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O seu CM de sempre, melhor do que nunca: Jornal com história abraça o futuro

Em vésperas de uma profunda reformulação gráfica, uma viagem pelas primeiras páginas do líder em Portugal.

04 de dezembro de 2022 às 01:30

Os leitores do ‘Correio da Manhã’ procuram informação e preferem lê-la em papel impresso. Constituem, em termos de vendas do jornal, uma enorme legião de utilizadores do extraordinário invento do alemão Johannes Gutenberg (1400-1468) que revolucionou o mundo. Com carateres móveis de letras e números, tinta à base de óleo e a prensa, ele lançou uma nova era no conhecimento e na sua difusão com efeitos em todas as áreas. Desde então, diz-se de 1439, nunca mais parou o esforço criativo e tecnológico para melhorar a eficácia e qualidade do invento. Como produto impresso, o diário ‘Correio da Manhã’ acelera neste caminho, com uma renovação gráfica a revelar em breve. E com um melhor jornal, o leitor ganha.

Desde as seis colunas do diagrama muito diversificado do primeiro número do ‘CM’, em 19 de março de 1979, há quase 44 anos, até às cinco colunas que o jornal hoje apresenta todas as manhãs [ver entrevista nas últimas páginas], aconteceu uma infinidade de mudanças. Na primeira página, porém, ficou a marca do ADN: a manchete em letras maiúsculas, ou em caixa alta, na linguagem de tipografia. O título "EANES ARREFECE A CRISE" impôs-se nesse dia ao lado do bilhete postal de apresentação e por cima da fotografia de uma cena da telenovela ‘O Astro’, a propósito da qual se colocava a pergunta ‘Quem matou Salomão?’

A manchete em cima e foto em destaque constituem no ‘CM’ uma regra geral que se inverte quando a imagem diz mais do que mil palavras sobre um acontecimento. Isto acontece com mais frequência nas notícias de grandes êxitos no futebol e em eleições políticas.

Raríssimo nas mais de 15 850 edições do ‘CM’ foi a fotografia encher toda a primeira página. Só se viu em acontecimentos históricos como o incêndio no Chiado, que em agosto de 1988 se estendeu à zona envolvente dos famosos armazéns e ameaçou uma vasta área da Baixa Pombalina. Para a tragédia a primeira página não foi suficiente e optou-se por uma capa integral de primeira e última com uma só fotografia.

Outro facto que encheu a primeira página com imagem a cores foi o ataque às Torres Gémeas do World Trade Center, em Nova Iorque, no 11 de Setembro de 2001. Tanto como os cerca de 3000 mortos contou o choque planetário com o ato terrorista.

Gutenberguianos

A imagem, em vídeo para além da fotografia, constitui a vantagem indiscutível da comunicação televisiva e das redes sociais, entre outras plataformas na Internet. A rádio beneficia por seu turno dos sonoros ao vivo, em direto ou não, como fator atrativo da atenção dos ouvintes. Na imprensa, as armas são menos impactantes, mas o mundo dos gutenberguianos que junta à legião dos leitores as equipas de jornalistas, gráficos e outros colaboradores redatoriais, sabe que trabalha com um meio de informação mais antigo, mas que também é o que mais se transformou e evoluiu.

A escrita surgiu, de acordo com o conhecimento histórico, há cerca de 5300 anos, na Suméria, e o documento mais antigo era uma tábua com símbolos cuneiformes – hieróglifos – que noticiava ao rei Lagash a morte de seu filho num campo de batalha. Antes a comunicação limitava-se à tradição oral e a representações iconográficas, com animais e cenas de caça que se descobriram em cavernas por todo o planeta. O mais antigo verdadeiro alfabeto é o grego que data de há 29 séculos. Menos dois séculos tem o alfabeto latino com que escrevemos e que se tornou no mais utilizado pelas línguas do planeta.

É com base neste alfabeto, na língua portuguesa e a partir do sistema de letras tipográficas móveis, inventado por Gutenberg, que a imprensa tem evoluído e já aproveita tecnologias digitais. Esta ferramenta não existia no arranque do atual ‘Correio da Manhã’.

O jornal a preto e branco começou por ser impresso em ‘offset’, o que era então uma prática moderna, mas a cor chegou muito depois de imperar nos ecrãs de televisão. A primeira capa a cores foi sobre a visita do Papa João Paulo II a Fátima, em maio de 1991, 10 anos depois do atentado de que foi vítima no Vaticano. Seis meses decorreram a seguir até o anúncio da primeira página passar a ser a cores e houve que esperar dois anos para as imagens serem todas a cores.

Agarrar o leitor

As novidades no mundo da informação obrigaram os gutenberguianos a acelerar na inovação. Na redação, além da preocupação dos jornalistas em seduzir com o texto e as fotografias, os gráficos e designers foram chamados ao primeiro plano para trabalhar em todos os aspetos que podem atrair e agarrar os leitores. Há que pensar em tudo, desde o tipo e tamanho de letra à maquete de textos e fotografias e estudo dos pontos de leitura para cativar quem lê. O trabalho é imenso quando se pensa que, por exemplo, existem uns 3500 tipos de letra e um jornal diário se faz quase novo todos os dias.

Em todos os pormenores joga-se com a personalidade do leitor. O ‘Correio da Manhã’ foi durante muito muitos anos um tabloide no formato e na organização das notícias. Não era necessário destacar a área informativa. Funcionava-se numa cumplicidade subliminar, tal como fazem o ‘Sun’ e o ‘Mirror’, em Inglaterra, ou o ‘Bild’, na Alemanha. O importante é que o leitor conhecia e privilegiava uma informação de proximidade e preocupada em ser útil na vida profissional e nos negócios. A partir de 2003 impôs-se a procura de uma nova harmonia na organização do noticiário e de um contacto mais fácil com novos leitores, sem pôr em risco o património guntenberguiano. Ao mesmo tempo, a marca ‘CM’ ganhou asas para abarcar o caudal de informação de 24 horas por dia que corre via rádio, televisão e Internet desenvolvendo as plataformas online e criando um canal de televisão, a CMTV. Ao hábito de noticiar o que a concorrência desconhecia juntaram-se novos slogans identificativos de Dar primeiro e com Alerta.

Renovação gráfica

Um diário como o ‘Correio da Manhã’ vive em aperfeiçoamento contínuo. Ponderam-se todos os pormenores, não só de redação e grafismo, mas também os económicos. O ‘CM’ tem hoje menos 6 cm de altura e menos um de largura. Em cada seis folhas poupa-se uma de frente e verso e o leitor até sentirá que o jornal é mais fácil de manusear.

A renovação gráfica constitui, no geral, uma espécie de apresentação da moda para uma nova estação. Raramente as mudanças são tão históricas como a do mais que bicentenário ‘The Times’, de Londres, que em 1966 começou a publicar notícias comuns na primeira página. Antes a capa era reservada a anúncios pessoais, sobretudo falecimentos e nascimentos, das famílias abastadas do Reino Unido. Outra mudança de choque no ‘The Times’ foi a redução do tamanho grande clássico, chamado em inglês ‘broadsheet’, para as dimensões de tabloide comum. Para evitar suscetibilidades, o formato denomina-se compacto quando o título tem patine de elite.

Outra novidade notada na história da imprensa mundial registou-se já no início do século XXI no diário francês ‘Le Monde’. O título que sai para a rua a meio da manhã nasceu no fim da Segunda Guerra Mundial, 1939-45, e resistiu quase 60 anos sem aceitar a publicação normal de fotografias.

A conquista de tempo de atenção dos leitores surge como aspeto principal quando se renova o grafismo de um jornal.

A sedução envolve muitas armas, sem nunca pôr em questão a ficha de trunfos do jornal. Nem se pode esquecer as dificuldades atuais de se concorrer com meios de comunicação não pagos diretamente como a Internet, a televisão e a rádio. Ser necessário pagar no momento 1,50 ou 1,90 euros pelo ‘Correio da Manhã’ é um óbice suplementar na altura de avaliar o êxito de uma renovação gráfica.

A meta só pode ser fazer o melhor que seja possível nas circunstâncias vigentes e dar os parabéns aos leitores. Porque são eles que vão ganhar.

"Proximidade com as pessoas impôs grafismo ligeiro"

Agostinho de Azevedo e Vítor Direito, que morreu em 2009, fundaram juntos o ‘Correio da Manhã’ em 1979, onde trabalharam em conjunto por mais de 22 anos. O jornalista recorda como é que o grafismo foi fundamental na definição do projeto jornalístico.

Como nasceu o projeto gráfico do ‘Correio da Manhã’?

É evidente que a linha editorial inicial – um jornal popular, no sentido de próximo das pessoas, uma crónica do quotidiano, um espelho da vida real do País – apontava ao modelo gráfico da imprensa então conhecida como popular. Mas não houve cópia desses modelos. O homem do desenho era um jovem talentoso chamado José Ralha, que começou por impor a "quadralização" dos textos (não havia "pernas", nem "pistolas") e o predomínio da imagem. Daí para a frente desenvolveu-se um tabloide nosso, latino. As páginas de Espetáculos e as dedicadas à Mulher começaram por ser o laboratório onde se foram experimentando novas formas – os textos em fundos cinza, as fotos recortadas, os títulos dentro das fotos, etc. Assim começou no ‘CM’ uma falada ‘tirania’ dos gráficos sobre os jornalistas, que hoje já é entendida como a necessidade de forma e conteúdo se complementarem, aligeirando e facilitando a leitura. A sistematização dos ensaios dos primeiros anos foi feita depois por uma direção gráfica chefiada por António Paredes, que durante duas décadas foi o excecional criativo de todos os produtos editoriais relacionados com o ‘CM’.

Foram buscar inspiração a jornais estrangeiros?

O modelo gráfico dos tabloides britânicos ou do ‘Bild’ alemão, que é sempre o que se tem em vista quando se fala de imprensa popular, era uma inspiração. Para dar expressão a essa ideia, foi fundamental cortar com os grandes debates políticos, com as entrevistas aos dirigentes partidários, com as coberturas dos comícios ou das reuniões sindicais e aproveitar esse espaço livre para intensificar o pequeno noticiário de todo o género. A alternativa foi virarmo-nos para a reportagem de rua, para os incidentes policiais, para as carências locais – no campo da saúde e segurança social, dos transportes e dos equipamentos coletivos. O ‘CM’ foi durante muito tempo a "praça pública" que as televisões privadas vieram depois transpor para os meios audiovisuais.

Foram essas as alterações mais importantes?

Há várias que o ‘CM’ aplicou no momento oportuno: uma gestão privada, um jornal sem preconceitos políticos e um produto a necessitar de técnicas de venda. Afastou os artigos de opinião e as entrevistas densas, e dedicou-se a uma grande variedade de pequeno noticiário e de crónicas de rua polvilhadas de imagens. Uma lei imperiosa era a proximidade com as pessoas. Isso impôs um grafismo ligeiro, com muito atrativo visual, muita fotografia, como referimos em resposta anterior. A preocupação que se passava para os jornalistas era que qualquer notícia, qualquer pequeno apontamento de rua ou qualquer reportagem tinha que ser bem documentada do ponto de vista fotográfico. Não aceitávamos que uma testemunha de um crime ou de um acidente; um grupo de pessoas que reclamasse de um buraco na rua; ou um utente de estabelecimento de saúde que se queixasse de não ter sido bem atendido, não fossem fotografados e dessem a cara. Tínhamos a sensação de que as caras das pessoas ajudavam a vender jornais. Por isso, lembro-me de recomendar aos repórteres fotográficos que, por exemplo num concerto musical, fotografassem vários aspetos do público que estava a assistir. Estávamos convencidos de que cada um que aparecia na reportagem desencadeava a existência de potenciais compradores do jornal – o próprio, a família ou os amigos.

Uma boa capa faz-se também com o desenho gráfico. Lembra-se de alguma(s) que se tenha(m) destacado por essa razão?

A esta distância e sem base para consulta, tenho dificuldade em destacar algumas capas especiais. Foram milhares as que me passarem pelas mãos e que ajudei a construir. Todas me exigiram tempo, trabalho, preocupação criativa, cuidado literário e critério de escolha. Todas as capas publicadas significaram muitas alternativas que foram deitadas fora, muitos rascunhos que encheram o caixote do lixo.

Talvez, pelo seu inusitado e até pela ousadia, recordo três primeiras páginas: duas delas eram de tema político e outra de tema musical. As de tema político foram publicadas no início do jornal (1979/80) em períodos eleitorais. Marcava uma posição do jornal, uma forma de contestar as regras vigentes de isenção absoluta, quando noutras democracias isso não existia: a imprensa privada podia tomar partido eleitoral.

A primeira página de tema musical, saída no início dos anos 80, foi ocupada por uma grande foto da ‘girlsband’ As Doce, na altura a lançar-se na carreira musical. O insólito da foto é que elas estavam, em pose atrevida, sentadas no carro de reportagem do próprio jornal. Tal imagem e tal arranjo gráfico foram, na altura, considerados a pedra de toque para a popularidade que aquele grupo de cantoras alcançou.

Eanes ombreia com Salomão

A 19 de março de 1979 saiu o primeiro número do ‘Correio da Manhã’ - na capa, no ‘Bilhete Postal’ do diretor Vítor Direito, apresenta-se logo o novo título da imprensa portuguesa, cuja manchete é feita com o papel do Presidente da República

António Ramalho Eanes na crise política, mas é a segunda das quatro chamadas de capa que provavelmente mais interessava aos leitores nesse dia - saber quem matou Salomão, umas das personagens da telenovela da Globo ‘O Astro’ - e o destaque no maior tamanho da fotografia. Ao longo da sua existência, nas quase 16 mil edições poucas vezes a primeira página foi monotemática.

O Papa levou cor à ‘primeira’

A 11 de maio de 1991, a visita de João Paulo II a Portugal fez manchete – 10 anos depois de ter sido baleado na Praça de São Pedro, no Vaticano. "Nossa Senhora de Fátima salvou-me a vida", disse então o pontífice. A apoteose em torno do "Papa mais amado de Portugal" mereceu edição especial com a capa do jornal a cores, pela primeira vez na sua história.

O rosto da quarentena

A edição do primeiro dia de confinamento foi uma "capa diferente que refletia tempos diferentes", frisa o diretor- -adjunto Armando Esteves Pereira, que teve na véspera da edição de 13 de março de 2020 essa responsabilidade. Cristiano Ronaldo, de quarentena, era o rosto da notícia excecional de 2020. A pandemia de Covid-19 tinha sido declarada no dia 11 pela OMS.

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