O médico estava a 400 quilómetros, por isso era eu quem resolvia os problemas de saúde dos militares da Companhia.
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Fui incorporado em 7 de outubro de 1968 no R. I. 5 das Caldas da Rainha para frequentar o Curso de Sargentos Milicianos. Para trás ficou a escola do 1º Ciclo do Ensino Básico em Aveiro, onde era professor efetivo, e o meu filho mais velho, prestes a nascer. Calhou-me a especialidade de Saúde Militar e no dia 25 de abril de 1970 embarquei no paquete ‘Vera Cruz’ rumo a Moçambique, como Furriel Miliciano Enfermeiro.
A Companhia de Caçadores 2707, de que eu fazia parte, foi para Nantuego e tinha um destacamento no norte, em Gomba, mesmo na fronteira do Rovuma, e outro em Mussoma, a sul, junto à ponte do Lugenda, que guardava. A minha Companhia nunca teve médico. Quando eu tinha dificuldades em resolver os problemas de saúde dos militares ao meu cuidado, teria de os levar em coluna à sede do Batalhão, em Mecula, a cerca de 70 quilómetros, para serem vistos pelo médico.
Seis meses depois do início da comissão, até esse médico foi colocado no Hospital Militar de Nampula, a 400 quilómetros, pelo que fiquei entregue a mim próprio, sabendo que ou resolvia os problemas de saúde dos militares ou teria de pedir uma evacuação aérea! Para qualquer pessoa, e especialmente para quem nunca foi enfermeiro na vida civil, era uma grande responsabilidade, porque com a vida das pessoas não se brinca.
A saúde por minha conta
No final de 1970 a minha Companhia foi para Mecula reforçar a Companhia de Comando e Serviços (CCS) do Batalhão. Além de lhes tratar da saúde, dei aulas aos meus camaradas – para eles conseguirem o diploma da quarta classe - e também tive oportunidade de conhecer o ambiente da guerra ao vivo quando, em 22 de novembro de 1971, saí do quartel na ambulância – um furgão adaptado cuja resistência antiminas era igual à de uma lata de conserva – integrando uma coluna de viaturas para socorrer feridos na picada para Nantuego.
Tinha rebentado uma mina debaixo de um Unimog, a gasolina numa coluna que transportava o pelotão do alferes Pinto para proceder a uma operação. A viatura incendiou-se, bem como a gasolina transportada em jerricans, que até serviam de assento a militares. Resultado: um cenário de onze feridos com estilhaços e queimaduras e um forte cheiro a carne queimada. De imediato decidi que nenhum dos feridos seria dali retirado por terra, decisão que comuniquei via rádio.
Após um período de espera que foi aproveitado para prestar os primeiros socorros com pensos de gordura para queimados, recebemos a informação que iriam quatro helicópteros proceder à evacuação dos feridos. Um avião T-6 precedeu a chegada dos helicópteros que, num movimento cadenciado, desceram e subiram um a um retirando os feridos, num exercício espetacular e impecável.
Ainda os quatro helicópteros estavam no quartel a reabastecer para seguirem rumo ao hospital em Nampula quando uma das viaturas, já no regresso ao quartel, acionou outra mina anticarro e houve mais dois feridos: o soldado condutor, que acabaria por morrer, e o alferes que seguia ao seu lado e foi projetado. Tive de ajeitar os 11 feridos iniciais em três helicópteros, de forma a libertar um para voltar atrás.
A minha Companhia sofreu quatro mortos, três por minas e um por bala, a quem presto a minha homenagem.
Nome
Sérgio Rêpas
Comissão
Moçambique (1970-72)
Força
Companhia de caçadores 2707
* Info
Professor aposentado. Casado, dois filhos e quatro netos
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