Primeira corrida de touros da Feira Taurina da Moita após dois espetáculos adiados
Ambiente nas imediações da Praça, que registou cerca de dois terços de entrada, o que, dada a meteorologia recente, não foi mau.
Devido à intempérie que tem assolado o país, situação que levou ao adiamento de dois espetáculos, realizou-se ontem, na Moita, na Praça de Touros Daniel do Nascimento, a primeira corrida de touros da Feira Taurina da Moita.
Um cartel que prometia, atuando os cavaleiros António Palha Ribeiro Telles, Gilberto Filipe, João Moura Júnior, João Ribeiro Telles, João Salgueiro da Costa e Paco Velasquez, estando as pegas a cargo do Grupo de Forcados do Aposento da Moita, que tinha a sua exaltação, na Praça da sua Terra, defronte da sua gente. Nas bancadas, muitos elementos antigos do Aposento da Moita, provando que forcado uma vez, forcado sempre.
Lidava-se um curro da ganadaria de Passanha Sobral.
Ambiente nas imediações da Praça, que registou cerca de dois terços de entrada, o que, dada a meteorologia recente, não foi mau. Mas quanto a isto existem sempre duas opiniões, os positivistas, em que se contam aqueles que vêm o copo meio cheio, e os negativistas, que vêm sempre o copo meio vazio, nomeadamente, aqueles para quem nada está bem, o cartel tem sempre defeitos, os touros não são os ideais, os empresários não percebem nada do oficio, e o público, por ser aficionado, tem a "obrigação" de ir a todos os espetáculos, como se não estivéssemos neste momento, a vivenciar enquanto país, uma tremenda crise económica, onde muitas famílias, começam a ter dificuldades para satisfazer as suas necessidades mais básicas. Por tudo isso, e independentemente de gostar que a Praça tivesse lotação esgotada, assistimos ontem a uma interessante entrada de público.
Dirigiu a corrida o sempre discreto e competente Diretor Tiago Tavares, bem assessorado pelo Médico Veterinário, Dr. Carlos Santos, sendo cornetim, o enorme José Henriques, que embelezou a noite com os seus toques.
A corrida propriamente dita, foi correta, tudo esteve bem, os toureiros estiveram bem, fizeram as coisas bens feitas, os forcados resolveram muito bem e com categoria todas as situações que os touros colocaram, com cinco pegas ao primeiro intento, e uma ao segundo, os touros tinham Apresentação e Trapio, sendo que alguns deles foram mesmo aplaudidos aquando da sua entrada em Praça, deixarem-se lidar sem levantar grandes problemas, mas, faltou algo a esta corrida. Faltou bravura aos touros, faltou transmissão da arena para as bancadas. Faltou aquilo que transforma uma corrida de touros normal, num grande espetáculo, carregado de emoção, espetáculo de onde a assistência não consegue tirar os olhos da praça, faltou bravura, faltou touro.
Iniciou função António Ribeiro Telles, que esteve igual a si próprio. Correto, toureiro, não transgredindo relativamente à sua conceção de toureio. Três ferros cumpridos a abrir, sendo o terceiro o melhor de todos os que cravou nesta noite. Nos ferros curtos, cumpriu com a qualidade e o acerto de sempre, sem no entanto conseguir chegar ao público, conseguir ligar-se com o público. Escutou música ao segundo curto.
Para a primeira pega da noite, saltou à arena o cabo Leonardo Mathias, para dar o exemplo ao grupo, muito jovem, alguns pouco rodados. Leonardo Mathias este como sempre, muito bem. É sem duvida nenhuma, um dos melhores forcados que no tempo presente, pisam as nossas arenas. Toureio, valente, citou com classe e depois, com a eficácia de sempre, tecnicamente perfeito, concretizou a pega ao primeiro intento, numa pega, que para um forcado desta qualidade, até pareceu fácil.
O segundo touro da noite, coube a Gilberto Filipe. Foi o pior touro, o mais complicado, o que mais sinais de mansidão apresentada, vindo a acabar, a rachar-se muito cedo. Gilberto Filipe também não o entendeu, ou por outro lado, estando a tourear quase em casa, defronte dos seus amigos, levava a ilusão do triunfo, e isso fez com que quisesse tirar aquilo que o touro não tinha para dar. Nem sequer foi regular a cravar, sendo que logo nos cumpridos teve alguns erros e falhas na cravagem, quando o touro ainda tinha alguma coisa para dar, e depois, nos curtos, foi apenas deixar uns atrás de outros, sem qualquer nota de relevo, a não ser um violino de recurso que saiu bem. Não se percebe o último ferro, quando já não havia touro e nada iria acrescentar à lide. Percebe-se a frustração, pois tourear uma corrida em casa, e não ter touro, é um golpe duro na ilusão criada. Mas a festa é assim, e é essa imprevisibilidade chamada touro que a torna única e bela.
Para a pega deste segundo, saltou o forcado Tiago Valério, forcado jovem e seguro. Não percebeu bem o touro à primeira tentativa, tendo-lhe perdido a cara, depois de ter sofrido um forte derrote. À segunda, pareceu mais clamo, fez as coisas bem-feitas, fechou-se como uma lapa, resolvendo o problema, com o grupo muito bem a ajudar.
Volta autorizada pelo Diretor de Corrida, sendo que Gilberto Filipe, recusou-se a dar a volta, limitando-se depois de pressionado pelo público a agradecer nos médios. O forcado, em solidariedade, ficou-se também pelos médios.
Depois, veio João Moura Júnior. Vinha com vontade de armar o taco, como havia feito ainda recentemente em Montemor. Como vem sendo hábito, montando o Londres, uma sorte de gaiola a abrir, que resultou bem, rematando depois o ferro com classe. Parecia que era agora que o nível de emoção da corrida iria subir. Mais um bom cumprido e troca para os curtos. Montando o Juventus, cravou três ferros sérios, com batida ao pitón contrário, entrando pelo touro dentro, o que lhe valeu um ligeiro toque, rematando com classe. Depois com o Hostil, quis armar o taco com as "mourinas". O Touro não estava para aí virado. Apesar da vontade de Moura Júnior, o touro teimava em não colaborar. Uma "mourina" certinha, mas que não chegou ao público, por falta de touro. Depois uma rosa para rematar, de alto a baixo, para encerrar.
Para bater as palmas ao touro, foi escolhido o forcado João Freitas, que fez uma das suas primeiras pegas a um touro, para mais um touro de cinco anos. E não tremeu (pelo menos por fora). Citou bonito, deu vantagens, deixou o touro arrancar, não recuou, esperou e fez uma excelente pega. Na viagem, aguentou violentos derrotes sem vacilar, e mesmo quando o toiro fugiu ao grupo, aguentou-se até o grupo recuperar e fechar. Uma pega rija e emotiva, onde o João Freitas beneficiou de uma grande primeira ajuda.
Volta para João Moura Júnior, para o forcado João Freitas e para o segundo ajuda, sendo esta volta exigida pela "afición".
Abriu a segunda parte, João Ribeiro Telles, que teve uma atuação de bom nível, e onde poderíamos escrever tudo o que se disse de Moura Júnior. Vinha com a mesma ilusão de triunfo, cravou dois compridos com extrema correção. Trocou de montada e cravou mais três ferros em "su sitio", com classe, com sortes frontais. Foi depois buscar a estrela da companhia, esse cavalo extraordinário que é o Ilusionista, e mais dois ferros, ferros clássicos com aquele cavalo, a ir para cima do touro, batida ao piton contrário e cravagem de alto a baixo. Emoção que se desvanecia imediatamente, na falta de touro para rematar a sorte. Tal como Moura, esteve bem, mas faltou o sal que daria o triunfo.
Para a pega deste quarto da noite, foi escolhido o forcado Diogo Gromicho. Pega da noite. O touro aqui vibrou, não quis o forcado na sua cara, derrotou forte, mas o miúdo alapou-se à cara do touro e muito bem ajudado – grande noite do grupo a ajudar – recusou-se a sair da cara do touro. Ali era ele quem mandava. Noite grande para o Diogo, não só a pegar de caras como a ajudar. Foi engraçado ver o sofrimento estampado na casa dos pais, antes e durante a pega, e depois a alegria do triunfo. Algumas lagrimas na cara do pai, também ele um valoroso forcado do grupo, daqueles a quem bati muitas palmas em muitas tardes e noites nesta mesma praça.
Veio depois João Salgueiro da Costa. E o melhor que podemos dizer é que "Salguerinho" não fez nada mal. Fez tudo certinho. Lide de compêndio de bem fazer. Cravou talvez, o melhor ferro da corrida, o terceiro curto, entrando pelo touro dentro. Perante isto, deveríamos concluir; Triunfo enorme. Não, antes pelo contrário, noite sonsa, pois à semelhança dos seus colegas de cartel, faltou emoção, faltou cooperação do Touro. Este, à semelhança dos outros, deixou-se tourear, não complicou, mas não quis por nada que ajudasse à festa.
Para pegar o quinto da noite, saltou à arena o forcado Martim Cosme Lopes, que diga-se, tinha já dado ajuda em três outras pegas. Não é um forcado brilhante em praça, daqueles que têm estilo, graça, que citam com garbosidade. Podem até dizer que não tem um cite bonito. Ok! Tudo isto pode ser verdade. Mas é um enorme forcado, terrivelmente eficaz e eficiente, talvez o mais eficiente e eficaz forcado da atualidade. Desde que ele chegou à Moita e ao Aposento, nunca o vi pegar à segunda, terceira ou outra. É sempre à primeira, e por norma, as "rolhas" são para ele. Ontem foi igual; o mesmo estilo, o mesmo cite, a mesma presença, e a mesma eficácia e eficiência. Com o Martim, Problema existente é problema resolvido. Grande.
Encerrou a noite Paco Velasquez. Está a dar os primeiros passos, sendo que ainda não tomou alternativa. Um pequeno reparo; nota-se que quer fazer tudo bem, tudo como manda a Lei e a Tradição. Mas essa sua ânsia, leva-o a fazer tudo muito devagar e a prolongar a lide e a tirar-lhe emoção. Ontem, foi o único dos cavaleiros em praça, que excedeu em muito o tempo de lide, tendo contado com o excelente feito do diretor de corrida. Mas esteve bem, quer na ferragem cumprida, quer depois nos curtos. Mostrou ter argumentos quer ele, quer as suas montadas, para outros voos. Registe-se com relevo, os últimos dois ferros, já depois do duplo aviso de excesso de tempo, cravadas num cite em curto, em muito mesmo, que levaram emoção às bancadas.
Fechou a noite, o forcado André Silva. Pequeno, franzino, dez reis de gente como se diz no Alentejo, mas um coração do tamanho do mundo. Tentou duas vezes, esteve a dois ou três metros do touro e este teimou em não investir. Desfez, mudou terrenos ao touro, foi lá novamente, provocou-lhe a investida, e bem ajudado, fechou-se à primeira tentativa. Excelente pega.
Noite de triunfo para o Aposento da Moita. Pode-se dizer que os touros não complicaram. É verdade. Mas os forcados também não. Estiveram bem com os touros, não complicaram e por isso, estiveram por cima deles. Tiveram argumentos para todos os problemas que lhe foram colocados, e quando assim é, não há "ses". Estiveram bem, quer individualmente, quer principalmente, enquanto grupo, dando sempre vantagens ao touro e fechando-se na cara do "bicho" quando o tinham de fazer. Percebeu-se a alegria, a felicidade e o orgulho dos atuais forcados, o mesmo sentir dos muitos antigos forcados ali presentes.
Crónica por Carlos Anjos
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