Arnaldo Antunes é, dos artistas brasileiros, o que melhor consegue fazer a ponte entre diferentes códigos, derrubar obstáculos entre géneros, misturar elementos. Tanto na linguagem como no estilo, o que lhe interessa é criar um trânsito fluente entre as mais variadas criações artísticas.
“Ninguém gosta de viver só de repetição, pois quem produz arte, tal como quem recebe, tem sede de estranhamento, novidade e originalidade. Eu gosto mais de acreditar nas excepções do que nas regras”, afirmou ao Correio da Manhã o autor de um dos bons concertos da recente edição do Festival do Sudoeste, na Zambujeira do Mar.
INVULGAR
A obra de Arnaldo Antunes busca o raro, o invulgar, o multifacetado. “É preciso juntar o que faço. Juntar os Titãs, os Tribalistas, a carreira a solo, os livros e as ‘performances’. É preciso abranger, associar pintura e escrita, imagens e poemas”.
De parceria em parceria, acabou duas letras novas para o próximo disco dos Clã, “que Manuela Azevedo, que, recentemente, deu à luz um bebé, canta optimamente”. Saltando entre actividades – “texto, livro, letra, canção, música, gravação” – Arnaldo Antunes nunca deixa de prezar o eclectismo, libertando-se das camisas de força dos géneros.
“Saí dos Titãs porque sou mais identificado com o lado comportamental do rock’n’roll, que é libertário, do que com o rock’n’roll enquanto género, que aprisiona”, conta, enquanto Zaba, sua mulher e teclista da banda, dorme no chão da tenda improvisada como camarim.
A palavra em si
De Arnaldo Antunes conheci uma inusual “performance”, intitulada “Nome”, na qual explorava ritmos e registos de emissão vocal, que iam das palavras (do grito ao sussurro), e na qual incorporava ruídos e canais de vozes pré-gravadas.
Canção popular, poesia visual, experiência vocal, acção teatral, música, criação gráfica e animação digital integravam esse espectáculo, no qual a simultaneidade entre o que se lia, o que se ouvia e o que se via dividia a atenção do público e possibilitava vários planos de apreensão.
A poesia surgia, enquanto eixo, em diálogo permanente com a música, a acção performática em si (manipulação de objectos utilizados enquanto significação poética) e imagens de vídeo.
Certa vez, aquando do Porto 2001, vi, sob camisas brancas gigantes, ser projectado um vídeo realizado a partir das páginas de uma obra, “Oráculo”, também de sua autoria, que intensificavam o centro nevrálgico da “performance”: a palavra em si.
‘DESPERTAR E ALTERAR’
Dele observei uma instalação, intitulada “Palavra desordem”, em que o espaço estava contaminado por vocábulos que se iluminavam ou escondiam, surgindo em ritmos e intensidades diferentes. Vozes que liam colagens de textos enquanto intervenções gráfico-poéticas rodopiavam o público, num cerco que alastrava das paredes ao tecto. O mote era a desordem.
Na sala anexa, ouvia-se a palavra, material, táctil, apresentada sob a forma de frases e letras sobrepostas, rasgadas, amarrotadas. O contraste entre os dois ambientes era intensificado pelo som, com a voz de Arnaldo Antunes a oralizar textos de filosofia misturados com bulas de medicamentos, trechos de romances e outras colagens mais ou menos absurdas.
“Dessa inflação simultânea resulta uma espécie de curto-circuito dos sentidos. Ao lermos uma coisa e ouvirmos outra, os sentidos atritam-se. Dessa sondagem, também nova para mim enquanto criador, resulta alguma função catártica no espectador. Esse é precisamente o meu objectivo. A busca inicial é despertar e alterar os sentidos”, confidenciou ao CM.
Tal como escreveu o poeta americano Ezra Pound, “a função da arte é nutrir de impulsos”.
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