enganei", conta o ex-Presidente.
Sobre o novo aeroporto e a defesa da Ota como futura localização, Cavaco concede a si próprio os louros de ter conseguido evitar um desastre para o País. E conta como foram necessários dois anos para convencer Sócrates a deixar este investimento para mais tarde, porque o País atravessava um período difícil. Sócrates argumentava com estudos que demorou meses a entregar ao então Chefe de Estado. E questionava-se porque é que o primeiro-ministro e o ministro da tutela [Mário Lino], teimavam em defender a Ota. "Entendi que a teimosia só se justificaria caso nenhum deles tivesse lido os estudos feitos no passado em que a Ota emergia sempre como uma localização menos aconselhável", escreveu.
Também no TGV houve intervenção de Cavaco. Sempre que o assunto era abordado e o ex-Presidente revelava as suas reticências, José Sócrates "mostrava indícios de irritação que, no entanto, se esforçava por controlar". Também os estudos sobre este projeto demoraram meses a chegar à mesa de Cavaco Silva. "Aquilo que, para mim, era pura teimosia do primeiro-ministro, para ele podia ser convicção ou até sinal de insuficiência de conhecimentos de economia", desabafa o ex-Chefe de Estado.
O acordo entre PS e PSD sobre a reforma da Justiça merece um capítulo inteiro. Cavaco fala do clima de crispação da parte dos magistrados em relação ao Governo de José Sócrates, que tinha anunciado, a 12 de março de 2005, a redução das férias judiciais e, nos dias seguintes, a alteração dos benefícios sociais auferidos pelos magistrados. Para o Presidente da República, as declarações de Sócrates insinuavam que os "juízes trabalhavam pouco e eram uma classe privilegiada". Para Cavaco, as medidas anunciadas mais não foram do que " um conjunto inexplicável de erros políticos". Porém, o ex-Presidente tenta convencer Sócrates de que seria sensato, na matéria da Justiça, existir um consenso alargado. Sócrates diz que as propostas do PSD até vão no bom sentido, mas o ex-Presidente da República não fica convencido. "Pareceu-me muito cioso da sua obra de não querer partilhar créditos e não acreditar nas vantagens do compromisso político."
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