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Quem canta em português ainda se sente bicho do mato

Dois anos após a estreia, os Toranja editam um novo registo de originais, sugestivamente intitulado ‘Segundo’. Tiago Bettencourt, vocalista, falou ao CM da nova vida do grupo e da dificuldade que ainda existe em cantar em português.

02 de maio de 2005 às 00:00

Correio da Manhã – ‘Esquissos’, o vosso primeiro trabalho vendeu mais de 30 mil cópias e ‘A Carta’ foi tema da novela ‘Queridas Feras’ (TVI) e vencedora de um Globo de Ouro. O peso desse sucesso não vos pesou na feitura do segundo disco?

Tiago Bettencourt – Não sentimos pressão pela simples razão de que já estávamos a compor novos temas antes mesmo de termos atingido esse tremendo sucesso. Se calhar quem sentiu mais a pressão até foi a editora ou os fãs. No que nos toca as coisas fluíram muito naturalmente. Depois, o álbum foi gravado em Olhão num espaço acolhedor e muito relaxante. A pressão sentimo-la mais, provavelmente, ao nível da promoção. Como estávamos muito envolvidos com a capa, com o vídeo e com o ‘site’ sentimos que as ideias tinham de ser todas muito mais fortes. Mas, obviamente, que temos a noção que este é o disco que vem reafirmar a identidade da banda e provar que o primeiro não aconteceu por acaso.

– Como sentem a evolução do grupo do primeiro para o segundo trabalho?

– Temos a noção de que a nossa evolução se deve muito às actuações ao vivo. Por isso, acho que este disco está muito mais maturo. Pessoalmente, sinto que evoluí muito a nível de escrita e sinto-me complementado pelo resto da banda que evoluiu toda de forma muito harmoniosa.

– Este disco denuncia uma banda muito mais virada para o rock. Isso também faz parte dessa evolução?

– Acho que sim. No disco anterior não conseguimos evidenciar tão bem o nosso lado rock porque as coisas não estavam tão bem definidas. Foi na estrada e nos concertos ao vivo que percebemos que esse lado acabava sempre por vir ao de cima e este novo disco, muito naturalmente, acaba por reflectir isso mesmo...

– Os vossos concertos conseguem reunir pessoas de várias idades. Quem é que, afinal, ouve Toranja?

– É verdade que se vê de tudo um pouco: muitos miúdos de 12, 13, 14 anos que começam a descobrir a afinidade com a música e com algumas bandas, mas também pessoas mais velhas que se interessam por nós até do ponto de vista literário. Quanto a este disco, embora possa cativar um público mais adulto, acho que não vai desiludir os mais jovens.

– Os Toranja foram, a determinada altura, acusados de serem uma cópia barata de Jorge Palma. Chegaram, inclusive, a mover um processo contra um jornal. Já atingiram o estatuto de originais?

– Este disco vai confundir um bocado os críticos que vão ter de arranjar novas comparações. A história com o jornal acabou por terminar em bem e os responsáveis pelas acusações enviaram um pedido de desculpas a cada um de nós. Mas, sinceramente, acho que este CD se afasta muito de Jorge Palma. Já o outro, musicalmente, nada tinha a ver e ele próprio chegou a dizer-nos isso. Acho que essa comparação foi feita por uma questão de facilitismo dos críticos.

– Sentem que, de alguma forma, foram vítimas do preconceito que ainda existe contra a música portuguesa feita em português?

– É engraçado que, se por um lado nos sentimos acompanhados por músicos como Pedro Abrunhosa, Sérgio Godinho, Rui Veloso ou Jorge Palma, por outro, sentimo--nos um bocadinho bichos do mato por cantarmos na nossa língua. Esse ainda é um problema comum a quem canta em português. É um preconceito que existe por simples preguiça.

DO RASCUNHO À OBRA ACABADA

Bastaram dois anos para os Toranja completarem a obra. Se em ‘Esquissos’ o grupo havia esboçado os princípios orientadores de uma banda com pretensões a um lugar de destaque na música portuguesa, em ‘Segundo’, unem os traços, as linhas e os segmentos que tinham deixado soltos (eles próprios falavam em imprecisões).

Àquela ‘Carta’ escrita em português, sucedem-se agora outras, seladas a ‘Laços’, algumas delas com ‘Restos’ de ‘Esquissos’ (notoriamente), mas outras visivelmente indicando ‘Outro Mundo’, um mundo muito mais equilibrado e mais maturo. Tiago fala na experiência de estrada. E que outro tipo de disco poderia fazer uma banda que, em 18 meses, deu cerca de 130 concertos? ‘Segundo’ não é uma obra-prima, mas é um trabalho que soa a acabado, com princípio, meio e fim.

Formados por Tiago Bettencourt (voz, guitarra, piano), Ricardo Frutuoso (guitarras), Nuno Quartim (harmónica), ‘Dodi’ (baixo), ‘Rato’ (bateria), e ‘Cuca’ (voz, coros) os Toranja saltaram para a montra da nova música portuguesa com a participação, em 2002, num CD não oficial do Mundial de Futebol. ‘Esquissos’, o primeiro longa duração, foi editado no ano seguinte, sendo ‘A Carta’ o single que lançou o grupo para o sucesso.

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