Tal como o vírus se vai espalhando, também as unidades de cuidados intensivos para doentes covid foram crescendo.
1 / 6
"Estamos todos? Um, dois, três." Foram precisas sete pessoas para virar o doente. O trabalho de equipa na chamada 'zona vermelha' é muito exigente, mas médicos e enfermeiros continuam a resistir, apesar do cansaço de um ano de pandemia.
Tal como o vírus que entra no corpo e se vai espalhando, também as unidades de cuidados intensivos (UCI) para doentes covid no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, foram crescendo, tomando o lugar onde antes funcionavam enfermarias, áreas de recobro e blocos cirúrgicos.
A força da pandemia exigiu esforço extra. A hospitais e profissionais de saúde. Em Santa Maria são já oito as UCI para doentes infetados com covid-19. E a 9.ª abrirá este fim de semana, embora vá funcionar no Hospital Pulido Valente.
"O que fizemos foi rever o plano completo. Tínhamos no nosso plano, na área do doente crítico, cerca de 48 camas preparadas para esta fase. Nesta altura já vamos nas 66 e a caminho das 71", contou à Lusa Daniel Ferro, presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN), que inclui os hospitais de Santa Maria e Pulido Valente.
No total, estavam "preparadas cerca de 120 camas em novembro". "Nesta altura já ultrapassamos as 300", acrescentou.
Mas sem pessoal, as camas de nada valem. Daniel Ferro reconhece que foi preciso redistribuir os recursos humanos do hospital, mobilizando-os de outras áreas para a assistência covid, e investir em equipamentos.
Santa Maria ficará com 71 camas de cuidados intensivos, mas na mais recente unidade, inaugurada no início de fevereiro e que ocupou o lugar de uma enfermaria de pneumologia, se fosse preciso ocupar de um dia para o outro as duas únicas camas vagas, tal não era possível por falta de pessoal.
"Neste momento, não temos equipa de enfermagem para abrir essas duas camas. Estão vazias e isso está dependente unicamente de recursos humanos de enfermagem para avançarmos para a abertura dessas camas adicionais que são tão precisas", confessou Doroteia Silva, médica intensivista da unidade que a Lusa visitou na quinta-feira.
Entrar além da porta com a barra vermelha, é entrar num "mundo" diferente, de "bips", médicos e enfermeiros que mal se distinguem atrás dos óculos e das máscaras. E de alegria ou vitória quando um doente passa à enfermaria.
O corredor tem quartos à direita e à esquerda. Quatro no total. Todos com doentes em coma induzido e ligados à vida por um emaranhado de fios, que lhes medem os parâmetros clínicos ou asseguram alimentação e medicação, e de tubos que os ajudam a respirar.
Os respiradores usados por médicos e enfermeiros que trabalham nesta zona vermelha exigem que se fale um pouco mais alto, para que todos se oiçam. Mas são os sons das máquinas que se sobrepõem. Sempre a apitar, ora para registar informação clínica do doente, ora para alertar para algum problema.
A unidade tem oito doentes internados. Todos acima dos 65 anos. O mais novo conseguiu sair há dois dias para a enfermaria. "Foi a nossa primeira vitória em 11 dias de existência", conta uma das enfermeiras, recrutada à neonatologia.
Vieram todos - médicos e enfermeiros - de outros serviços do hospital. Todos com o mesmo objetivo: ajudar a salvar a vida dos doentes que o vírus surpreendeu.
"Somos atualmente duas [médicas] intensivista. Houve também reforços médicos de outras especialidades, nomeadamente uma intensivista pediatra e internos de outras especialidades, como anestesiologia, pediatria e medicina interna, que nos vieram ajudar", conta Doroteia Silva, lembrando que, no total, são sete médicos.
Viram os doentes para que fiquem de barriga para baixo e respirem melhor, verificam a medicação, mudam os sacos de alimentação, mudam fraldas, entubam (ligam ao ventilador) e desentubam. Não há um momento de descanso dentro daqueles fatos que os transformam, durante horas e horas, numa espécie de astronautas.
E os doentes, quando estão estáveis, também se exercitam. Seja com a fisioterapia feita por enfermeiros e enfermeiras, quando é preciso - "fazemos o que podemos" - seja pelo fisioterapeuta Rui.
"Boa tarde, vamos à fisioterapia?", pergunta Rui, que, mesmo sabendo que a doente não o ouvia, nunca parou de falar com ela, a pedir ajuda para levantar o braço e a perguntar se tinha dores quando o rodava.
"Às vezes ouvem. Percebemos pela resposta nas máquinas, ou abrem os olhos. Mas hoje esta sedação está muito elevada. Hoje, não me liga nenhuma". Mesmo assim, a fisioterapia prosseguiu como se a doente o ouvisse e estivesse a colaborar.
Nesta unidade os doentes têm todos acima dos 65 anos, mas noutras UCI há doentes muito mais novos. E muitos não tinham qualquer problema de saúde até serem infetados.
"Nas várias unidades há doentes jovens com poucas comorbilidades. (...) Todas as faixas etárias estão representadas", assegura Doroteia, que falou à Lusa já depois de ter passado pelo ritual ordenado e rigoroso de despir todo o equipamento, na antecâmara que separa a restante área da "zona vermelha", onde estão os doentes críticos.
Durante a visita da Lusa, a equipa desentubou uma das doentes que estava ligada ao ventilador, na esperança que ela conseguisse respirar sozinha. "Temos de ir tentando. O ventilador vai fazendo cada vez menos trabalho e, quando o doente está a responder bem, tentamos", explica uma das enfermeiras.
Desta vez, não tiveram sucesso. A doente teve de ser entubada novamente.
"Aqui, é um dia de cada vez."
Tem sugestões ou notícias para partilhar com o CM?
Envie para geral@cmjornal.pt
o que achou desta notícia?
concordam consigo
A redação do CM irá fazer uma avaliação e remover o comentário caso não respeite as Regras desta Comunidade.
O seu comentário contem palavras ou expressões que não cumprem as regras definidas para este espaço. Por favor reescreva o seu comentário.
O CM relembra a proibição de comentários de cariz obsceno, ofensivo, difamatório gerador de responsabilidade civil ou de comentários com conteúdo comercial.
O Correio da Manhã incentiva todos os Leitores a interagirem através de comentários às notícias publicadas no seu site, de uma maneira respeitadora com o cumprimento dos princípios legais e constitucionais. Assim são totalmente ilegítimos comentários de cariz ofensivo e indevidos/inadequados. Promovemos o pluralismo, a ética, a independência, a liberdade, a democracia, a coragem, a inquietude e a proximidade.
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza expressamente o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes ou formatos actualmente existentes ou que venham a existir.
O propósito da Política de Comentários do Correio da Manhã é apoiar o leitor, oferecendo uma plataforma de debate, seguindo as seguintes regras:
Recomendações:
- Os comentários não são uma carta. Não devem ser utilizadas cortesias nem agradecimentos;
Sanções:
- Se algum leitor não respeitar as regras referidas anteriormente (pontos 1 a 11), está automaticamente sujeito às seguintes sanções:
- O Correio da Manhã tem o direito de bloquear ou remover a conta de qualquer utilizador, ou qualquer comentário, a seu exclusivo critério, sempre que este viole, de algum modo, as regras previstas na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, a Lei, a Constituição da República Portuguesa, ou que destabilize a comunidade;
- A existência de uma assinatura não justifica nem serve de fundamento para a quebra de alguma regra prevista na presente Política de Comentários do Correio da Manhã, da Lei ou da Constituição da República Portuguesa, seguindo a sanção referida no ponto anterior;
- O Correio da Manhã reserva-se na disponibilidade de monitorizar ou pré-visualizar os comentários antes de serem publicados.
Se surgir alguma dúvida não hesite a contactar-nos internetgeral@medialivre.pt ou para 210 494 000
O Correio da Manhã oferece nos seus artigos um espaço de comentário, que considera essencial para reflexão, debate e livre veiculação de opiniões e ideias e apela aos Leitores que sigam as regras básicas de uma convivência sã e de respeito pelos outros, promovendo um ambiente de respeito e fair-play.
Só após a atenta leitura das regras abaixo e posterior aceitação expressa será possível efectuar comentários às notícias publicados no Correio da Manhã.
A possibilidade de efetuar comentários neste espaço está limitada a Leitores registados e Leitores assinantes do Correio da Manhã Premium (“Leitor”).
Ao comentar, o Leitor está a declarar que é o único e exclusivo titular dos direitos associados a esse conteúdo, e como tal é o único e exclusivo responsável por esses mesmos conteúdos, e que autoriza o Correio da Manhã a difundir o referido conteúdo, para todos e em quaisquer suportes disponíveis.
O Leitor permanecerá o proprietário dos conteúdos que submeta ao Correio da Manhã e ao enviar tais conteúdos concede ao Correio da Manhã uma licença, gratuita, irrevogável, transmissível, exclusiva e perpétua para a utilização dos referidos conteúdos, em qualquer suporte ou formato atualmente existente no mercado ou que venha a surgir.
O Leitor obriga-se a garantir que os conteúdos que submete nos espaços de comentários do Correio da Manhã não são obscenos, ofensivos ou geradores de responsabilidade civil ou criminal e não violam o direito de propriedade intelectual de terceiros. O Leitor compromete-se, nomeadamente, a não utilizar os espaços de comentários do Correio da Manhã para: (i) fins comerciais, nomeadamente, difundindo mensagens publicitárias nos comentários ou em outros espaços, fora daqueles especificamente destinados à publicidade contratada nos termos adequados; (ii) difundir conteúdos de ódio, racismo, xenofobia ou discriminação ou que, de um modo geral, incentivem a violência ou a prática de atos ilícitos; (iii) difundir conteúdos que, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, tenham como objetivo, finalidade, resultado, consequência ou intenção, humilhar, denegrir ou atingir o bom-nome e reputação de terceiros.
O Leitor reconhece expressamente que é exclusivamente responsável pelo pagamento de quaisquer coimas, custas, encargos, multas, penalizações, indemnizações ou outros montantes que advenham da publicação dos seus comentários nos espaços de comentários do Correio da Manhã.
O Leitor reconhece que o Correio da Manhã não está obrigado a monitorizar, editar ou pré-visualizar os conteúdos ou comentários que são partilhados pelos Leitores nos seus espaços de comentário. No entanto, a redação do Correio da Manhã, reserva-se o direito de fazer uma pré-avaliação e não publicar comentários que não respeitem as presentes Regras.
Todos os comentários ou conteúdos que venham a ser partilhados pelo Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã constituem a opinião exclusiva e única do seu autor, que só a este vincula e não refletem a opinião ou posição do Correio da Manhã ou de terceiros. O facto de um conteúdo ter sido difundido por um Leitor nos espaços de comentários do Correio da Manhã não pressupõe, de forma direta ou indireta, explícita ou implícita, que o Correio da Manhã teve qualquer conhecimento prévio do mesmo e muito menos que concorde, valide ou suporte o seu conteúdo.
ComportamentoO Correio da Manhã pode, em caso de violação das presentes Regras, suspender por tempo determinado, indeterminado ou mesmo proibir permanentemente a possibilidade de comentar, independentemente de ser assinante do Correio da Manhã Premium ou da sua classificação.
O Correio da Manhã reserva-se ao direito de apagar de imediato e sem qualquer aviso ou notificação prévia os comentários dos Leitores que não cumpram estas regras.
O Correio da Manhã ocultará de forma automática todos os comentários uma semana após a publicação dos mesmos.
Para usar esta funcionalidade deverá efetuar login.
Caso não esteja registado no site do Correio da Manhã, efetue o seu registo gratuito.
Escrever um comentário no CM é um convite ao respeito mútuo e à civilidade. Nunca censuramos posições políticas, mas somos inflexiveis com quaisquer agressões. Conheça as
Inicie sessão ou registe-se para comentar.