Segredos
Há aqui fogo na forma como Prince cruza gospel, funk, jazz e música clássica.
O baú de Prince deve estar repleto de canções. Por isso não surpreenderá que, nos próximos anos, se assista a um verdadeiro corrupio de lançamentos de material inédito. A vaga iniciou-se agora com ‘Piano & Microphone 1983’, reflexo de uma gravação caseira que existia numa cassete.
São exercícios íntimos feitos à volta de um piano, temas que muito provavelmente o verdadeiro rei da pop não desejaria que algum dia escutássemos. Tinha-os guardado como um segredo que não era para partilhar. E que agora todos escutamos, com alguma culpa no pensamento.
Mas, sabe-se, a pop é voraz: devora os seus próprios ídolos e tudo aquilo que eles esconderam de nós. O certo é que este disco revela Prince Rogers Nelson no pico dos seus poderes criativos, sozinho no seu estúdio privado, escavando o caminho para futuros momentos de sucesso como ‘Purple Rain’, que aqui já se parece adivinhar.
Há aqui uma versão embrionária de ‘17 Days’ (que foi o lado B do single ‘When Doves Cry’). Há dor e solidão num ambiente muito íntimo que haveria de evoluir para o funk ousado que conhecemos de grande parte das suas grandes canções.
Prince, sabe-se, tocava quase todos os instrumentos, destacando-se talvez a forma como trabalhava a guitarra, mas o seu talento como pianista foi sempre secundarizado, apesar da sua última digressão de 2016 ter tido como base esse instrumento. Há aqui fogo na forma como cruza o gospel, o funk, o jazz e mesmo a música clássica. Há momentos mágicos: ‘A Case of You’ (de Joni Mitchell, uma das suas paixões musicais) é aqui recuperada. Um exercício muito pessoal.
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