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Um em cada sete portugueses com obesidade não reconhece ter a doença

Menos de metade dos inquiridos (47,5%) sabe que o critério de classificação da doença é ter um Índice de Massa Corporal igual ou superior a 30.

10 de dezembro de 2025 às 08:49

Um em cada sete portugueses com obesidade não reconhece ter a doença, segundo um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) que concluiu pela persistência de lacunas de conhecimento e baixos níveis de literacia.

Apesar de mais de 90% dos inquiridos reconhecerem a obesidade como uma doença crónica que precisa de tratamento, só menos de metade (47,5%) sabe que o critério de classificação é ter um Índice de Massa Corporal (IMC) igual ou superior a 30.

Em declarações à Lusa, a investigadora Ana Rita Pedro disse que os dados sobre o não reconhecimento da doença foram os que mais surpreenderam os investigadores.

"Podemos estar a falar de uma ausência de conhecimento sobre o que é a obesidade, e por isso a pessoa não sabe se tem. Pode ser também uma questão relativa ao estigma [da pessoa não se rotular como obesa] (...), uma espécie de uma negação da condição de saúde, ou pode ser uma questão de literacia", explicou a investigadora.

A 9.ª edição do estudo Saúde que Conta, que vai ser esta quarta-feira divulgado, pretendeu avaliar o conhecimento e atitudes em relação à obesidade na população adulta portuguesa, assim como o nível de literacia em saúde, analisando também a influência de fatores demográficos e socioeconómicos.

No total, foram validadas 3.333 respostas recebidas entre novembro de 2024 e fevereiro deste ano.

Embora 35,5% da amostra total tenha critérios de obesidade, apenas 20,45 reportou ter a doença, revelando "um hiato de perceção".

Os dados mostram ainda que as pessoas quando confrontadas com questões relacionadas com a sua esfera social, como, por exemplo, qual é a probabilidade de dar emprego a uma pessoa com obesidade, ou qual é a probabilidade de ter um amigo com obesidade, reportam probabilidades muito altas.

Já quando confrontadas com perguntas mais da sua esfera pessoal ou da vida íntima - por exemplo, qual a probabilidade de ter um encontro amoroso com uma pessoa com obesidade ou confiar os cuidados dos seus filhos a uma pessoa com obesidade -, os valores descem substancialmente.

As pessoas com obesidade percecionam um maior nível de discriminação contra quem tem a doença e, em relação à perceção corporal, os dados deixam um alerta para a discriminação de género.

"Tradicionalmente nós estamos mais confortáveis com um excesso de peso associado ao género masculino. Nas mulheres tendemos a olhar com um olhar mais crítico e isto também foi denotado no âmbito destes resultados", explicou Ana Rita Pedro.

A especialista sublinha ainda o papel das redes sociais nesta matéria: "somos diariamente confrontadas com a exposição do corpo feminino com estes 'ideais' de padrão do corpo feminino e acabamos por ter um olhar muito mais crítico do que para um corpo masculino".

Quanto à literacia em saúde, lembrou que o conceito é muito mais complexo do que ter acesso à informação.

"Estamos a falar, efetivamente, do acesso, mas depois estamos a falar também da compreensão dessa informação, da avaliação dessa informação, por exemplo, se vem de fontes credíveis ou não, e também da aplicação prática dessa informação no meu quotidiano, de acordo com o meu perfil de saúde e de doença", explicou, alertando para a desinformação que surge nas redes sociais.

A este nível, o estudo concluiu que as pessoas com obesidade apresentam níveis de literacia em saúde "tendencialmente mais baixos" e que mais de metade destas pessoas (54,1%) tem níveis "problemáticos" ou "inadequados".

Ana Rita Pedro disse que a situação melhorou nos últimos 10 anos -- em 2016 mais de 60% da população tinha níveis negativos de literacia em saúde e hoje o valor ronda os 45% -, mas é preciso fazer mais e melhor, usando também as redes sociais para "chegar onde as pessoas estão".

Insistiu que é preciso dotar as pessoas com competências para distinguir o que é informação validada e credível, sublinhando a necessidade de ter "pessoas cada vez mais competentes a diferenciar o que é uma manobra de marketing daquilo que é evidência científica".

"Devemos tentar estar onde as pessoas estão, não dando muita margem para aqueles espaços vazios na área da informação que rapidamente são ocupados por outros", alertou.

A investigadora insiste na necessidade de a academia, os decisores políticos e as instâncias governamentais se aliarem para que a informação credível seja mais veiculada nas redes sociais, inclusive por profissionais de saúde: "Há profissionais de saúde que são autênticos 'influencers' nas redes, e com muito mérito, que ajudam na área da literacia e da capacitação das pessoas".

Contudo, reconheceu que a parte mais difícil é a componente da "literacia crítica": Ser capaz de olhar para o que nos rodeia e saber distinguir a informação credível da outra. "Muitas vezes elas confundem-se. E nós temos consciência disso".

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