Trabalhadores do setor justificam medida face à percentagem de apoio do Estado ser reduzida.
1 / 3
Produtores agrícolas afetados pelos incêndios de 15 de outubro de 2017 disseram esta quinta-feira à agência Lusa ponderar desistir dos projetos de reconstrução face à percentagem reduzida do apoio que recebem do Estado.
Paulo Rogério, pastor e proprietário de uma queijaria de Oliveira do Hospital, contabilizou, aquando dos fogos de outubro, 132 ovelhas adultas mortas, com 50 borregos e mais 140 ovelhas de dois pastores a quem comprava leite. Para além disso, perdeu alfaias e barracões.
O prejuízo totalizava 200 mil euros, mas avançou com um projeto de apenas 108 mil euros devido ao apoio dado (50% acima dos 50 mil euros) e viu-lhe ser declarado como despesa elegível 62 mil euros, recebendo uma comparticipação de 42 mil euros - menos de um quarto do prejuízo que teve.
Reclamou no Ministério da Agricultura, mas o valor manteve-se e, não tendo como desembolsar mais de 60 mil euros, não deverá executar o projeto aprovado, disse à Lusa Paulo Rogério.
"Com aquela tabela é impossível. Eu perdi uma motosserra que custa 700 euros no mercado e eles definem como valor 300 euros. Assim não dá para trabalhar e para fazer o projeto", realça, considerando que se conseguiu reerguer com o apoio da solidariedade de particulares que o ajudaram a recompor o rebanho.
Apesar de continuar a laborar, empregando quatro pessoas na queijaria e no pastoreio, afirma que a continuidade da sua atividade "está em causa".
"Se as coisas andavam mal, pior ficam com esta situação, com menos animais, com menos produção, mas com as mesmas despesas", realça.
Na Associação Nacional de Criadores de Ovinos da Serra da Estrela (ANCOSE), o técnico Pedro Magalhães tem em mãos 35 projetos de recuperação de produtores agrícolas com prejuízos declarados superiores a 5 mil euros e destes apenas um já tem pedido de pagamento.
A situação, explica, deve-se a vários problemas com que os produtores se vão deparando para avançar com os projetos de recuperação daquilo que ardeu nos grandes fogos de outubro.
Por um lado, há entraves com os custos de licenciamento de obras e com o licenciamento de explorações ou armazéns que não estavam registados e que são despesa não elegível. Por outro, a tabela de preços que todos consideram desajustada aos preços praticados no mercado, disse à Lusa Pedro Magalhães. "A tabela foi a mãe do caos", acrescenta.
Sobre a questão do licenciamento camarário, o técnico da ANCOSE explica que os regulamentos e planos de ordenamento foram evoluindo e que há agora mais dificuldade em avançar com as obras de forma completamente legal em determinadas coisas que arderam.
"Terem que fazer a licença de obras, terem que fazer o projeto, levantar a licença e depois passar a pagar IMI por armazéns onde guardam palha é complicado", referiu, considerando que o próprio licenciamento para a realidade da pecuária de pastoreio está "desajustado".
"Ardeu uma coisa velha que desenrascava. Mas agora, para fazer de novo, é uma loucura por causa das regras", notou.
Já sobre o apoio dado pelo Ministério da Agricultura, cuja percentagem é inferior àquela que é dada a projetos industriais, Pedro Magalhães teme que as pessoas se tenham que endividar ainda mais.
Alguns produtores, recordou, já têm empréstimos de habitação ou até para pagar máquinas que acabaram por arder no fogo - "é um rombo muito grande e dificilmente conseguem gerir isso".
Pedro Magalhães conta já com três desistências - uma porque depois de o pedido aprovado o resto que o produtor tinha ruiu e já não dava para "compor tudo", outra por causa do licenciamento e outro que vai apenas executar a componente das máquinas, deixando de lado as obras de reconstrução.
"Pode haver mais", alertou.
Luís Miguel de Brito, de Oliveira do Hospital, contabilizou cerca 300 mil euros de prejuízo nos 30 hectares de olival que tinha espalhados por Lagares da Beira e Travanca de Lagos - cerca de cinco mil oliveiras.
Para o projeto, decidiu baixar o valor para 120 mil euros para recuperar 15 hectares, mas o projeto "passou para cerca de 30 mil euros".
"Trinta mil euros não dá sequer para preparar o terreno", referiu Luís Miguel de Brito, que já assinou o contrato-programa para avançar com o projeto, mas está num "limbo".
O projeto, referiu, "ainda está em avaliação" e mostra-se "convencido" de que não vai receber nada.
"Mediante aquilo que receba, vou decidir se avanço ou não" com o projeto ou se opta por recuperar o que ardeu à sua custa.
Também Sílvio Matias, apicultor que perdeu 500 colmeias distribuídas pelos concelhos de Oliveira do Hospital, Arganil e Seia, queixa-se da tabela de preços estipulada: "Atribuem o preço de enxames de 30 euros, mas no mercado não se compra por menos de 60 euros".
Segundo o produtor, do prejuízo de 70 mil euros, o Estado propõe-se a contribuir com 34 mil euros.
Para além da dificuldade que está a ter em encontrar enxames, tem dúvidas sobre se avança com o projeto ou não.
"Se comprar 500 enxames a 60 euros sãos 30 mil euros que tenho que dispor e que não tenho", disse, admitindo que "é uma hipótese" usar o projeto apenas para comprar as colmeias e desistir de adquirir os enxames através dos apoios.
Um quinto dos agricultores afetados apresentou pedidos de pagamento
Cerca de sete meses depois das candidaturas fecharem para o apoio aos incêndios de 15 de outubro de 2017, cerca de um quinto dos agricultores (19%) com prejuízos acima dos cinco mil euros apresentaram pedidos de pagamento, informou o Governo.
Questionado pela agência Lusa, o Ministério da Agricultura respondeu que, das 516 candidaturas apresentadas por agricultores com prejuízos acima dos cinco mil euros, havia, a 24 de julho, 97 projetos com pedidos de pagamento submetidos, "que estão a ser processados", o que dá 19% do total das candidaturas.
Na resposta enviada à agência Lusa, o Ministério da Agricultura refere que "todos os projetos contratados estão potencialmente em execução, salientando-se que a execução é da responsabilidade dos beneficiários".
No entanto, no terreno, produtores agrícolas queixaram-se à agência Lusa das despesas validadas e do apoio que é atribuído, ponderando desistir dos projetos, não tendo até agora avançado com a execução, apesar de terem as candidaturas contratualizadas.
A tutela refere que, das 516 candidaturas, já estão contratadas 512, aguardando as restantes quatro por "elementos ou esclarecimentos por parte dos beneficiários".
Ao longo do processo de atribuição de apoio aos produtores agrícolas afetados pelos grandes fogos de 15 de outubro de 2017, o Ministério da Agricultura recebeu "25 reclamações", acrescentou.
O período de candidaturas para projetos acima dos cinco mil euros para os agricultores afetados pelo incêndio de 15 de outubro terminou a 22 de dezembro, tendo sido disponibilizado um montante global de 15 milhões de euros.
Os níveis de apoio correspondiam a 100% dos prejuízos para valores até cinco mil euros, 85% para valores até 50 mil euros e 50% para valores até 800 mil euros.
Por várias vezes, o ministro da Agricultura, Capoulas Santos, sublinhou que o apoio que o Governo facultou aos agricultores "não tem precedentes".
Tem sugestões ou notícias para partilhar com o CM?
Envie para geral@cmjornal.pt
o que achou desta notícia?
concordam consigo
A redação do CM irá fazer uma avaliação e remover o comentário caso não respeite as Regras desta Comunidade.
O seu comentário contem palavras ou expressões que não cumprem as regras definidas para este espaço. Por favor reescreva o seu comentário.
O CM relembra a proibição de comentários de cariz obsceno, ofensivo, difamatório gerador de responsabilidade civil ou de comentários com conteúdo comercial.
O Correio da Manhã incentiva todos os Leitores a interagirem através de comentários às notícias publicadas no seu site, de uma maneira respeitadora com o cumprimento dos princípios legais e constitucionais. Assim são totalmente ilegítimos comentários de cariz ofensivo e indevidos/inadequados. Promovemos o pluralismo, a ética, a independência, a liberdade, a democracia, a coragem, a inquietude e a proximidade.
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza expressamente o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes ou formatos actualmente existentes ou que venham a existir.
O propósito da Política de Comentários do Correio da Manhã é apoiar o leitor, oferecendo uma plataforma de debate, seguindo as seguintes regras:
Recomendações:
- Os comentários não são uma carta. Não devem ser utilizadas cortesias nem agradecimentos;
Sanções:
- Se algum leitor não respeitar as regras referidas anteriormente (pontos 1 a 11), está automaticamente sujeito às seguintes sanções:
- O Correio da Manhã tem o direito de bloquear ou remover a conta de qualquer utilizador, ou qualquer comentário, a seu exclusivo critério, sempre que este viole, de algum modo, as regras previstas na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, a Lei, a Constituição da República Portuguesa, ou que destabilize a comunidade;
- A existência de uma assinatura não justifica nem serve de fundamento para a quebra de alguma regra prevista na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, da Lei ou da Constituição da República Portuguesa, seguindo a sanção referida no ponto anterior;
- O Correio da Manhã reserva-se na disponibilidade de monitorizar ou pré-visualizar os comentários antes de serem publicados.
Se surgir alguma dúvida não hesite a contactar-nos internetgeral@medialivre.pt ou para 210 494 000
O Correio da Manhã oferece nos seus artigos um espaço de comentário, que considera essencial para reflexão, debate e livre veiculação de opiniões e ideias e apela aos Leitores que sigam as regras básicas de uma convivência sã e de respeito pelos outros, promovendo um ambiente de respeito e fair-play.
Só após a atenta leitura das regras abaixo e posterior aceitação expressa será possível efectuar comentários às notícias publicados no Correio da Manhã.
A possibilidade de efetuar comentários neste espaço está limitada a Leitores registados e Leitores assinantes do Correio da Manhã Premium (“Leitor”).
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes disponíveis.
O Leitor permanecerá o proprietário dos conteúdos que submeta ao Correio da Manhã e ao enviar tais conteúdos concede ao Correio da Manhã uma licença, gratuita, irrevogável, transmissível, exclusiva e perpétua para a utilização dos referidos conteúdos, em qualquer suporte ou formato atualmente existente no mercado ou que venha a surgir.
O Leitor obriga-se a garantir que os conteúdos que submete nos espaços de comentários do Correio da Manhã não são obscenos, ofensivos ou geradores de responsabilidade civil ou criminal e não violam o direito de propriedade intelectual de terceiros. O Leitor compromete-se, nomeadamente, a não utilizar os espaços de comentários do Correio da Manhã para: (i) fins comerciais, nomeadamente, difundindo mensagens publicitárias nos comentários ou em outros espaços, fora daqueles especificamente destinados à publicidade contratada nos termos adequados; (ii) difundir conteúdos de ódio, racismo, xenofobia ou discriminação ou que, de um modo geral, incentivem a violência ou a prática de atos ilícitos; (iii) difundir conteúdos que, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, tenham como objetivo, finalidade, resultado, consequência ou intenção, humilhar, denegrir ou atingir o bom-nome e reputação de terceiros.
O Leitor reconhece expressamente que é exclusivamente responsável pelo pagamento de quaisquer coimas, custas, encargos, multas, penalizações, indemnizações ou outros montantes que advenham da publicação dos seus comentários nos espaços de comentários do Correio da Manhã.
O Leitor reconhece que o Correio da Manhã não está obrigado a monitorizar, editar ou pré-visualizar os conteúdos ou comentários que são partilhados pelos Leitores nos seus espaços de comentário. No entanto, a redação do Correio da Manhã, reserva-se o direito de fazer uma pré-avaliação e não publicar comentários que não respeitem as presentes Regras.
Todos os comentários ou conteúdos que venham a ser partilhados pelo Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã constituem a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição do Correio da Manhã ou de terceiros. O facto de um conteúdo ter sido difundido por um Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã não pressupõe, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, que o Correio da Manhã teve qualquer conhecimento prévio do mesmo e muito menos que concorde, valide ou suporte o seu conteúdo.
ComportamentoO Correio da Manhã pode, em caso de violação das presentes Regras, suspender por tempo determinado, indeterminado ou mesmo proibir permanentemente a possibilidade de comentar, independentemente de ser assinante do Correio da Manhã Premium ou da sua classificação.
O Correio da Manhã reserva-se ao direito de apagar de imediato e sem qualquer aviso ou notificação prévia os comentários dos Leitores que não cumpram estas regras.
O Correio da Manhã ocultará de forma automática todos os comentários uma semana após a publicação dos mesmos.
Para usar esta funcionalidade deverá efetuar login.
Caso não esteja registado no site do Correio da Manhã, efetue o seu registo gratuito.
Escrever um comentário no CM é um convite ao respeito mútuo e à civilidade. Nunca censuramos posições políticas, mas somos inflexiveis com quaisquer agressões. Conheça as
Inicie sessão ou registe-se para comentar.