Em causa estão as normas que requerem a transmissão de propriedade por herança "mortis causa".
Duas alterações introduzidas ao Regulamento da Nacionalidade Portuguesa relativas ao regime de naturalização de descendentes de judeus sefarditas padecem de inconstitucionalidades, segundo os pareceres de constitucionalistas pedidos pela Comunidade Israelita de Lisboa (CIL).
De acordo com os pareceres, elaborados pelos constitucionalistas Armindo Saraiva Matias, da Universidade Autónoma de Lisboa, e Ricardo Branco, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, estão em causa as normas que requerem a transmissão de propriedade por herança "mortis causa" e a existência de viagens regulares a Portugal ao longo da vida como condição para preencher os requisitos de naturalização.
"A aquisição, perda e reaquisição da cidadania portuguesa integram a reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República. Não pode, a pretexto da regulamentação da lei, proceder-se à sua alteração por simples decreto-lei, assim se subvertendo e violando a reserva. A lei da nacionalidade pode ser regulamentada por decreto-lei, mas este deve cingir-se, tal como faria um regulamento, à concretização dos seus aspetos técnicos", refere o primeiro parecer.
Por sua vez, o segundo parecer salienta que a alínea d) do número 3 do artigo 24.º-A, onde constam as duas normas, "limita substantivamente a possibilidade de naturalização" dos requerentes, "o que manifestamente não pode fazer, sob pena de inconstitucionalidade orgânica, porquanto a disciplina da nacionalidade e das regras substantivas da sua atribuição compete, em exclusivo e integralmente, à Assembleia da República".
Saraiva Matias diz ainda que o decreto-lei 26/2022 viola o princípio constitucional de proporcionalidade, ao impor a exigência de comprovativo "da titularidade, transmitida 'mortis causa', de direitos reais sobre imóveis sitos em Portugal, de outros direitos pessoais de gozo ou de participações sociais em sociedades comerciais ou cooperativas sediadas em Portugal" e "de deslocações regulares ao longo da vida do requerente a Portugal".
"No plano da regulamentação não pode admitir-se a imposição de exigências que, por excessivas, sejam impossíveis de cumprir, tornando o regime inexequível. Isso colocaria aliás o legislador na cínica posição de prever um regime que, na aparência, corrige uma injustiça histórica, mas que, na prática, por impossibilidade da sua aplicação, deixa tudo na mesma", alega o constitucionalista, rotulando esta situação "uma exigência excessiva e desrazoável".
Ricardo Branco partilha da mesma visão e critica o que diz ser um tratamento diferenciado dos cidadãos estrangeiros apenas por descenderem de judeus sefarditas, ao invocar que não é exigida a prova de viagens anteriores a Portugal nos restantes casos.
"Os princípios da universalidade e da igualdade no direito de aceder à cidadania portuguesa (...) obrigam a que o legislador ordinário, pressuposta a existência dos demais requisitos, não trate diferentemente os cidadãos estrangeiros requerentes da nacionalidade portuguesa por naturalização", argumenta, sem deixar de realçar uma "discriminação em função da ascendência e das origens religiosas".
Os pareceres foram solicitados pela CIL na sequência da publicação do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa no dia 18 de março, em Diário da República, que regulamentou a Lei da Nacionalidade de 2020 e se traduziu em maiores restrições ao acesso à naturalização por parte de pessoas descendentes de judeus sefarditas (que foram expulsos de Portugal por decreto régio há mais de 500 anos).
O processo ficou envolto em polémica após ser revelada no final de 2021 a obtenção da cidadania portuguesa pelo milionário russo Roman Abramovich.
O decreto-lei entrou em vigor no dia 15 de abril, mas o artigo referente à naturalização de descendentes de judeus sefarditas só vai entrar em vigor "no primeiro dia do sexto mês seguinte ao da sua publicação", ou seja, 01 de setembro de 2022.
Entre 2015 e 2021, segundo dados do Instituto dos Registos e Notariado e do Ministério da Justiça enviados à Lusa, Portugal atribuiu a cidadania portuguesa a 56 685 descendentes de judeus sefarditas.
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