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CAMILA PITANGA: NÃO FAÇO DA MINHA VIDA UMA NOVELA

Tem mais ‘sal’ que a enfermeira de ‘Mulheres Apaixonadas’. Filha de actores e enteada de uma ministra de Lula, a actriz que não se despe para a ‘Playboy’ por dinheiro algum (está até de casamento marcado, para desilusão dos fãs), assume o interesse pela política e pelas causas justas.

02 de novembro de 2003 às 00:00

É sabido que é militante do Partido dos Trabalhadores (PT) desde os 15 anos. Como analisa o primeiro ano de mandato de Lula da Silva, o novo Presidente do Brasil?

Tenho muito orgulho no nosso novo Presidente. É certo que o País passa por grandes dificuldades mas, em nove meses, não se muda uma realidade tão complexa. O Brasil é um país enorme, cheio de contradições. Mas acredito nas pessoas que estão hoje no governo. Não só nas suas intenções mas, principalmente, na sua competência.

O que há de diferente no Brasil de Lula?

Foi alcançada uma certa estabilidade económica. Além disso, o Brasil passou a ter outra credibilidade internacional. Tudo isso se deve a Lula, que é já um líder reconhecido a nível mundial. Quando o Presidente se encontra com os principais líderes, ele fala não só em nome do Brasil mas também da América Latina. É a voz e uma espécie de embaixador dos países menos desenvolvidos.

Não teme que o seu discurso seja um tanto radical?

Não. Pelo contrário, ele defende as suas ideias com muita diplomacia. Lula apenas quer aumentar as possibilidades de o Brasil poder inserir-se no chamado mundo moderno. Um país como o nosso, com tantas riquezas naturais e culturais e grande potencial, não pode eternamente ficar a marcar passo.

A sua madrasta, Benedita da Silva, é ministra da Assistência e Acção Social, no governo de Lula. E, em 1994, foi a primeira mulher negra a ocupar o Senado. Quando tomou posse prometeu dar benefícios sociais aos 50 milhões de brasileiros que vivem abaixo do limiar de pobreza. Está contente com o seu desempenho?

Obviamente. Claro que sou um pouco suspeita para falar disso, mas a ‘Bene’ é uma pessoa que desde jovem dá a vida por uma causa: a de dar oportunidades aos mais desfavorecidos no Brasil.

Não é um pouco idealista de mais?

Não. Acredito que ela vai mudar muita coisa. Aliás, já se sentem algumas reformas do seu ministério.

Afirmou recentemente numa entrevista a Marília Gabriela (jornalista da Rede Globo) que nunca sofreu na pele nenhum tipo de preconceito racial. Não acha que é um caso de excepção, por ser uma estrela de televisão?

É claro que existe muita segregação racial na sociedade brasileira. Mas tenho uma visão optimista sobre o assunto, até porque cresci baseada numa educação que era contra o ódio e o rancor. As coisas estão a mudar. Aos poucos, os negros estão a ocupar o seu espaço. Mas ainda há muitas contas a ajustar, uma vez que há grandes desigualdades de oportunidades.

Que ideais defende?

Defendo a liberdade, a alegria e a igualdade entre raças. Nenhum ser humano pode ser considerado diferente só porque tem uma cor de pele mais escura.

Camila e o seu irmão Rocco não foram baptizados na Igreja. Isso significa que não tem fé, nem religião?

É um facto. Não sou crente. Não acredito num Deus.

Um facto quase estranho num país tão religioso…

Mas o Brasil é uma sociedade com uma grande democracia no que toca à religião. Há católicos, evangélicos, pessoas que professam o ‘candomblé’. E respeita-se aqueles que simplesmente não professam nenhuma religião.

Portanto, o ‘mais-do-que-anunciado’ casamento com o seu actual namorado, Cláudio Amaral Peixoto, não terá lugar numa igreja…

Não sei. Pode ser uma coisa mais simbólica. Com poesia e música… Não sei se será através de alguma religião.

Recentemente, a sua sogra, a ‘socialite’ Claude Amaral Peixoto, ofereceu-lhe uma boneca de porcelana, com um bebé ao colo, que simboliza a fertilidade. Isso significa que ela poderá ter um neto em breve?

Ainda me sinto muito nova. Tenho apenas 26 anos. Sou apaixonada pelo meu marido. Sei que ele será um pai maravilhoso para os meus filhos. Mas não há pressa nenhuma. A maternidade será uma etapa que eu quero viver calmamente.

Mas já vai adquirindo alguma experiência materna, sempre que tem de tomar conta de Maria Luiza, a sua enteada de cinco anos…

É verdade. Mas ainda tenho de aprender muito. (risos)

O seu futuro papel de mãe será compatível com o de actriz, com horários de gravações muito extensos, viagens, promoções…

Depende. Em qualquer profissão, a mulher vive a contradição de ter de trabalhar, ser dona de casa e ser mãe em simultâneo. Sei que é um privilégio de uma actriz, mas se tudo der certo pretendo parar um pouco e dar o máximo de atenção ao meu filho. Curtir um pouco a maternidade. Não para a vida toda, claro. Porque acho que é possível ser mãe dedicada e trabalhar. Um filho pode ser um estímulo para ter mais gana, fome e tesão

no que se faz.

O facto de ser uma actriz conhecida e ter tanta exposição pública não a incomoda?

Tenho uma relação muito bacana com a imprensa. Nunca me senti invadida porque sempre me resguardei. Prezo muito a minha vida particular. Não faço da minha vida uma novela e sei fechar-me como uma ostra. Falo apenas dos meus tra

balhos. A família é algo sagrado para mim.

Na novela ‘Mulheres Apaixonadas’, Manoel Carlos faz questão de passar algumas mensagens, nomeadamente contra o racismo e a violência, ou na defesa das minorias sexuais. Esta aposta no politicamente correcto tem resultado?

Normalmente, quando se fala nestas questões sensíveis, os autores tentam impor a mensagem. Ou então, simplificam-na em demasia. O grande segredo do ‘Maneco’ é o de não estereotipar as personagens. No caso dos preconceitos raciais, ele simplesmente apresentou dois pais separados: 'Téo', um branco (Tony Ramos) e 'Pérola', uma negra (Elisa Lucinda), de quem a minha personagem, 'Luciana' é filha. Eles continuam a dar-se muito bem e nutrem grande carinho um pelo outro, tocando na mesma banda de jazz. Não dramatizou a relação, nem explorou a vertente racial

Não existe aquele preconceito do branco (rico e mau) contra a negra (pobrezinha e

boazinha)…

É isso. Felizmente, não enveredou por esse caminho. Afinal, o Brasil tem uma sociedade multicultural. E não podemos esquecer que as telenovelas são referências de comportamentos.

A sua personagem em ‘Mulheres Apaixonadas’, 'Luciana', acaba nos braços de 'Diogo', (interpretado por Rodrigo Santoro). Está contente?

Mas eu não queria revelar o final da novela, porque sei que em Portugal ainda falta um mês para o seu fim!

Os portugueses já sabem. Não há problema nenhum em revelar…

Se é assim… Bem, acho que o ‘Maneco’ (Manoel Carlos) planeou um final feliz para 'Luciana', uma mulher apaixonada, mas com sentimentos confusos em relação a 'Diogo', que é seu primo. Além disso, o público torcia para que a relação deles desse certo.

Além de actriz, é produtora de uma peça de teatro, ‘Arlequim, Servidor de Dois Patrões’.

É uma aposta no futuro da sua carreira?

Sem dúvida. É por isso que estou empenhada em terminar o meu curso na faculdade de teatro. A peça (escrita em 1745 por Carlo Goldoni) é a minha estreia na produção. E não podia ter sido mais auspiciosa. ‘Arlequim’ estreou em 2002, no Brasil e já ultrapassou os 65 mil espectadores. Se não houver percalços, ela virá para os palcos portugueses em Janeiro. Em princípio, ficará em cena no Porto e em Lisboa pelo menos durante três semanas.

Na peça, interpreta o papel de 'Beatriz'. Quer desvendar um pouco quem é essa

personagem?

'Beatriz Rasponi' é uma jovem idealista e ousada, que vive na sociedade do século XVIII. Ela luta esgrima, vestida de homem e ultrapassa todos os obstáculos para receber a herança do falecido irmão. Há uma grande interacção física entre os actores. O público, de início, estranha um pouco, pois a peça é falada com a linguagem da época. Mas, depois, deixa-se contagiar pelo ambiente romântico. Acho que a peça levanta o ânimo de quem assiste a ela porque é uma comédia, embora com um humor bastante distinto daquele a que estamos habituados.

DICIONÁRIO PESSOAL

Tony Ramos: “É o máximo. Muito humorado. É uma pessoa de grande generosidade dentro e fora de cena.

É um exemplo para qualquer actor.

Se pudesse só faria telenovelas ao seu lado.”

Rodrigo Santoro: “Um grande colega de trabalho. Mas não beija melhor do que o meu 'marido'”

Playboy: “Era incapaz de posar nua para a ‘Playboy’. Mas não censuro as minhas colegas que o fazem”

‘Rock In Rio’: (A actriz esteve em Portugal na promoção do Festival) “Espero assistir em Junho ao evento em Portugal. No Brasil, é um sucesso”

Portugal: “Já cá tinha estado em Lisboa há dois anos, em gravações. Só conheço (e mal) o Palácio de Queluz, o Bairro Alto e Alfama. Nesta estadia de uma semana, irei visitar Sintra”

Orgulho: “Ser filha de António Pitanga”

Hobbies: “Ouvir um CD da Bjork, Caetano Veloso ou Chico Buarque. Ler uma poesia de Fernando Pessoa ou ver um filme de John Cassavetes”

B.I.

A beleza exótica e a voz rouca de Camila Pitanga, 26 anos, já apaixonaram os brasileiros (e não só). Talvez por isso a apelidem de ‘nova Gabriela’. A jovem actriz já é uma veterana das novelas da Globo. Filha de dois actores, António Pitanga, 64 anos, e Vera Manhaes, 52, estudou na escola de teatro e participou em 1992, na mini-séie ‘Sex Appeal’. Aos 13 anos, dava os primeiros passos na novela ‘Fera Ferida’, a primeira das seis onde actuou. Foi sucesso imediato. Antes de vestir a pele de Luciana, a enfermeira de ‘Mulheres Apaixonadas’, a novela que a SIC transmite no horário nobre, a actriz teve um dos papéis da sua vida em ‘Porto dos Milagres’, interpretando uma das vilãs mais sensuais da ficção brasileira. Fora do pequeno ecrã, tenta levar uma vida sem muito ‘show off’. Sabe-se da sua excelente relação com a madrasta, Benedita Faria, e de um namoro saudável com o cenógrafo Cláudio Amaral Peixoto – filho de uma das mais famosas ‘socialites’ do Brasil, Claude Amaral Peixoto. Numa entrevista recente a Marília Gabriela afirmou ser “negra e não mulata” e não raras vezes defende causas sociais ou não fosse militante dos sete costados do PT, de Lula da Silva. É fã de Fernando Pessoa e tem como paixão o teatro, por onde está a dar os primeiros passos como produtora.

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