Melão é mau negócio

Os campos da lezíria ribatejana deram este ano bom melão – grande e saboroso –, mas os seareiros pouco ganharam com isso. O melão produzido na Espanha é mais barato e quem o semeia em Portugal tem de baixar os preços quando vende aos grandes retalhistas.

08 de agosto de 2005 às 00:00
Melão é mau negócio Foto: Jorge Godinho
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“Não compensa o que se gasta na seara”, avalia Rosália Dias, de 51 anos, produtora presente na 25.ª Feira do Melão de Vila Franca de Xira, que durante o fim-de-semana decorreu no Jardim Constantino Palha.

Que é doce o melão de Rosália Dias ninguém pode negá-lo. “Uma maravilha. Não tem nada a ver com aquele que se compra no supermercado, com sabor a pepino”, conclui António Ramos, de 45 anos, depois de provar uma talhada, decidindo-se a levar cinco melões para casa.

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Mas a decisão está tomada: “Para o ano já não comerão melão da minha seara.” Rosália, seareira desde os 8 anos, vai retirar-se da actividade. “É escusado; a gente apanha vento, chuva, farta-se de trabalhar para ganhar uns míseros euros. Há por aí muito melão da Espanha. Mas lá os agricultores têm subsídios e por isso podem vendê-lo tão barato”, diz.

FUMGICIDA MAIS CARO

Joaquim Paulino, de Alpiarça, dá outro exemplo que ilustra a desvantagem dos seareiros nacionais: “Um produto para o piolho custa lá 49 euros. Sabe quando é que custa o mesmo produto em Portugal? Cento e dez euros! É claro que os espanhóis podem vender o melão mais barato”, observou.

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Joaquim Paulino passou a vida toda a cultivar a terra, justificando: “Estou nisto desde que nasci. Não me ensinaram a fazer mais nada.” Durante 30 anos ocupou-se de um terreno em Vila Franca de Xira. Depois, concentrou a actividade numa propriedade de Alpiarça, com três hectares reservados para o melão.

Tem, aliás, o ‘exclusivo’ de um tipo de melão, que se distingue pela cor da casaca, de um amarelo intenso. “Há mais de 20 anos comprei sementes de Manuel António [melão branco] e misturadas vinham as deste, amarelo vivo. É bom, docinho. Desde então, tenho-o cultivado e também já dei sementes”, conta Joaquim Paulino, sorrindo ante a possibilidade de tal como o produtor Manuel António no passado, vir a dar o nome a um melão.

No Jardim Constantino Palha, estiveram presentes cerca de 20 produtores, que venderam o melão a 50 cêntimos o quilo. “Vim cá no sábado e hoje [ontem] cá estou outra vez para comprar melão ao mesmo senhor que mo vendeu antes. Nas lojas é mais barato, mas não é tão bom”, garantiu um apreciador do fruto.

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APANHÁLO NA HORA CERTA, NEM ANTES NEM DEPOIS

Melões há muitos: ‘Manuel António’, lezíria, lusitano, tendral valenciano tardio, pele de sapo... Todos são bons se tiverem sido apanhados na altura certa.

O lusitano, também branco, mas maior do que o lezíria, tem de ser “apanhado maduro e comido logo”, aconselha o produtor Joaquim Paulino, explicando: “Se for apanhado antes do tempo, não se livra daquele gosto a pepino, nunca chega a ficar maduro.”

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O tendral valenciano é o que se presta melhor a ser guardado. É um melão que pode ser comido por alturas do Natal, muito depois do tempo. “Eu já andava a semeá-lo quando comi o último”, conta Joaquim Paulino. Este ano, por causa da seca, as searas (sementeira do melão) foram antecipadas. Os produtores recearam que o fruto ficasse queimado.

Mesmo assim, e apesar das temperaturas elevadas que se fizeram sentir nos campos da Lezíria, o melão é, este ano, muito saboroso, como atestaram os visitantes da feira que ontem terminou em Vila Franca de Xira. O certame foi organizado pelo pelouro do Turismo da autarquia com o apoio da Associação dos Produtores de Melão de Portugal.

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