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Correio da Manhã

Portugal
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Lobo nazi em liberdade

Espancou um imigrante quando festejava o aniversário do nascimento de Hitler, a 20 de Abril, e guardava fotografias de crianças negras com a frase ‘Por favor não alimentem os animais’. Está acusado de vários crimes mas, terça-feira, o ‘Lobo nazi’, como se apresenta o skinhead Carlos Seabra, vandalizou o cemitério judaico em Lisboa. Foi apanhado pela PSP e o juiz mandou-o ontem à tarde em liberdade.
28 de Setembro de 2007 às 00:00
O skin mais velho, Carlos Seabra, já está acusado num megaprocesso por agressão grave, discriminação racial e posse ilegal de armas
O skin mais velho, Carlos Seabra, já está acusado num megaprocesso por agressão grave, discriminação racial e posse ilegal de armas FOTO: Tiago Sousa Dias
Seabra é quase veterano do movimento neonazi em Portugal, aos 24 anos pertence à Frente Nacional desde a fundação em 2004. E é um militante de armas. Enverga camisolas com a cruz suástica e, em Abril, a Judiciária apanhou-lhe uma espingarda semi-automática, uma granada e dois punhais.
Está acusado num megaprocesso com 240 páginas por discriminação racial, ofensas à integridade física qualificadas e três crimes de posse ilegal de armas proibidas. Vai ter de responder em tribunal entre 36 skinheads acusados, mas, ao contrário do líder Mário Machado, aguarda o julgamento em liberdade.
O ‘Lobo nazi’ recebeu a acusação do Ministério Público (MP) no último dia 15 mas, dez dias depois, na noite de terça-feira, voltou a atacar. Recrutou o iniciado João Dourado, 16 anos, e partiram os dois para o cemitério judaico de Lisboa, na Avenida Afonso III. Saltaram o muro e rasparam vinte campas com objectos contundentes, gravando cruzes suásticas antes de defecarem em dois túmulos. Os prejuízos são de vários milhares de euros.
Um popular ouviu barulho e chamou a PSP às 22h50. Os dois skins acabaram apanhados em flagrante e, enquanto um tinha ‘Morte aos traidores’ tatuado no braço, o outro tinha a frase na camisola.
João também é membro da Frente Nacional, que visa “a guerra racial e acções violentas, pela supremacia da raça branca”, segundo o MP. E para eles não há lugar a “negros, judeus, ciganos ou homossexuais – são inimigos de Portugal”.
O MP pediu a prisão preventiva para os dois skinheads, sobretudo pelo perigo de alarme social, mas o juiz de Instrução Criminal decidiu-se pelas apresentações aos domingos à PSP.
"É LAMENTÁVEL NUM PORTUGAL DEMOCRÁTICO"
A comunidade israelita repudia os actos “de puro racismo e anti-semitismo” no cemitério judaico de Lisboa, segundo a porta-voz Esther Mucznik. “É lamentável que num Portugal democrático e livre se verifiquem estes acontecimentos e isto torna-nos apreensivos e indignados”, naquela que foi “a primeira vez que um cemitério foi vandalizado desta forma”.
São actos que “infelizmente não surpreendem”, diz Abílio Mourão, presidente da mais antiga comunidade judaica portuguesa, em Belmonte, Castelo Branco, apesar de na sua zona a convivência sempre ter sido “pacífica”. E também o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas reagiu ontem, condenando “de forma clara este tipo de actos. É um crime contra a comunidade judaica e uma ofensa à sociedade civil portuguesa e à democracia”.
TINHAM ALVOS JUDEUS MARCADOS
Os cartões dos telemóveis de Carlos Seabra, o ‘Lobo nazi’, e João Dourado denunciaram-nos entre terça-feira à noite, quando foram detidos, e ontem à tarde, antes de serem presentes ao Tribunal de Instrução Criminal. Os investigadores apanharam várias ligações dos dois à Hammerskin Nation, a elite do movimento neo-nazi europeu – e “guardavam fotografias de pessoas ligadas à comunidade judaica. Alvos marcados”.
Um dos crimes em que incorrem os skinheads não prevê prisão preventiva – profanação, punido até dois anos de cadeia – mas o outro, dano qualificado, pelos elevados estragos nas campas do cemitério, tem moldura penal entre dois e oito anos – suficiente para ser aplicada a prisão preventiva no novo Código de Processo Penal (acima de cinco anos). E o Ministério Público pediu prisão preventiva para os dois, dado o elevado perigo de reincidência e alarme social, mas o juiz decidiu-se pelo Termo de Identidade e Residência, medida de coacção mais leve, com apresentações ao domingo à PSP. E tudo apesar do “desprezo manifestado pelos dois pela comunidade judaica” – num contexto de “reacção e indiferença” à acusação que o MP proferiu há duas semanas contra 36 skins, entre eles o ‘Lobo nazi’.
PORMENORES
PROIBIDO RECORRER
O Ministério Público é obrigado a conformar-se com a liberdade dos dois skinheads e não pode recorrer da decisão do juiz de instrução criminal, pelo artigo 219 do novo Código de Processo Penal. O MP já só o poderia fazer em benefício do arguido – a prisão preventiva está fora de questão.
RITUAL DE INICIAÇÃO
O skinhead João Dourado já pertence à Frente Nacional, mas, aos 16 anos, passa ainda por rituais de iniciação ao movimento neo-nazi, apurou o CM. E a profanação ao cemitério judaico foi um deles – a forma de subir na estrutura nacional.
EXIBIÇÕES NA NET
O ‘Lobo nazi’ lançou um dia no site da Frente Nacional: “Continua a quebrar as regras até ao fim”. E num vídeo intitulado ‘Nazi paraquedista’, no site do Youtube, colocou imagens suas a envergar uma camisola com a cruz suástica enquanto arrancava um cartaz da CDU.
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