A escritora acaba de lançar mais um livro. Chama-se 'Se Isto foi o Meu País' e propõe uma reflexão profunda sobre o passado e aquilo que queremos para o futuro.
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As Marias eram miúdas de 12,13 anos que vinham trabalhar para Lisboa, para as casas das famílias mais abastadas, como é o caso da que retrato na história. Pelo facto de ter 71 anos, foram realidades que conheci e achei importante pôr por escrito, para as pessoas não se esquecerem como é que foi. Muitas vezes embelezamos o que havia antes. Claro que tinha coisas boas, algumas mantiveram-se outras não. O que é normal, quando há uma revolução. Mas a verdade é que também havia coisas muito más. A pobreza era uma coisa terrível. E a intransponibilidade dos muros, ou seja, entre classes sociais. Uma sociedade onde tudo era proibido e as pessoas viviam fechadas sobre si mesmas. Era um país muito cinzento, muito claustrofóbico.
Não é um livro político nem sobre política, mas tem como uma das personagens centrais um ‘senhor coronel’, que trabalhava na António Maria Cardoso, mas a mulher nem sequer sabia, porque os homens não conversavam com as mulheres sobre coisa nenhuma e muito menos sobre política. Fui buscar factos, para relatar o Estado novo, depois a revolução, o PREC e as primeiras eleições democráticas e a forma como é que isso afetou diversas pessoas e classes sociais nessa altura. Assusta-me muito que, quando a minha geração morrer, não vai haver ninguém que tenha vivido estes tempos e que possa contar como foi. Sobretudo, transmitir sem estarmos preocupados com que lado da política é que estamos a falar.
Já recebi mensagens de antigas Marias, que se comoveram porque viram ali retratadas as vidas delas, e recebi mensagens de pessoas que estavam fechadas naquele tipo de famílias, que não podiam sair de lá. Mais uma vez, não é minha intenção fazer política, mas sim salvar memórias e explicar às pessoas, entre outras coisas, que a democracia e a liberdade são muito frágeis, que vale a pena refletir sobre aquilo que temos hoje e que vale a pena lutar por isso.
Primeiro com muita felicidade. Depois logo a seguir, o meu pai foi preso, teve que fugir para o Brasil, e eu vi o outro lado. A seguir veio o PREC e foi uma coisa terrível. É engraçado termos governos de Esquerda e não gostarem de falar nisso. Mas a história é a história, existiu. A revolução foi muito emocionante. Vivíamos em Alfragide– que na altura era uma província - e ouvíamos perfeitamente os aviões a passarem , seguíamos os acontecimentos na rádio e na televisão. Houve muita inconsciência ao mesmo tempo: a minha mãe fazia anos a 26 de Abril e a 25 fomos de camioneta ao Chiado comprar-lhe um presente. Ainda chegámos a ouvir os tiros da António Maria Cardoso. Todavia, eu sempre tive uma vida um pouco diferente. Sempre fui uma carta fora do baralho. O meu pai era Presidente do Sindicato Nacional de Jornalistas. Quando tinha 15/16 anos dei aulas nas barracas da Boavista ao lado dos seminaristas. Os homens precisavam muito de trabalhar, mas para isso precisavam de tirar a carta e tinham de fazer a quarta classe . Nós íamos às barracas, no meio da lama, ensiná-los a ler e a escrever. São imagens que nunca esqueces e que me fizeram perceber que era uma privilegiada em relação à vida e às coisas que tinha.
Sim, eles sempre tiveram noção das dificuldades. Mas também sempre lhes ensinei que, mais importante do que tirar um curso, é ser feliz. Incentivei cada um deles a descobrir o que queria para a sua vida, explicando-lhes que todas as escolhas têm um preço. Sempre lhes falei muito sobre o 25 de Abril e sobre o papel da mulher naquele tempo. O meu ex-marido dizia que eu dava feminismo ao pequeno-almoço. Foram muitas as vezes que relatei à Inês o que era não poder viajar sem autorização do marido ou como era não poder abrir uma conta no banco sozinha. Ela ficava espantada. Assim como transmitia aos meus filhos que há pessoas que vivem com muito menos do que nós. Talvez por isso, foram espantosos e começaram a trabalhar muito cedo. E quando eu digo “muito cedo”, foi mesmo muito cedo. Para me ajudar, porque a vida não era fácil e eles tinham plena noção das minhas dificuldades. Por outro lado, sempre lhes disse que ser educado com o administrador, com o reitor da escola é fácil. Difícil é ser bem educado com a senhora da limpeza, mas na verdade é isso que demonstra quem realmente somos. Sozinha com três filhos… fiz o melhor que pude e continuo a fazer o melhor que posso, porque sou uma avó que todos os dias vai buscar os netos à escola e fica umas horas com eles. Todos nós, enquanto pais, fazemos muitos erros, seguramente. Mas desde que coloquemos os nossos filhos antes de tudo o resto, e que o nosso amor por eles seja infinito, estamos a fazer o melhor. A vida dirá, depois, o que irá acontecer.
Sempre escrevi, toda a minha vida. Com 11 ou 12 anos, eu já escrevia. É uma necessidade física. Não desaparece mas com idade as coisas sobre as quais queremos escrever mudam. Tudo muda com a idade: a nossa perspetiva sobre os outros, sobre nós mesmos, sobre a vida. Mas só me sento ao computador quando a história está pronta na minha cabeça. Há algo mágico na escrita. De repente, as palavras aparecem, fazem frases, constroem imagens, desenham aventuras... é fabuloso, verdadeiramente fabuloso. Mas também é extremamente solitário. O meu marido costuma dizer que, quando eu estou a escrever, fico com “aquela cara”. Pergunto-lhe o que é que isso quer dizer e ele diz que é a única altura em que eu não ouço nada do que me dizem. A escrita és tu e a tua cabeça.
Todas as semanas vou à TVI e divirto-me genuinamente a comentar. Sou bem tratada, gosto das pessoas que lá estão. Mas neste momento, não sei… por acaso, tive uma conversa e um desafio muito recente sobre isso. Mas não sei se neste momento da minha a troca vale a pena. Sou exigente e seu que isso iria alterar a minha rotina e tirar tempo aos meus.
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